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O guarda-roupa como aliado na reconstrução da identidade

Renata Ajonas recomenda bom senso e o uso do estilo pessoal para adaptar o visual ao do país estrangeiro. Divulgação

Além de aprender um idioma diferente e outros códigos de conduta, imigrantes precisam adaptar a imagem pessoal ao país estrangeiro sem perder a essência.

Renovar o guarda-roupa pode estar entre as mudanças que imigrantes têm pela frente, dependendo do país de destino. Isso acontece com brasileiros que emigram para a Suíça. O clima frio do Hemisfério Norte e a diferença cultural interferem na maneira de se vestir e podem dificultar o processo de adaptação. A cultura influencia nos trajes e até mesmo na interpretação da moda. Então, esse imigrante que sempre soube combinar peças de roupa e se vestia com autoconfiança, hesita com hábitos tão diferentes.

Não se trata de uma ode à moda ou estímulo ao consumismo, mas é importante falar sobre o abalo pessoal sofrido com a perda da referência ao mudar-se de ambiente cultural e da conexão com o estilo da vestimenta que todos têm. Imagem privada e autoconfiança andam de mãos dadas, por isso a dobradinha encontro do novo visual e adaptação serem processos que acontecem simultaneamente. Na realidade de imigrante, esse sentimento é ainda mais forte. Afinal de contas, como pertencem a uma categoria minoritária, têm mais dificuldade em passar confiança ao morador local, que segue outros valores e padrões. O psicólogo americano Albert Mehrabian, especialista em comunicação não verbal, confirma a que apenas 30 segundos são suficientes para que o outro julgue e seja julgado.

* Artigo do blog “Suíça de portas abertas” da jornalista Liliana Tinoco Baeckert.

Um dos primeiros choques culturais dos brasileiros é constatar que até no verão suíço pode fazer mais frio que o pior dos invernos brasileiros. A imensa quantidade de shorts e camisetas, por exemplo, não terá mais serventia. Outro desafio é saber usar e combinar as peças de inverno e montar, dentro desse novo cenário, um guarda-roupa que aqueça e promova autoestima. Para homens, essa questão é mais fácil, já que as peças são básicas e praticamente iguais no mundo inteiro.

Para as mulheres não. Entre vários exemplos de inseguranças e insatisfações, muitas brasileiras reclamam que se cansam de usar roupas de tons escuros e fechados e sentem falta de cores mais comuns em países tropicais. O antropólogo Edward Hall explica essas diferenças categorizando nações em conceitos como policromático e monocromático, do inglês Polychronic e Monochronic. Países mais frios, onde o cinza é constante e os cidadãos são guiados pelo trabalho árduo e pontualidade extrema, pertencem à categoria monocromática. A Suíça está obviamente inserida nesse grupo.

Imigrar significa repaginação

A psicologia da imigração explica que todo imigrante precisa passar pela reconstrução de seu eu e se reinventar. E esse período de reinvenção é árduo, com perda de referências pessoais e reelaboração de valores próprios. De acordo com a estilista pessoal e consultora de imagem Tsitaliya Mircheva-Petrova, a reelaboração do estilo faz parte desse processo. “Funciona como uma repaginação. Se você fosse uma marca, teria certamente que adaptar sua logo a essa nova realidade”, explica Tsitaliya, que também escreve no blog Mums in Heels sobre moda e estilo de vida para mães na Suíça.

A consultora de moda e estilo Renata Ajonas diz que a roupa precisa ter a identidade do dono. “Se você não está vestido de você mesmo, ou seja, usando uma peça que não combine com o seu eu, vai se sentir insegura” explica Renata, que é brasileira e já morou na Noruega e vivenciou a realidade de imigrante. A estilista de Moda Kathy Patellis-Schmidt afirma que estilo tem a ver com quem você é e tem que vir de dentro, externalizando o bem estar. Kathy é canadense e mora na Suíça.

A escritora e consultora de moda Gloria Khalil, em seu livro Chic: Um Guia Básico de Moda e Estilo, explica que “o estilo manifesta sua identidade social e sinaliza para os outros de que modo você quer ser tratada. No livro britânico Porque moda importa (Why Fashion Matters), Frances Corner, que é diretor da Universidade Londrina de Moda, explica que ela está conectada com a arte de se adornar, com a apresentação visual para o mundo. “O que nós escolhemos vestir reflete como nós vemos o entorno e como queremos ser vistos pelas pessoas”, conclui.

