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Duas mulas, um cachorro e um bote para o Himalaia

Céline Overney e Mathias Berovalis ao atravessar a Turquia. Overney/Berovalis

Céline Overney e Mathias Berovalis saíram da Suíça a pé há três anos. O sonho é de chegar ao Himalaia com seus dois burros e um cachorro.

Após terem percorrido 10 mil quilômetros, as autoridades indianas os bloquearam, impedindo os animais de entrarem no país.

Nosso encontro é em frente da estação de trem de Nova Déli, no bairro para pensões de mochileiros e outros turistas de orçamento apertado. Céline e Mathias trazem lenços coloridos amarrados no pescoço, sandálias de caminhada e bolsa a tiracolo. Mas o jovem casal não está lá para passear. Eles vieram a Déli para lutar contra a administração indiana. Nesta noite, os dois suíços estão estafados: como nos últimos três meses, eles passaram o dia sendo enviados de uma repartição a outra.

“Nunca imaginei que nós teríamos de subir tão alto”, se exclama Céline, revoltada. “Nós chegamos mesmo a ficar plantados na casa do ministro da Agricultura para que ele nos recebesse. No final conseguimos. Ele escutou nossa história e prometeu nos ajudar. Mas nada mudou: nossos burros ainda estão retidos na fronteira com o Paquistão desde janeiro!”. As autoridades recusam a entrada dos seus animais no território indiano. Para elas, os equídeos entram na categoria de produtos de importação restrita como…as munições.

Quarentena

Após várias semanas de negociação, os serviços de alfândega explicaram finalmente aos dois suíços como fazer para entrar seus animais no país: eles devem colocá-los em quarentena por três meses no Paquistão, antes de fazê-los viajar por avião e colocá-los por mais um mês de quarentena depois de chegarem à Índia! Uma proposta cara demais e considerada um grande absurdo pelo casal.

Portanto, a aventura havia começado bem. Ainda adolescentes, eles tinham decidido visitar juntos o Himalaia. Após terem se perdido de vista por oito anos, se reencontraram e se apaixonaram. “Sabíamos que um dia iríamos fazer essa grande viagem”, lembra-se Mathias. “Dá para ler livros e ver as notícias na TV por algum tempo, mas depois é necessário realmente viver as coisas”.

Foi dessa forma que, aos trinta anos, os dois suíços largaram seus empregos de enfermeira e osteopata e começaram a caminhar em direção à Ásia, sem data de retorno. Um projeto difícil de explicar às pessoas: “Quando contávamos aos passantes que iríamos caminhar a pé até a Mongólia, eles achavam que estávamos loucos. Além disso, no início, quando não tínhamos os burros, havíamos construído uma pequena carroça para nossas bagagens que a gente puxava atrás de nós. Algumas pessoas que nos viam passar ficavam com medo e até fechavam suas janelas!”.

Da Suíça à Albânia

Assim eles atravessaram os desfiladeiros do Grimsel, Furka e o Gotardo. Depois foram meses de peregrinação através da Itália, Eslovênia, Croácia, Montenegro e depois a Albânia. Foi lá que eles encontraram seu primeiro companheiro de viagem: Skadar, comprado em um mercado local de burros. Bem rápido o trio encontrou seu ritmo de cruzeiro: acordar com o sol para aproveitar da natureza que acorda, uma boa pausa ao meio-dia em um canto de vegetação e a partir do momento que o sol começa a se pôr, procurar um vilarejo para dormir.

“Essa é uma grande escola de vida”, sorri Mathias e continua. “Tomar um copo de água depois de duas horas de caminhada tem outro gosto do que simplesmente abrindo uma torneira. Além disso, durante a rota, todos os dias, ocorrem encontros”. Dependendo da situação, eles podem dormir na casa dos habitantes, na sua própria barraca, em estábulos ou ainda em antigas estalagens de caravanas datando da grande época da rota das especiarias. “Nós até chegamos a passar quatro meses na casa de um camponês grego. Quando encontramos refúgio por lá, era o início do inverno e ele propôs nos abrigar”. Uma estadia baseada também na troca: Nikos oferecia a casa e os cobertores e seus hóspedes cozinhavam e cuidavam dos seus animais.

O problema das fronteiras

Ao repartir na primavera, Céline e Mathias procuraram um segundo burro. “São animais de rebanho. Sozinho o Skadar ficava deprimido”, justifica a jovem. Logo quando um velho lhes ofereceu na beira da estrada uma mula, eles aceitaram imediatamente. “Ela era magnífica. Toda negra. Quando a trouxeram, foi uma confusão no vilarejo: Skadar deixou sair o seu negócio….ela virou a sua cabeça.”

Mas hoje em dia, burros que atravessam os continentes não são comuns. Para permitir que seus animais atravessassem a fronteira, o casal foi obrigado a vaciná-los como animais domésticos, exatamente como se faz com cachorros ou gatos. O Irã lhes deu um visto de trânsito e o Paquistão também. Só a administração indiana se mostrou pouco cooperativa.

“Esperávamos mais compreensão em um país onde os animais são sagrados”, lamentam-se os suíços. “Antes de chegar à Índia atravessamos três países muçulmanos, onde os habitantes nos receberam de braços abertos. Aqui é mais duro. As pessoas só querem nosso dinheiro, elas nos mentem e nos enganam a toda hora.”

A última esperança para recuperar seus burros é fazê-los passar por “animais de companhia” e, dessa forma, evitar as restrições sobre as importações de equídeos. Para Céline, isso seria totalmente justificado: “Passamos 24 horas sobre 24 com os nossos burros, como animais de estimação. Nós nos os utilizamos somente para transportar carga”. Após ter passado nove semanas lutando contra a burocracia indiana, os dois aventureiros recomeçaram do zero todos os seus trâmites.

Miyuki Droz Aramaki, swissinfo.ch, Nova Déli

Mumbai. o número de suíços que vivem na Índia não é muito elevado. A maior parte deles habita nas regiões de Mumbai (antiga Bombay) e Bangalore, a chamada “Silicon Valley” do país.

Lista. A embaixada suíça em Nova Déli tem apenas 300 suíços registrados.

Multinacionais. A maioria dos suíços presentes na Índia trabalham para empresas helvéticas ativas no país. As multinacionais são as mais numerosas, mesmo se as pequenas e médias empresas começam também a investir no país.

Quem? Nestlé, ABB, Bobst, Novartis, Holcim ou ainda o UBS fazem parte das empresas helvéticas presentes no mercado indiano.

Parceria. A Suíça faz parte dos 10 maiores investidores mundiais na Índia. Esse país se transformou em um dos principais parceiros econômicos da Suíça na Índia.

Campeões do mundo. Também a Suíça atrai cada vez mais capitais indianos. Segundo a Associação Suíça de Banqueiros, com 1.450 bilhões de dólares depositados nos bancos helvéticos em 2006, os indianos seriam os campeões do mundo.

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