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Escritores suíços na era digital

As vendas pela internet podem ter o problema de um eventual monopólio, constata Reto Finger. Cygnebleu

Enquanto aguardam importantes decisões políticas, os meios literários suíços continuam ativos.

Política do livro e vendas pela internet são algumas das grandes mudanças em curso. Elas são abordadas, na entrevista a seguir, pelo presidente da Associação de Autores, Reto Finger.

A decisão era muito esperada. A Câmara dos Deputados, no entanto, adiou a discussão do projeto de lei sobre o preço do livro. O projeto será examinado na próxima sessão parlamentar, em setembro. O Parlamento suíço não é profissional e reúne-se quatro vezes por ano.

A questão é importante. O Senado decidiu em março excluir o comércio eletrônico de livros de um novo sistema de regulamentação de preços a ser implementado.

A rede de livrarias Payot, que também vende livros pela internet, é rigorosamente contra a exclusão do comércio eletrônico do livro da nova regulamentação. “É inaceitável porque isso é contrário ao objetivo da lei”, escreve Pascal Vandenberghe, diretor-geral da Livraria Payot, em artigo publicado no jornal Le Temps.

“Como imaginar que, em um mesmo território, os livreiros físicos sejam submetidos a uma regulamentação e não as vendas pela internet? Mais do que uma concorrência, isso criaria uma discriminação que favoreceria uma forma de venda em detrimento de outra e da diversidade cultural”.

O teatrólogo Reto Finger, de 38 anos, acaba de assumir a presidência da Associação de Autores (AdS). Com as transformações em curso, o novo presidente corre o risco de ter um pouco menos de tempo para escrever.

swissinfo.ch: A venda de livros na internet o preocupa?

Reto Finger: Lutamos em todo caso para que ela não seja excluída da lei que regulamenta o preço do livro. As vendas na internet colocam o problema do surgimento de um eventual monopólio. Se só existe a Amazon, onde poderá ser encomendado um livro de poesia de um autor regional? A rotatividade muito rápida dos livros nas livrarias também é preocupante. Hoje, alguém manteria no catálogo “Montauk”, de Max Frisch (ndr.:grande escritor suíço-alemão falecido), que vendeu muito pouco nos primeiros três anos e depois tornou-se um sucesso enorme?

swissinfo.ch: O livro, depois da música, está disponível para baixar na internet. Como os autores veem essa possibilidade?

R.F.: Está claro que não se pode impedir nem conter o desenvolvimento tecnológico. Os escritores se preparam e querem sobretudo evitar repetir os erros dos meios musicais, que reagiram mal entrando na Justiça ou tentando impor multas exorbitantes aos piratas.

Para a Suíça, é a Pro Litteris que faz as negociações no plano europeu. Por enquanto, o acordo concluído com o Google nos Estados Unidos prevê um papel ativo dos autores, que devem habilitar suas associações a reclamar direitos autorais. O processo é um pouco complicado.

swissinfo.ch: Qual é a situação atual dos escritores na Suíça. Eles podem viver do ofício?

R.F.: Globalmente, a situação não é ruim. O número de órgãos de apoio é relativamente grande, como nos países vizinhos da Suíça. Mas só uma pequena minoria de autores pode viver de sua arte. Em literatura, uma carreira é muito imprevisível. A grande maioria dos escritores tem uma outra fonte de renda. É lamentável, mas também pode ser visto como uma chance de ter contato com outro cotidiano.

swissinfo.ch: O que a associação pode fazer por seus membros?

R.F.: Lutamos pela melhoria das condições gerais. A nova lei de estímulo à cultura, adotada em dezembro passado, é um avanço – principalmente no artigo 9 – que prevê que a Confederação Helvética e a Pró Helvetia (ndr.: órgão estatal de promoção da cultura), participem da previdência social dos artistas que apoiam. É um grande avanço.

Nós também nos engajamos junto a fundações para que os montantes atuais não diminuam e até para que aumentem. Trabalhamos para que a literatura esteja presente na mídia e no público. Tentamos, por exemplo, estabelecer um preço da peça radiofônica na Suíça.

swissinfo.ch: O senhor não teme, como alguns quiseram fazer com o cinema, que mais vedetes para chamar a atenção teriam consequências nefastas para a qualidade?

R.F.: Sinceramente, não vejo esse tipo de risco para o livro. As jornadas literárias de Solothurn (ndr: noroeste), principal evento para o livro na Suíça, não seguem essa linha. As iniciativas nessa direção, como a dos leitores denominada “Swiss and famous”, são isoladas. A entrega de prêmios literários sérios será sempre um enorme benefício para a literatura.

swissinfo.ch: A AdS também é coautora de um projeto de incentivo baseado no sucesso de um modelo similar ao do cinema. Não é arriscado para a literatura de qualidade que às vezes vende poucos exemplares?

R.F.:O modelo que está na mesa da Secretaria Federal de Cultura prevê um limite superior. A poesia não pode ser excluída, por exemplo, porque todo o incentivo iria para os “best-sellers”.

swissinfo.ch: O senhor acha que os escritores deveriam participar mais na vida política do país?

R.F.: Não se pode fazer um julgamento global. Os que podem e querem se exprimir que o façam. Mas os autores não são feitos para isso e nem por isso são maus escritores. Iniciativas recentes tiveram muito sucesso, como o apelo lançado no início de março, em favor da Comissão Federal Contra o Racismo, apoiado por mais de 700 artistas.

Sim, um pouco mais de engajamento seria possível e aparentemente desejado.

Ariane Gigon, Zürich, swissinfo.ch
(Adaptação : Claudinê Gonçalves)

Nasce em 1972 em Berna, Reto Finger estudou direito em Amsterdã e em Zurique, sempre escrevendo.

Publicou várias peças de teatro pela Editora Fischer Verlag, em Francfurt. Sua última peça, «Vortstellungen und Instinkte», foi produzida no Schauspielhaus de Zurique em 2009.

Escrevendo também peças radiofônicas, Reto Finger também escreveu “auteur de la Maison”, encenado no Teatro da cidade de Mannheim entre 2006 e 2007.

Eleito em abril para a presidência da Associação Suíça de Autoras e Autores, vive em Zurique

A Associação de Autoras e Autores da Suíça (AdS) foi criada em 2002 depois da dissolução da Sociedade Suíça de Escritores (SSE) e do Grupo de Olten, criado em 1969 devido divergências ideológicas.

Segundo o presidente da AdS, Reto Finger, as divergências estão superadas. “A vantagem de se reunir para lutar juntos por melhores condições foi compreendida pela maioria”, diz o novo presidente.

A AdS tem atualmente 930 membros, incluindo tradutores literários.

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