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Cantões “se acalmam” na concorrência fiscal

A política fiscal praticada pelos pequenos cantões da Suíça Central não agrada a todos os cidadãos Keystone

Durante muito tempo, eles se bateram para ter os impostos mais baixos. Hoje os cantões da Suíça Central questionam os fundamentos dessa concorrência fiscal acirrada. O resultado foi um crescimento demográfico que agora pesa sobre as finanças da região.

Os paraísos da Suíça Central são tanto naturais que fiscais: lagos, montanhas nevadas, natureza intacta, e estados (cantões) que cobram impostos moderados da pessoa física e os lucros e capitais das empresas. A notícia correu e contribuintes estrangeiros se precipitam, quando podem, que a União Europeia reclama – contra a Suíça em geral e não somente contra os cantões do centro do país.

Se Bruxelas e os outros cantões sofrem da concorrência desses “paraísos fiscais”, que baixaram bastante seus impostos durante os anos 2000, eles não são os únicos a reclamar: um descontentamento começa a se instalar dentro desses cantões. Foi um político democrata-cristão, Othmar Reichmuth, membro do governo estadual de Schwyz, que lançou a discussão no final do ano passado.

Através da imprensa, o político questionou “o que queremos realmente?” E denunciou os efeitos colaterais das reduções de impostos: “49% de habitantes a mais em 30 anos, mais de 3 mil carros a mais por ano, aluguéis e prêmios de seguros não cessam de aumentar, trens e estradas lotadas de manhã à noite”. Reichmuth, que é queijeiro de profissão, respondeu à própria pergunta: “Eu não preciso de estradas com seis pistas, nem de executivos que ganham salários mirabolantes, nem de estrangeiros que se beneficiam de tratamentos de favor para os impostos.”

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Impostos começam a aumentar

Othmar Reichmuth provocou um eletrochoque na Suíça Central. Essa onda se prolongou em dezembro com a aprovação pelos cidadãos da cidade de Lucerna de uma alta de três pontos nos impostos. Sem dívidas até 2007, essa cidade altamente turística à margem do Lago dos Quatro Cantões passou a ser deficitária. Todos os partidos aceitaram aumentar os impostos, com exceção do Partido do Povo Suíço (SVP na sigla em alemão, maior partido suíço).

Do dia para a noite, Othmar Reichmuth tornou-se a figura simbólica de uma certa insatisfação. Uma sondagem do jornal Bote der Urschweiz (literalemente “o mensageiro da Suíça primitiva”) indicava que, para 57% dos cidadãos de Schwyz, o aumento da população induzido pela atração da região era uma “maldição”. Quatro anos antes, 55% deles a qualificava de “benção”.

É verdade que o crescimento demográfico é particularmente forte na região. Em toda a Suíça Central (Schwyz, Lucerna, Nidwald, Obwald, Uri e Zoug), a população aumentou de 40% desde 1972, segundo a Divisão Federal de Estatística.

– Proporção de ricaços (a partir de 10 milhões de francos) em relação à população de um cantão, em 2009:  Schwyz (0,84%), Nidwald (0,8%) e Zoug (0,76%) são os primeiros; Valais (0,05%), Uri, Fribourg e Jura (0,06%) são os últimos. Fonte: administração federal de contribuições (fisco federal).

–  Índice de exploração do potencial fiscal, que reflete o total de impostos de um cantão. Ele é inferior à média (valor: 100) nos cantões de Nidwald (64), Schwyz (54) e Zoug (49,8). No outro extremo estão os cantões de Genebra, (128,7), Jura (126,3) et Fribourgo (123,7). Fonte: Divisão Federal de Estatística

– Segundo o Instituto BAK, de Basileia, os cantões de Nidwald e Lucerna têm os impostos mais favoráveis às empresas (média de 10,6%). Em lista não-exaustiva: Obwald (11,1%), Schwyz (11,6%) e Zoug (12,8%). Na outra extremidade, lista não exaustiva: Genebra (21,4%), Basileia (19,6%), Valais (19,6%) Vaud (19,7%)

