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Conferência sobre biocombustíveis é quase só de elogios

Ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, na abertura da conferência Keystone

A conferência internacional em São Paulo começou com muitos elogios ao etanol brasileiro. Era normal que fosse assim da parte dos ministros do governo, especialmente de Dilma Rousseff, da Casa Civil.

O Brasil fala em estímulo ao desenvolvimento através do etanol nos países mais pobres e que há grande interesse dos africanos.

No princípio, parecia uma operação destinada a mudar a imagem do Brasil no exterior, onde há muita polêmica acerca das conseqüências ecológicas e da alta dos preços dos alimentos devido à produção de biocombustíveis.

Mas o interesse suscitado pela primeira conferência internacional, organizada a pedido do presidente Lula, ultrapassou todas as expectativas. Estão presentes 92 delegações de países e de organizações internacionais, além de entidades brasileiras.

A Suíça enviou quatro representantes, mas o ministro do Meio Ambiente, Energia, Transportes e Comunicações (Detec), Moritz Leuenberger, cancelou sua presença para dedicar-se a questões políticas internas mais urgentes.

Além disso, estão presentes grandes especialistas nacionais e estrangeiros nos debates organizados em painéis temáticos abertos a todos, dissipando boa parte da impressão propagandística inicial.

Na abertura da conferência, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff – que representou o presidente Lula –, disse “que o mundo precisa passar por uma transição da economia do carbono para a economia pós-carbono e que os biocombustíveis são uma fase transitória importante na matriz enérgica dos transportes.”

Debates abertos

O governador de São Paulo, José Serra, esteve presente e falou da importância do setor álcool-açucareiro para o estado.

Citando dados que situam o Brasil como país com matriz energética mais renovável do mundo, Dilma disse que 47,5% da demanda de energia país são cobertos com energias renováveis. Segundo os mesmos dados, a média mundial é de 12,9%; nos países mais industrializados da OCDE é de 6,7%.

A ministra criticou a forma com que o assunto vem sendo abordado no mundo, incluindo o etanol de cana como ameaça à segurança alimentar.

A “visão brasileira”, disse a ministra, demonstra que o uso do álcool de cana como combustível oferece “segurança energética e sustentabilidade ambiental”. Ela citou dados do aumento da produtividade da cana desde a década de 70 e disse que, no mesmo período, a produção de grãos cresceu 142%.

A ministra disse ainda que está em curso um zoneamento nacional do plantio de cana, com exclusão de biomas sensíveis, como a Amazônia, o Pantanal e a Mata Atlântica. Ela concluiu que a conferência ajudará a eliminar teses “que carecem de embasamento científico.”

Sessões plenárias

Muitos aspectos que envolvem a produção e comercialização dos biocombustíveis estão em discussão nas plenárias da qual participam especialistas brasileiros e estrangeiros, com participação do público. Um relatório de cada painel será apresentado aos ministros, na parte mais política da conferência, quinta e sexta-feira.

O tom desses painéis é em geral de entusiasmo com o etanol de cana e um pouco menos com o biodiesel, misturado atualmente em 3% do diesel fóssil, mas produzido por enquanto essencialmente de soja, até que novas matérias-primas sejam viáveis em escala industrial. Fala-se da juventude do biodiesel (cinco anos) comparada à experiência de mais de 30 anos do uso de etanol.

No primeiro painel, foi abordada a questão da segurança energética. Márcio Zimmermann (secretário executivo do Ministério das Minas e Energia) disse que a segurança energética “é peça fundamental no padrão de vida de um povo.” Explicou que o Brasil adotou o etanol nos anos 70 depois de uma crise do petróleo e que ele tornou-se um fator redutor de risco na segurança energética.

Segundo Zimmermann, o etanol responde hoje por 16% de toda a energia para transportes gerada no Brasil, atrás do petróleo (37%) e à frente de outras energias renováveis (15%) e do carvão vegetal (12%).

Todos os demais membros do painel: Richard Jones, (EUA), Richard Murphy (Reino Unido), Ibrahim Assane Mayaki (Níger) foram muito elogiosos ao etanol brasileiro. A única ressalva foi de Christoph Berg, questionando a exportação do modelo brasileiro. “O Brasil tem espaço, tecnologia, pesquisa, infra-estrura e mercado. Os Estados Unidos também, mas quem mais tem essas condições?”.

Menos CO2

O nigerino Mayaki disse que a África precisa criar um mercado regional e receber ajuda para formar pessoal e transferir tecnologia. “O Brasil aprendeu e nós também podemos aprender”, disse Mayaki, diretor-exeucutivo da Ong HUBRural.

O Brasil considera que o etanol pode ser um fator de desenvolvimento para os países pobres da África e da Ásia e se diz disposto a transferir tecnologia. Por sua vez, esses países contribuiriam para a produção global de biocombustíveis, menos poluentes do que o petróleo, reduzindo o efeito estufa. Nos cálculos do Ministério das Minas e Energia, desde a introdução do etanol, em 1973, o país evitou a emissão de 800 milhões de toneladas de CO2.

Alan Kardec Pinto, diretor da Petrobras Biocombustíveis, disse que os biocombustíveis não são a solução do problema, mas parte da solução e que os países em desenvolvimento podem participar. Lembrou que 20 países produzem petróleo para 200 países e que cerca de 100 países podem produzir biocombustível.

Mudanças climáticas

Na plenária sobre biocombustíveis e mudanças climáticas, o cientista e diretor-executivo do Fórum Brasileiro sobre Mudanças Climáticas, Luiz Pinguelli Rosa, disse que a crise ambiental poderá ser muito mais grave do que a crise financeira.

Para o presidente do Woldwatch Institute, Christopher Flavin, Brasil, China e Índia devem assumir um papel importante também na questão climática e que o Brasil ainda tem muito potencial em energia solar e energia eólica.

Os países africanos, que pouco contribuem (menos de 4% das emissões) para as mudanças climáticas, poderão ser os mais prejudicados. O senegalês Thierno Bocar Tall, diretor do Fundo Africano de Biocombustíveis e Energias Renováveis, explicou que, “se nada for feito, vamos perder 400 milhões de hectares de terra em alguns anos.” Para evitar isso, ele espera contar com a parceria do Brasil no plantio de cana e produção de etanol.

swissinfo, Claudinê Gonçalves, São Paulo

Segundo dados oficiais, a área de plantio de cana no Brasil é 4 milhões de hectares (0,5% das terras cultiváveis).
Composição mínima de etanol na gasolina: 25%. Composição atual de biodiesel no diesel fóssil: 3%
Desde 1973, com o etanol, o Brasil evitou a emissão de 800 milhões de toneladas de C02.
O etanol de cana é 9,3 vezes mais eficiente do que um combustível fóssil.

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