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Como sobrevive Davos sem o Fórum Econômico Mundial

Kongresszentrum im Dunkeln
O Centro de Congresso de Davos vazio: em 2021, o Fórum Econômico Mundial (WEF) "muda" ocorre em Cingapura, em maio. Meinrad Schade

Sem o Fórum Econômico Mundial (WEF) - e sem a Copa Spengler - Davos está passando por uma situação difícil em meio à pandemia. Mas quando o jornalista visita a cidade, sente-se no ar a disposição para um novo começo.

A música animada de Robbie Williams soa em alto volume nos alto-falantes. “Quentão por apenas cinco francos”, anuncia um cartaz.

Do lago congelada, ouve-se o barulho dos tacos de hóquei sobre o gelo. Paira uma atmosfera alegre no parque Dorfseeli de Davos no segundo fim de semana de janeiro. Um jovem de catorze anos, que acaba de atar os cadarços de seus patins, acha que a pandemia limitou apenas sua vida escolar.

Como a escola agora é ventilada não apenas durante os intervalos, mas também no meio de cada aula, ele sente frio por se sentar próximo à janela. De manhã, as temperaturas de menos 12 graus Celsius não são incomuns em Davos, que fica a uma altitude de quase 1.600 metros.

Grande honra para o autor

Benjamin von Wyl nasceu em Aargau em 1990. Ele é jornalista freelance e trabalha para a SWI swissinfo.ch e para o semanário WOZ, entre outras publicações.

Seu último romance “HyäneLink externo“, publicado em setembro de 2020, será agraciado com o Prêmio de Literatura Suíça 2021 pelo Departamento Federal de Cultura.

Já em sua estreia literária intitulada “Land ganz nah”, de 2017, ele recebeu o prêmio cultural do cantão de Zurique. Von Wyl mora em Basiléia.

Aqui na lagoa, você pode quase esquecer a pandemia, também porque nem todos no gelo estão usando uma máscara. Na verdade, as máscaras são obrigatórias por todo o centro da cidade, e os funcionários municipais ocasionalmente nos relembram amigavelmente disso.

Tanto a obrigação de se usar a máscara quanto os controles são exceções na Suíça. No pequeno lago do vilarejo, isto causa irritação entre algumas pessoas que consideram esta medida e o fechamento dos restaurantes como excessivos. Todos esperam que as pistas de esqui permaneçam abertas e que o hóquei possa continuar a ser jogado.

WEF como “máquina de fazer dinheiro”

É uma boa coisa que os habitantes de Davos mantenham seu humor despreocupado. Afinal de contas, a cidadezinha mais elevada da Europa foi duramente atingida pela pandemia. O Fórum Econômico MundialLink externo, mais conhecido pelas iniciais WEF, que em anos normais traz para Davos dezenas de milhões de francos e a atenção da mídia internacional, também não será realizado aqui em 2021.

A tradicional Spengler CupLink externo, o torneio internacional de hóquei no gelo interclubes mais antigo e renomado, também foi cancelado no final de dezembro. Somente para os cinco dias do WEF, a revista de negócios suíça “Bilanz” calculou que mais de 31 mil pernoites em hotéis e alojamentos foram realizados em 2014.

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swissinfo.ch solicitou entrevistas com cinco hotéis chiques e todas foram canceladas. O Hotel Intercontinental, onde os presidentes dos EUA costumam ficar durante o WEF, disse que não estava muito claro o que aconteceria em seguida. Dois dias depois, o hotel cinco estrelas anunciou seu fechamento por pelo menos um mês, e não é certo se ele reabrirá ainda neste início de ano.

“Alguns estão fechando até segunda ordem. É difícil”, diz o gerente de eventos do Hotel Schatzalp, na estação do vale. Até depois do Natal, a fila em frente ao teleférico era longa. Mas, para manter as distâncias, é necessário pessoal adicional. A operação do teleférico ficou, portanto, mais cara do que o normal.

Bom inverno

É verdade que as ferrovias de montanha da região tiveram 10% a mais de passageiros na véspera do Ano Novo do que a média dos últimos cinco anos. Isso foi devido à neve precoce. Mas agora o jornal local espera “um mês a se esquecer”. Isso foi mesmo antes mesmo de o Conselho Federal (Poder Exercutivo) ordenar o fechamento de todas as lojas de “necessidades não diárias” e restrições de contato mais rigorosas.

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Os 6.500 assentos no estádio de gelo onde são disputados os jogos da Copa Spengler estão vazios. Hockey Club Davos (HDC), o time campeão suíço e recordista de hóquei no gelo, faz 100 anos em 2021. “Celebraremos”, diz o CEO Marc Gianola, “mas com certeza com humildade e não com grande fanfarra”.

