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Ex-chefe da Nespresso quer mais concorrência

Gaillard se prepara para dar o próximo passo. AFP

Ex-chefe da Nespresso, Jean Paul Gaillard, afirma não ter sido motivado por vingança ao decidir criar um fabricante rival de cápsulas de café.

Ignorando as ameaças legais da Nestlé, Gaillard afirma que sua Companhia Ética de Café (ECC, na sigla em inglês) irá aumentar a produção com uma nova fábrica na Suíça após receber investimentos na ordem de 50 milhões de euros.

Nascido no cantão do Valais (sul da Suíça), Jean Paul Gaillard é visto como o executivo que deu a virada no setor de cápsulas de café da Nestlé nos anos em que foi chefe da Nespresso, de 1988 a 1998. Hoje esse braço do gigante suíço domina o mercado. Só no ano passado, as vendas da cápsula tiveram um aumento de 22%, totalizando 2,77 bilhões de francos (US$ 2,8 bilhões).

Gaillard desafiou a domínio da Nestlé em maio ao lançar cápsulas mais baratas e biodegradáveis no mercado, que podem ser utilizadas nas máquinas Nespresso. Nestlé respondeu iniciando um processo judicial contra a ECC – e outra empresa rival, a Sara Lee – por supostas violações de patentes.

Em entrevista à swissinfo.ch do escritório da ECC em Friburgo, Gaillard afirma ter sido mais motivado pelo desafio de criar uma nova empresa do que aproveitar o luxo, mas menos estimulante, de um importante posto em uma grande multinacional.

“Estou farto de pessoas que escreve que estou nesse negócio por vingança”, declara. “Quando vi algo que ela (a Nestlé) não tinha visto, eu me perguntava se deveria ou não aproveitar a oportunidade, pois a Nespresso era o meu bebê. Mas então pensei: negócios são negócios e isso é bom para o globo.”

Herança da Terra

De acordo com Gaillard, essa “coisa” não vista era a competência de entrar na fatia dos preços médios e dos consumidores com consciência ecológica e entrar na brecha dos 1.700 produtos patenteados pela Nestlé.

Gaillard insiste que o meio-ambiente é um tema muito próximo ao seu coração. “Tenho quatro crianças e a mais nova tem cinco anos e meio. Em 30 ou 40 anos, ele continuará por aqui enquanto eu já não”, declara.

“Quando você vê o estado do planeta aonde iremos (a próxima geração) viver, é um desastre.”

A convicção do empresário de poder ganhar uma luta de patentes poderia ser bem colocada em teste nos tribunais. Um mês depois da EEC ter lançado seus produtos na França, a Nestlé conseguiu que uma amostra de cápsulas fosse apreendida pelas autoridades francesas como mercadorias contrabandeadas.

Gaillard descreveu a ação como “intimidação” e rejeitou as ameaças legais como nada mais do que uma tempestade em copo d’água. “Por lei, ela (Nestlé) tinha que pagar pelo que confiscou, mas nós tivemos o prazer de oferecê-las gratuitamente”, conta à swissinfo.ch.

Nestlé declara ver com bons olhos concorrência legal, mas que iria “tomar as medidas apropriadas” para defender sua propriedade intelectual. “Nós nos esforçamos na pesquisa para inovar e nos manter a frente da nossa concorrência. Então, quando nossas inovações são violadas, a consequência é defender nossos direitos”, escreve a companhia em um comunicado.

Entrando na cova dos leões

Impávido e sereno frente a uma potencial disputa com advogados de uma poderosa corporação, Gaillard diz que irá utilizar os 50 milhões de euros colocados por investidores na sua empresa para construir uma segunda fábrica.

A escolha de um local de instalação, que irá complementar a fábrica já produzindo em Chambéry, França, está entre Charmilles ou Friburgo na Suíça.

A produção corrente de mais de 100 milhões de cápsulas por ano será aumentada em breve para 300 a 400 milhões com novas máquinas em Chambéry. O empresário afirma que a produção chegará em breve à marca de “bilhões” de cápsulas para atender aos pedidos que já terão chegado a bem mais de quatro bilhões.

ECC também planeja vender seus produtos em outros mercados, incluindo a Suíça. Gaillard acredita que os supermercados suíços não irão refutar de colocar as cápsulas da ECC nas prateleiras pelo medo de represálias por parte da Nestlé. “A balança de poder entre distribuidores e fabricantes caiu para o lado dos distribuidores”, analisa.

A opinião dos analistas é dividida na questão da posição dominante da Nestlé poder se erodida pela concorrência emergente. Porém ela parece se tornar mais relevante se a ECC e outros competidores conseguirem persuadir os consumidores dos produtos da Nespresso, que eles não irão comprometer a qualidade e o gosto se estiverem pagando menos por um produto similar.

A resposta da Nestlé

O consultor de produtos alimentícios, James Amorosa, declarou no início do ano à swissinfo.ch que duvidava se os consumidores do Nespresso realmente se preocupam com o preço ou qualidade.

No entanto, Brian Morgan, um analista do mercado de bebidas na Euromonitor International, acredita que existe a demanda por cápsulas mais baratas. Em sua opinião, também a Nespresso encontrará dificuldade para justificar a superioridade dos seus produtos, agora que produtos concorrentes podem ser utilizados em suas próprias máquinas.

“Enquanto a liderança de mercado firmada por eles parece estar garantida em curto prazo, a Nestlé deverá provavelmente tomar medidas para enfrentar essa nova ameaça através de mais ofertas exclusivas, expansão para os supermercados ou opções legais para defender suas patentes”, afirmou em um relatório.

Nesse meio tempo, Nestlé não está inerte enquanto a concorrência cresce. Tendo aberto uma nova fábrica no ano passado, a companhia também planeja expandir o número de butiques, intensificar esforços para reclicar o alumínio das cápsulas e produzir máquinas melhores.

A Nestlé foi a primeira empresa a introduzir no mercado o café de qualidade em cápsulas (1986) – 10 anos depois de registrar as patentes.

O início, os produtos da Nespresso tiveram apenas um sucesso moderado. Depois, graças a uma nova estratégia de marketing voltada para o mercado de produtos sofisticados, as vendas melhoraram.

A Nespresso se estabeleceu como uma marca ícone para o consumidor através de uma linha de máquinas e cápsulas que podem ser compradas através da internet ou em uma das butiques, cujo número é crescente. Consumidores também podem entrar no exclusivo clube Nespresso.

A contratação do famoso ator americano George Clooney para promover a marca também reforçou a imagem da Nespresso.

Enquanto a Nespresso decolou, empresas concorrentes foram rápidas em produzir suas próprias máquinas e cápsulas com preços mais moderados. Porém Nespresso continua dominando o mercado graças à sua reputação de qualidade superior.

A chegada de novas cápsulas concorrentes no mercado – e que podem ser utilizadas em máquinas Nespresso – representam uma ameaça mais séria ao domínio da Nespresso.

Um pacote de 10 cápsulas Nespresso custa geralmente 3.70 euros (4.87 francos suíços). Já os produtos similares do concorrente Sara Lee (L’OR) custa €2.99. As cápsulas da ECC custam €2.60.

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