Perspectivas suíças em 10 idiomas

Como os hotéis suíços superaram a pandemia

Andreas Züllig

A pandemia dos últimos dois anos mudou os hábitos de viagem e forçou a indústria do turismo a se adaptar. Andreas Züllig, presidente da associação de hotéis da Suíça, a HotellerieSuisse, explica como o setor está enfrentando a crise.

“Como vocês, suíços, conseguiram isso?” me perguntou um jornalista alemão, em fevereiro deste ano. Ele queria saber como foi possível manter as estações de esqui da Suíça abertas em meio à pandemia.

Em novembro de 2020, houve um rebuliço nos países vizinhos que decidiram decretar restrições massivas ao turismo de inverno ou mesmo fechar totalmente os destinos turísticos.

Andreas Züllig é presidente da associação de hotéis suíça, HotellerieSuisse, desde 2015. Ele é o proprietário e gerente do Hotel Schweizerhof, localizado no resort de montanha de Lenzerheide.

Líderes políticos da Alemanha, Itália, França e Áustria se uniram para alertar sobre um novo hotspot de coronavírus na Europa. E nosso governo sofreu intensa pressão. Mas nos mantivemos firmes, felizmente, protegendo a importante indústria de turismo de inverno.

A confiança depositada nos protocolos de segurança implantados nos teleféricos,  ferrovias de montanha, hotéis e restaurantes da Suíça valeu a pena. No meio do inverno, a mídia estrangeira de repente se interessou pelo “modelo suíço”. Como proteger as pessoas, mas também a economia e, portanto, os empregos e os negócios?

Acredito que o povo suíço tem um forte senso de responsabilidade pessoal. Durante a crise, isso nos ajudou a seguir um caminho pragmático – ou seja, “suíço”. Nesse ponto, é necessário destacar e agradecer a confiança das autoridades.

Mas os desafios do último um ano e meio também serviram como alerta e impulsionaram o desenvolvimento em várias áreas: maior cooperação, networking e ferramentas para nos prepararmos para os desafios futuros. Da noite para o dia, questões-chave como digitalização e sustentabilidade se tornaram ainda mais importantes. A necessidade de agir ficou clara na política, na associação de hotéis e em negócios individuais.

De um dia para o outro, tivemos que aprender a nos comunicar usando o Teams, o Skype e outras ferramentas. Embora a digitalização já faça parte da indústria hoteleira há algum tempo, ocorreram grandes mudanças e rapidamente. Os dados dos hóspedes tiveram que ser coletados e muitas coisas que estavam adiadas precisaram ser resolvidas de imediato.

No nosso próprio hotel, a pandemia – e todos os seus protocolos e regulamentos de segurança – nos permitiu trabalhar na recepção (quase) sem papel, desde a primavera.

Acredito que as consequências da pandemia também irão manter a indústria do turismo ocupada no futuro. A digitalização nos ajudará a fornecer pacotes feitos sob medida. As ofertas vão ficar mais integradas: desde a chegada no aeroporto, passando pelo quarto do hotel, até a exploração dos arredores locais. Um anfitrião digital irá aprimorar a experiência dos hóspedes e ajudá-los a descobrir coisas novas.

Ficou claro que sustentabilidade não é apenas uma palavra da moda muito usada. É, sobretudo, a base de todo negócio de sucesso. No futuro, nenhuma empresa alcançará o sucesso sem operar de forma sustentável, com uma gestão cuidadosa dos recursos e um compromisso com uma equipe bem treinada e motivada – além de uma base financeira para salvaguardar o futuro da empresa e dos empregos a longo prazo.

A Organização Mundial do Turismo das Nações Unidas delineou seis linhas de ação para orientar a recuperação do turismo responsável, com foco na saúde pública, inclusão social, biodiversidade, clima, economia circular, governança e finanças.

O setor de turismo suíço fez o mesmo no início deste ano com sua campanha chamada “Swisstainable”, que está alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

A campanha premia as empresas do setor que se comprometem com o programa “Swisstainable” e incentiva os turistas a “viajar com maior consciência”,  incorporando a cultura local, consumindo produtos regionais e permanecendo mais tempo em cada lugar.

A indústria do turismo deixou de ter como alvo viajantes de curta duração que, no passado, gastavam muito dinheiro em um ou dois dias mas deixavam poucos benefícios. O aplicativo e o site da Suíça Mobility fornecem mapas interativos com trilhas para caminhadas e ciclismo e, no inverno, com raquetes de neve e rotas de cross-country, listando acomodações e transporte público. A plataforma foi projetada para encorajar os visitantes não apenas a estender as visitas, mas também a sair do caminho habitual.