A singeleza, diz ele, não se deve a perdas econômicas ou a jogos diante de assentos vazios. Trata-se de respeito por aqueles que não têm vontade de comemorar durante a pandemia, disse ele.

Mann im leeren Stadion
Não foi fácil para Marc Gianola, presidente Clube de Hockey de Davos (HCD, na sigla em alemão) e também da Copa Spengler, cancelar o tradicional campeonato. Meinrad Schade

Gianola fez sua própria carreira de hóquei com o HCD e na região há quase 30 anos. Ele cresceu perto de St. Moritz. “Em St. Moritz, convidados distintos vão passear. Já aqui, temos hóspedes ativos que esquiam”.

Os hotéis chiques de Davos são voltados para o WEF, disse ele. Vão ser necessários anos para suprir o déficit de 2021, disse ele. Gianola foi mais diretamente afetado, é claro, pelo cancelamento da Spengler Cup. Mesmo com público presente, a temporada de hóquei da HCD já era deficitária. Somente a Copa Spengler vale a pena e torna viável o orçamento anual do clube de 29 milhões de francos. Os torcedores, principalmente os proprietários de uma segunda residência na cidade, também são importantes.

Todos os vizinhos do bairro onde mora Gianola também são “donos de uma segunda casa”. Mas eles também são vizinhos. Apenas cerca de 40% dos apartamentos estão sempre ocupados, sendo que alguns proprietários também financiam casas de férias aqui através de aluguéis lucrativos durante o WEF.

Ar mais limpo sem o WEF

Gianola está otimista de que a Fórum Econômico Mundial retornará. Durante o WEF, ele só participa do aperitivo do Conselho Federal no estádio de gelo, mas ele não se sente restringido. As barreiras, a grande presença militar e o congestionamento de trânsito não incomodam Gianola. Para ele isso significa apenas ter de caminhar para o trabalho durante alguns dias.

Uma investigação durante o WEF de 2018 mostrou que o limite de poluição por partículas finas é regularmente excedido em quase o dobro durante a conferência. “Atualmente, Davos já quase não consegue engolir tantas limusines”, diz Cäcilia Bardill, uma professora de música aposentada que vive em Davos há mais de 50 anos. Ela menciona inúmeras coisas que você aprende quando vive aqui. Por exemplo, você se acostuma a se mudar a cada poucos anos por causa de reformas ou demolições.

Ela já ofereceu abrigo a ativistas críticos durante o WEF algumas vezes, mas ela não quer “condenar completamente” o congresso. “Acho que a ideia básica de Klaus Schwab é boa: falar uns com os outros, para uma economia mais social. Talvez o que era um pequeno congresso de executivos tenha simplesmente crescido demais e ele tenha perdido o controle?” diz Bardill.

Ältere Dame am Tisch
Cäcilia Bardill em seu apartamento. Meinrad Schade

Em um dos primeiros anos, ela e três estudantes de flauta organizaram uma tarde no programa oficial para os acompanhantes dos participantes. “Hoje é impensável que uma escola de música atenda suas exigências”! Como uma grande otimista, ela está convencida de que a falta de uma edição do WEF não condenará Davos. Afinal de contas, quando o WEF foi realizado em Nova York em 2002, a cidade também sobreviveu.

“Davos é um lugar muito aberto”, é o que ouço de todos. O lugar já era internacional muito antes de existir o Fórum Econômico Mundial. Quase metade das pessoas que viviam em Davos em 1920 não possuíam passaporte suíço. Infelizmente, Davos tornou-se então o bastião do NSDAP, o partido de Hitler, na Suíça.

De centro de terapia alpina a reduto esportivo

Davos já foi uma vila agrícola, que então floresceu como um resort de terapia climática. Com as clínicas e spas vieram os primeiros institutos de pesquisa na virada do século 20. O filho de um pioneiro das clínicas fundou o Spengler Cup em 1924, o que definitivamente fez de Davos também um reduto esportivo. À medida que as drogas tornaram a cura climática da tuberculose cada vez mais obsoleta, Davos desenvolveu uma nova base econômica como centro de congressos.

Porträt der jungen Frau im Theaterlicht
Anka Topp no salão do novo Centro Cultural de Davos. Meinrad Schade

“Estamos atualmente em um momento de crise”, diz Anka Topp, uma alemã que veio para as montanhas do cantão de Grisões há seis anos como diretora administrativa de um festival de música clássica. “Talvez Davos precise se reinventar mais uma vez”, diz ela. Se chegarmos a isso, a cultura deverá desempenhar um grande papel.

Topp também está incansavelmente comprometida com a vida cultural local. Pela primeira vez, o município adotou uma estratégia cultural. Parte desta estratégia é a nova casa de cultura, que será chamada de “Kulturplatz Davos”. “Antes de abrir, isto tem que ser melhorado”, grita o chefe de obras do outro lado do lobby da Kulturplatz. “Tome o tempo que precisar”, responde ela com uma risada acrescentando: “as autoridades estão se certificando de que não acontecerá tão cedo”. Ainda em dezembro, Topp, que é presidente da associação patrocinadora, esperava que a Kulturhaus tivesse uma cerimônia de abertura adequada com gestão profissional. Também nada disso aconteceu.

Canteiro de obras cultural

“Não sabemos quando ou o que se pode planejar, e em que escala”, diz Topp, “Mas não é por isso que estamos enterrando nossas cabeças na areia”. Topp também é otimista. Assim que for possível novamente, as pessoas voltarão ao teatro e ao cinema. A experiência de se estar junto em um teatro não pode ser substituída por “Netflix and Co”, diz ela. Mas a variedade de bares e restaurantes também caracteriza o estilo de vida urbano em Davos, acrescenta. Topp espera que o maior número possível de restaurantes sobreviva à crise.

Alguns restaurantes fechados agora oferecem raclette ou pizza por encomenda. Alguns relatam negócios lucrativos, outros aceitam dinheiro apenas porque há muito tempo pararam os serviços de cartão de crédito para economizar nos custos. Se perguntarmos nas lojas de esportes, de artigos para casa e livrarias no “calçadão” do centro, todos dirão que os negócios foram “melhores do que o esperado” no início de janeiro. Mas a partir da próxima semana, eles poderão ter que fechar.

Porträt mit Maske im Laden
O comerciante português Bruno Pereira em sua loja de produtos alimentícios em Davos. Meinrad Schade

“Pois é, fazer o quê?” diz Bruno Pereira. Sua mercearia portuguesa adjacente ao “calçadão” chique pôde permanecer aberta. Ele não reclama das vendas, apenas de que sua carga de trabalho como padeiro em um grande varejista foi reduzida. Ele não pode aproveitar o novo tempo livre porque a falta de renda é dolorosa. “Tem sido muito mais difícil para outras famílias. Alguns funcionários foram demitidos após muitos anos porque os hotéis estão fechados por enquanto”, diz Pereira. Em momentos de pico, milhares de portugueses estariam trabalhando nas obras de Davos e em hotéis. “O bom é que todos se ajudam e se apoiam mutuamente”. O senso de comunidade é maravilhoso em nossa comunidade aqui”.

Vitrines de lojas vazias

As vitrines vazias na “Promenade” não evidenciam a “morte das lojas”, mas sim que algumas delas só são usadas durante o WEF, explica o novo prefeito Philipp Wilhelm. “Alguns fazem uma grande parte de seus negócios anuais em poucos dias”, diz ele, e vê isso como um exemplo da dependência econômica do WEF, na qual alguns se colocaram. Isto, diz ele, não é sustentável em um lugar que se quer vibrante.

Mann am Schreibtisch
O prefeito Philipp Wilhelm em seu gabinete em Davos. Meinrad Schade

Wilhelm é o primeiro socialdemocrata no cargo. Sua eleição marca uma mudança radical. “Eu não participei de uma manifestação apenas contra o WEF em Davos, eu protestei por um mundo melhor durante o WEF”, ele enfatiza. Wilhelm está confiante de que o WEF será realizado novamente em Davos em 2022. “É crucial para todo o turismo ligado a congressos e para o turismo internacional que a Suíça consiga controlar a pandemia”.

Até agora, ele só vivenciou seu mandato em modo de crise. “Manter os números baixos e compensar os negócios afetados” é seu credo aqui. Mas Davos está sendo lembrada atualmente que o sucesso não pode ser tomado como garantido. Novas ideias são necessárias para o turismo.

A crise do Covid-19, quem diria, revelou um caminho que é também uma destinação: os proprietários de segundas casas estão fazendo seus home offices aqui, e agora estão na cidade com mais frequência. “Então por que não nos concentramos em apartamentos de aluguel e espaços de coworking para pessoas que querem trabalhar conosco na natureza por alguns dias ou semanas”?

No parque “Dorfseeli”, as pessoas também acreditam no futuro de Davos, mas em termos mais duros. “Não tenho medo”, diz um jovem pai, “e minha simpatia é muito limitada”: Davos é uma máquina de imprimir de dinheiro”! Houve muitos anos bons, diz ele, e haverá outros bons novamente.

Adaptação: DvSperling

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