Cultura influencia  

Mesmo no verão, as roupas europeias têm corte geralmente mais comportado, com decotes menos generosos. Dessa maneira, muitas brasileiras se sentem inseguras quanto ao uso de uma roupa trazida do Brasil que mostre um pouco mais que as vestimentas suíças, por exemplo. Adicione a esse caldeirão de questionamentos o fato de muitas estrangeiras temerem sofrer preconceito devido a vestimenta, principalmente por saberem que carregam a fama de erotizadas.

Juliana Petraglia diz está cansada e usar roupa escura. Divulgação

A alagoana Juliana Petraglia reclama que, desde que saiu de Alagoas, sentiu que seu guarda-roupa se tornou triste e fechado. No entanto, ela tem medo de ousar e usar tons mais alegres e coloridos, temendo ser alvo de olhares. Outro componente cultural é a forma como a mulher suíça expressa sua feminilidade. As roupas precisam ser práticas, fáceis de passar. É bem raro vê-las com a quantidade de bijuterias que uma brasileira usaria, unhas pintadas ou salto alto. Em geral, o figurino básico é calça jeans, camiseta de malha e jaqueta para frio, na maioria das vezes com cores leves ou fechadas. Esse novo papel social confronta e confunde a brasileira, que fica sem saber como expressar sua feminilidade na vestimenta. Como brasileira, Renata Ajonas entende o medo de errar na escolha da roupa, mas a questão passa novamente pelo autoconhecimento. “Se a mulher se encaixa no perfil mais discreto, vai evitar roupas com transparências, decotes e fendas exageradas. Conhecendo seu estilo pessoal, poderá fazer escolhas mais coerentes e confiantes”, diz Renata.  

Feminilidade à prova

Clima frio, cultura diferente, mulheres que pouco expressam feminilidade na vestimenta, poucas estampas, paleta de cores limitada. Essas são apenas algumas das dificuldades encontradas pelas brasileiras na Suíça, principalmente na parte alemã. A redefinição de seu papel enquanto mulher, a escolha de uma roupa que não atraia a atenção ou a escolha de um modelo que revele a sensualidade mesmo com temperaturas abaixo de zero são desafios. Questões sobre como fazer para manter o estilo mais colorido no longo e escuro inverno? É possível manter a feminilidade, mesmo vivendo em um país no qual as mulheres se vestem de forma mais masculina?

Sim, é possível e essencial manter as preferências das roupas, mesmo que o clima e a cultura sejam totalmente diferentes da do país de origem. Tsitaliya recomenda que as brasileiras ou qualquer outra imigrante jamais percam a identidade e a maneira individual de se vestir. “Não existe erro, existem alguns códigos, mas expresse quem você é e não mude sua essência”. Kathy Patellis-Schmidt confirma: “mantenha sua autenticidade”.

De acordo com a consultora de Moda e Estilo Renata Ajonas, é essencial que a mulher conheça as preferências, o que irá nortear os próximos passos nesse ambiente tão diverso como a Suíça. Renata fala com propriedade, já que conhece bem o país. Afinal de contas, o importante, segundo todos os especialistas, é o bem estar. 

Já pensou sobre seu estilo? Existem sete estilos, segundo estudos universais da mulher: romântica, esportiva, clássica, contemporânea, dramática, sensual e étnica. – Clássico: compre casacos atemporais e de qualidade, cortes elegantes e cores mais discretas – Sensual: as costas de fora não funcionam devido ao frio, mas vale uma saia com fenda, por exemplo – Contemporânea: vai buscar texturas e cores diferentes nos casacos. Essa mulher quer seguir a tendência na moda – Dramática: vai usar e abusar da criatividade nos gorros, bolsas e com as cores. – Romântica: pode trazer estampas florais para blusas, cachecóis e até casacos em tons de bege e branco. – Esportiva: que prima pelo conforto, pode e deve vestir o seu jeans e tênis, desde que componham o visual com elegância – Étnica: mantém o estilo com os acessórios como com uma faixa na cabeça, brincos e colares, além de roupas com estampas fortes e meia calça por baixo. 

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