A Swiss Federal Railways definiu 2030 como a data em que alcançará a neutralidade climática em suas operações, em parte graças a suas próprias usinas hidrelétricas. A Railways afirma que a energia renovável já é responsável por 100% da eletricidade utilizada em seus edifícios e infraestrutura e representa 90% da eletricidade gasta por seus veículos. Os trens da Rhaetian Railway, que atendem ao sudeste da Suíça, incluindo os resorts nas montanhas de Davos e St Moritz, funcionam exclusivamente com energia de usinas hidrelétricas desde 2013.

O país possui uma rede de 19 parques que, somados, cobrem mais de um oitavo do território da Suíça. O objetivo da rede “Parques Suíços” é preservar os recursos naturais apoiando o desenvolvimento sustentável e a cultura das cidades e vilas dentro dos limites do parque. O Parque Nacional da Suíça, no canto sudeste do país, é a única área selvagem estritamente protegida na Suíça.

E é exatamente por isso que é importante abordar essa questão com ainda mais energia. Já em 2015, a HotellerieSuisse adotou uma nova estratégia e colocou a inovação e a sustentabilidade no foco do setor de hospedagem. Um grupo de trabalho vinculado à Federação Suíça de Turismo está atualmente empenhado em criar uma nova estratégia de sustentabilidade para todo o setor e definir as medidas para implementá-la.

As viagens vão mudar definitivamente no futuro. A digitalização significará menos viagens de negócios para centros urbanos. Como já foi mencionado, a interação e as reuniões terão menor probabilidade de acontecer pessoalmente e aumentarão as possibilidades para encontros virtuais. Em termos ambientais, esse desenvolvimento com certeza será bem-vindo. Para o turismo e as companhias aéreas, no entanto, significa uma redução maciça nas receitas e haverá uma redução correspondente do excesso de capacidade. Algumas companhias aéreas, inclusive, já decidiram que deixarão de operar suas aeronaves de longo curso quando a pandemia acabar.

Mas como o turismo está se transformando após esses quase dois anos de crise? É preciso dizer que certas mudanças teriam ocorrido de qualquer maneira. Mudanças demográficas, a digitalização e a maior conscientização sobre as mudanças climáticas tornaram-se aparentes antes mesmo do início da crise.

Algumas dessas transformações se tornarão mais marcadas e aceleradas. No futuro, a segurança e a saúde se tornarão fatores essenciais quando se trata de viagens. Os viajantes darão mais valor à nutrição, exercícios, sono e relaxamento. A desaceleração se tornará um ponto de venda único no turismo.

Os viajantes não farão uma viagem rápida a um lugar para mostrar às pessoas em casa uma fotografia de onde estiveram; em vez disso, o foco estará na experiência no local – uma maior consciência da cultura e da localização. Os funcionários estão se tornando mais importantes. Uma pesquisa do Instituto Fraunhofer mostrou que 80% dos hóspedes consideram muito importante que um hotel tenha uma relação respeitosa com seus funcionários.

Quase 70% dos hóspedes valorizam um comportamento ambientalmente consciente e mais de 40% também estão dispostos a pagar mais por isso. Portanto, o turismo do futuro está claramente caminhando na direção da qualidade em vez da quantidade. O futuro está em viagens mais conscientes e sustentáveis. Nessa linha, os critérios principais são: ofertas culturais, seleção culinária disponível (incluindo produtos locais e sazonais), o uso cuidadoso dos recursos e uma equipe motivada e bem treinada.

A Suíça tem todas as condições para cumprir – e até mesmo superar – as exigências de seus atuais e futuros hóspedes.

Estou convencido de que a Suíça será capaz de continuar a acompanhar o ritmo e se manter competitiva em relação à concorrência internacional, seja nas cidades ou nas montanhas.

O turismo sempre conseguiu sair fortalecido dos períodos de crise. Como pioneiros do turismo, provamos isso há mais de 150 anos.

As opiniões expressas neste artigo são exclusivamente do autor e não refletem necessariamente as opiniões da SWI swissinfo.ch.


Série de opinião

swissinfo.ch publica artigos de opinião de colaboradores que escrevem sobre uma ampla gama de tópicos – questões suíças ou que afetam a Suíça. A seleção dos artigos apresenta uma diversidade de opiniões que visa enriquecer o debate sobre os temas discutidos.

Adaptação: Clarissa Levy

Adaptação: Clarissa Levy

Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch

Mostrar mais: Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch

Veja aqui uma visão geral dos debates em curso com os nossos jornalistas. Junte-se a nós!

Se quiser iniciar uma conversa sobre um tema abordado neste artigo ou se quiser comunicar erros factuais, envie-nos um e-mail para portuguese@swissinfo.ch.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR