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Meta: “Estamos investindo em Zurique, pois lá encontramos os melhores talentos”

Homem de pé
Rasmus Dahl: "A Suíça é muito forte nas tecnologias que estamos desenvolvendo em Zurique". Philipp Jeker Photography

Meta (ex-Facebook) investe bilhões de dólares no metaverso, um espaço virtual onde avatares digitais representando pessoas interagem. A gigante da tecnologia abriu um escritório em Zurique para pesquisar a tecnologia e deverá empregar até 300 programadores. Seu chefe local, Rasmus Dahl explica à swissinfo.ch como será o futuro em 3D.

Em outubro de 2021, Mark Zuckerberg anunciou que sua empresa seria rebatizada como “Meta” e detalhou seus objetivos para construir o metaverso, uma nova versão da web, como o sucessor da internet móvel. Muitos se perguntam desde então se os usuários trocarão as telas de computador pelos visores de realidade virtual para navegar dentro de mundos 3D.

swissinfo.ch: Por que a Meta decidiu estabelecer-se em Zurique?

Rasmus Dahl: Já estamos há cinco anos em Zurique. Nós montamos nossa estrutura ao comprar a Zurich Eye, uma spin-off of da Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH)Link externo Hoje estamos nos baseando fortemente na competência da ETH em robótica, em visão computacional e no campo chamado localização e mapeamento simultâneos (SLAMLink externo, na sigla em inglês). 

“A Suíça é muito forte em tecnologias que estamos desenvolvendo em Zurique”

Quando você olha para seu dispositivo Quest, você vê quatro câmeras nele instaladas. Essas quatro câmeras, mais alguns outros sensores, rastreiam a posição do dispositivo na sala. E isso é essencialmente um produto derivado de uma extensão adicional daquilo que esta equipe da Zurich Eye estava desenvolvendo.

O algoritmo de rastreamento assegura que você não fique enjoado ao mover a cabeça na cena virtual. Essencialmente, isto é a câmera olhando para a sala ao redor. Elas rastreiam então para onde o dispositivo está se movendo na sala. E então você traduz isso para a cena virtual que se move dentro. Com a tecnologia que estamos desenvolvendo aqui em Zurique, garantimos que os visores Quest possibilitem para os consumidores as melhores experiências no ambiente virtual.

Biografia

O engenheiro eletrônico Rasmus Dahl, 54 anos, começou sua carreira na Nokia. Depois trabalhou para uma startup de realidade virtual comprada pela Facebook. Nos últimos dois anos chefia a sede suíça da Meta.

swissinfo.ch: Como Meta está cooperando com universidades locais e centros de pesquisa na Suíça no desenvolvimento do metaverso?

R.D.: Colaboramos com universidades locais como a ETHLink externo e a EPFLLink externo. Estamos, é claro, abertos e sempre em busca de mais colaboração. Uma das principais razões pelas quais a Meta está investindo em Zurique é o acesso aos melhores talentos. Muitas das pesquisas na EPFL e na ETH são relevantes para o desenvolvimento de elementos como a percepção da máquina. Este dispositivo percebe o mundo ao seu redor ou pode realizar a representação digital de um ser humano, por exemplo.

A Suíça é muito forte em tecnologias que estamos desenvolvendo em Zurique. É um ambiente acadêmico muito forte e eles estão educando algumas das pessoas mais capazes do mundo. E essa é uma das principais razões pelas quais estamos na região; é essencialmente para termos acesso a talentos para a construção desses complicados modelos computacionais.

swissinfo.ch: Como são os profissionais buscados pela Meta em Zurique?

R.D.: São pessoas altamente especializadas. São técnicos especializados tanto em robótica como na sua navegação. Com robótica me refiro a tecnologias como a condução autônoma. Essa é basicamente a mesma tecnologia que estamos usando em nossos dispositivos e que é usada para navegar em um robô. Todos eles são especializados nos campos da percepção de máquina, ou seja, visão por computador, aprendizagem de máquina ou inteligência artificial. Em princípio, todos os campos que nos ajudam a desenvolver as tecnologias sobre as quais se pode construir o metaverso.

swissinfo.ch: O que esses programadores estarão construíndo?