– Em comparação internacional, apenas Hong-Kong tem impostos médios inferiores (9,7%). Na Europa, a Irlanda tem impostos comparáveis aos dos cantões suíços. Fonte: Bak Basileia Economics, julho de 2012/ATS

Limitar o número de novos habitantes

Em 2013, os orçamentos públicos ficarão no vermelho, especialmente em Schwyz e Zoug. Alguns consideram que isso é consequência direta da baixa dos impostos, outros estimam que esses cantões, com a euforia da alta conjuntura, descuidaram das despesas e aumentaram o número de funcionários. É o caso de Schwyz, que abandonou uma política orçamentária muito conservadora para contratar policiais e outros funcionários.

No cantão de Zoug, paraíso das empresas internacionais, perto de Zurique, é a falta de apartamentos com aluguéis moderados que provoca críticas. Também é por isso que Othmar Reichmuth tem seguidores.

No início deste ano, o chefe do governo, Beat Villiger, dizia ao jornal NZZ am Sonntag, que está na hora de frear o crescimento estabelecendo um novo limite para novos habitantes: 11.000 ao invés de 22.000 até 2030. Dá para imaginar então uma mudança completa da política fiscal? A maioria dos comentaristas não vai tão longe.

“Estamos num momento particular da história”, afirma Nils Soguel, professor de finanças públicas no Instituto de Altos Estudos em Administração Pública (IDHEAP). “Além das pressões internacionais, essas iniciativas de “contenção” coincidem com o fim de um ciclo conjuntural. O crescimento demográfico também coloca uma questão de identidade: a chegada de novos habitantes cria a necessidade de integrá-los, o que coloca novos problemas.”

Confrontado a vizinhos fiscalmente poderosos (Schwyz, Zoug e Obwald, há alguns anos), o cantão de Lucerna reduziu impostos para atrair empresas, cortando pela metade o imposto sobre o lucro.

No total, foram feitas três revisões fiscais em 2005, 2008 e 2011. As reduções totalizaram 207 milhões de francos, 155 (77%) para pessoas físicas e 52 milhões (25%) para as empresas.

Socialistas e Verdes denunciaram a necessidade de cortes nos serviços públicos para equilibrar as contas, causadas pela perda de arrecadação, e reclamam aumento de impostos sobre o lucro das empresas.

O governo estadual defende sua estratégia afirmando que as receitas fiscais provenientes das empresas aumentaram de 64%, passando de 85,9 milhões de francos suíços para 140,9 milhões, entre 2001 e 2011.

Imagem rural

Para Beat Kappeler, economista e editorialista, “essas posições são sobretudo destinadas aos eleitores desses cantões, embora a insatisfação da população é real. Os habitantes sofrem os efeitos do afluxo de capitais. Essa reação ainda a que ponto esses pequenos cantões, como Schwyz e Zoug, são apegados à imagem “rural”, enquanto a aparência deles mudou muito. Zurique, ao contrário, não tem problema com os grandes edifícios que se constroem e tem até um certo orgulho.”

Schwyz e Zoug  queixam-se também de pagar uma cota-parte muito grande ao governo federal, no sistema federalista suíço que redistribui subsídios conforme os recursos e os encargos dos cantões. “Esses cantões têm a impressão de pagar pela ineficiência de outros”, explica Nils Soguel. “Mas eles são cantões ricos. Colocar em questão o sistema é colocar em questão a solidariedade e seus mecanismos.”

“Alguma coisa mudou na mentalidade da população, mas não tenho ilusões” afirma Josef Lang, vice-presidente do Partido Verde e deputado federal pelo cantão de Zoug. “Politicamente, ainda estamos longe da alta de impostos, mesmo se a votação da cidade de Lucerna terá certamente o efeito de frear.”

Othmar Reichmuth, se considera como um “herói corajoso” de uma nova causa? “De jeito nenhum, muito pelo contrário”, responde. “Eu sou realista e não se pode parar o crescimento. Eu só queria dar um impulso”, conclui. Enquanto isso, os impostos no cantão de Schwyz já aumentaram.

Adaptação: Claudinê Gonçalves

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