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Grande decepção após a conferência do Rio

Keystone

Vinte anos após a Cúpula da Terra, que havia imposto o meio ambiente na agenda global, a cimeira sobre o desenvolvimento sustentável foi concluída neste fim de semana em uma saraivada de críticas no Rio de Janeiro. A imprensa suíça, entretanto acolheu em quase indiferença a conclusão do texto final.

Adotado por cerca de 190 países sexta-feira no Rio de Janeiro, o resultado da conferência do clima, chamado “O Futuro que Queremos”, 50 páginas, não provocou comentários apaixonados na imprensa suíça. É verdade que o consenso mínimo desenvolvido pelo Brasil, anfitrião da conferência, já havia sido preparado antes mesmo da cúpula. A conferência “foi decidida entre altos funcionários em sua fase preparatória”, observa o jornal da Suíça francesa Le Temps.

A chegada dos políticos, numerosos na ausência, não mudou nada. No entanto, Franz Perrez, chefe da delegação suíça, declarou nas colunas do Le Temps que poderia ter sido obtido um resultado mais consistente: “Os ministros são mais favoráveis a um equilíbrio entre os três pilares do desenvolvimento sustentável do que seus negociadores”.

“Apenas declarações de intenção foram aprovadas. Pelo menos elas não são piores que as de há 20 anos”, escreveu o Bund, da capital Berna, em sua edição de sábado. Tendo em conta os meses de luta que levou à elaboração de cada parágrafo, este status quo pode ser descrito como bem-sucedido. O jornal bernês acredita que “o reconhecimento de uma economia verde faz parte dos pequenos sucessos alcançados no Rio”, mas observou que nem “o consumo mundial atual nem o modelo de produção foram questionados” com o texto aprovado no Rio de Janeiro.

A prudência prevalece

“No Rio, a cautela prevaleceu até o fim”, destaca o Le Temps. As consequências práticas da Rio +20 serão sentidas em poucos anos, sublinhou por sua vez o jornal de Zurique NZZ. “É possível que as coisas fluam na questão do desenvolvimento sustentável, mas também é possível que o trabalho fique encalhado, tragado pelos desafios políticos ou destruído pelo conflito de interesses”.

Assombrado pelo fracasso da conferência de Copenhague em 2009, que terminou em um fiasco retumbante, os países ricos e pobres concordaram com uma série de promessas para curar as feridas do planeta. A longa lista de males inclui pobreza, fome, e também desertificação, esgotamento dos oceanos, poluição, desmatamento e risco de extinção de milhares de espécies. A Rio +20 defende uma “economia verde”, modelo de desenvolvimento menos destrutivo para o planeta, cuja população deverá aumentar de sete bilhões atuais para 9,5 bilhões até 2050.
 
Mas por causa dos temores dos países em desenvolvimento, que consideram que o conceito esconde um protecionismo disfarçado dos países desenvolvidos, a declaração sublinha que “as políticas de economia verde devem respeitar a soberania nacional de cada país e não constituir uma restrição disfarçada ao comércio internacional”.
 
A questão do financiamento permaneceu sem solução. Em tempos de crise, e com seus orçamentos vacilando, os países desenvolvidos não têm mais os meios para pôr as mãos nos bolsos. A proposta de criar um fundo de 30 bilhões de dólares não teve apoio.

Copo pela metade

O texto final foi aplaudido pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, como sendo “um documento muito bom, uma visão sobre a qual podemos construir nossos sonhos”. A Secretária de Estado americana, Hillary Clinton, também saudou o resultado: “Nós nos unimos em torno de uma declaração final que marca um verdadeiro avanço para o desenvolvimento sustentável”, disse.

A ministra suíça encarregada do meio ambiente, Doris Leuthard, declarou na sexta-feira para a televisão suíça que “o copo está mais meio cheio do que meio vazio”. Devido à crise financeira, a meta da sustentabilidade caiu na agenda política, reconheceu Leuthard. “A nossa ambição foi maior, mas ainda temos resoluções que estão na direção certa”, disse.

O tom foi muito diferente na sociedade civil, que permaneceu muito irritada. Rosmarie Bär, membro da delegação federal para a conferência anual da Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável da ONU, defendeu nas colunas do Migros Magazin que os países desenvolvidos não levam a sério a responsabilidade deles. “Faltou vontade política para a mudança”. Advertindo também que a corrida à energia não-renovável “vai se tornar ainda mais atroz”.

“Um fracasso total”

Felix Gnehm, membro da delegação suíça e especialista em desenvolvimento do WWF Suíça, lamenta amargamente a falta de progressos no Rio de Janeiro. “O mundo político não demonstrou qualquer ambição para o futuro nestas negociações. É assustador. O planeta precisa de muito mais do que palavras e de compromisso”, declarou ao jornais 24 Heures e a Tribune de Genève.

Também nas colunas do 24 Heures, Isolda Agazzi, responsável pela política de desenvolvimento da ong Alliance Sud, não se mostra mais afável: “O objetivo deste encontro era a implementação do desenvolvimento sustentável e, neste ponto, foi um fracasso total. A declaração final não traz quase nenhum compromisso novo. Ela não reconhece a finitude do planeta. Ela não propõe uma mudança de paradigma para ir além do crescimento do PIB, e se contém apenas em lançar um programa de trabalho para desenvolver novos indicadores.”

A Suíça defende o reforço do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUE) em parte sediado em Genebra, no contexto da Rio+20. Os múltiplos acordos dessa área seriam coordenados pelo PNUE.

Ao chegar ao Rio, a delegação suíça descobriu o projeto de transferir todo o PNUE para Nairóbi no Quênia. Ela teve de se ativar durante quatro dias para conseguir reverter a tendência e manter Genebra, através de contatos diplomáticos especialmente com a União Europeia, Estados e Brasil.

A ministra suíça do Meio Ambiente, Doris Leuthard, defendeu Genebra inclusive como sede de um eventual futuro organismo, o Fundo Verde para o Clima.

As informações são do enviado especial do jornal Le Temps, de Genebra, à Rio+20.

Adaptação: Fernando Hirschy

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