R.D.: Sua missão é construir um certo conjunto de tecnologias que contribuam para o dispositivo Quest. Não estamos desenvolvendo o hardware em si. Somos responsáveis por essa tecnologia que rastreia e localiza o dispositivo no espaço em que nos encontramos. Da mesma forma, somos responsáveis por um conjunto de outras experiências que são tecnologias que contribuirão para os dispositivos Quest. A câmara Quest em si é desenvolvida e produzido em outro lugar. Nós especificamos exatamente onde a câmera deve ser colocada, qual deve ser o ângulo, qual deve ser o formato da lente. Há muitos detalhes que várias equipes precisam concordar e determinar para garantir que você não se sinta enjoado ao usar o dispositivo. E isso começa com o hardware.

O que é o metaverso?

O metaverso é um mundo de realidade virtual em 3D onde os usuários podem interagir, jogar e experimentar as coisas como fariam no mundo real na forma de um avatar. Usando a tecnologia atual de realidade aumentada (AR) e realidade virtual (VR), eles podem mergulhar neste mundo e interagir com objetos e pessoas sobrepostos no visual projetado à sua frente.

swissinfo.ch: Mark Zuckerberg disse uma vez que a visão futura do Facebook não é a versão bidimensional que temos hoje, mas o que é o metaverso? Como isso pode mudar a forma que navegamos na Internet?

R.D.: Imagine o metaverso como uma internet incorporada. Então, neste momento, você e eu temos uma conversa por vídeo-chamada em uma superfície 2D. Se quiséssemos fazer um brainstorming de uma nova ideia para algo, não é super ideal fazer isso em uma superfície 2D. OK, você pode fazer isso, você também pode criar documentos compartilhados, como todos nós já vivenciamos durante a pandemia, mas você não poderia ficar em um quadro branco juntos, certo?

Em um ambiente virtual, seu avatar, ou seja, sua representação digital, pode caminhar até o quadro branco e desenhar uma arquitetura de software, por exemplo. Imagine que você e eu poderíamos estar um ao lado do outro, ter essa sensação de presença e sentir que a distância física entre nós não é mais um parâmetro-chave. Podemos interagir e colaborar de forma muito mais natural, mesmo quando somos representados digitalmente. As representações 3D de nós mesmos tornarão os avatares tão comuns quanto as imagens de perfil são hoje. Nossos seres digitais não se limitarão a imagens ou vídeos 2D planos como hoje em dia.

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swissinfo.ch: A missão da minha empresa, SWI, é informar sobre a Suíça e explicar o país ao público no exterior. Como você pode imaginar nosso trabalho no metaverso?

R.D.: Sim, esse é um ótimo exemplo. Sem ser um especialista em mídia e publicação, acho que o 3D pode abrir experiências. Tome como exemplo uma apresentação de panoramas suíços bem conhecidos como Zermatt e o Matternhorn. Claro, você pode escrever um artigo sobre o assunto ou publicar um vídeo e compartilhar muitas informações. Mas e se você pudesse teletransportar-se para lá usando um Quest, ter essa experiência imersiva e ser o guia do tour? Você seria capaz de ouvir o som em 3D. Quando você estivesse retirando a mão da cachoeira, você seria capaz de olhar para cima e ter uma noção muito melhor da escala da natureza ali, para onde ir, etc., etc. Assim, o 3D e a incorporação hoje são capazes de trazer você para dentro do conteúdo, o que faz com que seja uma experiência mais rica.

Pessoa trajando um óculos Quest 2
O autor da entrevista utilizando os óculos 3D “Quest 2” no aplicativo que leva o usuário a uma casa em Falludscha, no Iraque. A visualização, intitulada “Home after war”, foi dirigida pelo cineasta Gayatri Parameswaran e levada para o metaverso. Nela, o internauta encontra um pai que perdeu seus filhos depois que uma bomba improvisada explodiu em sua casa em 2017, logo após a derrota do Estado islâmico. swissinfo.ch

swissinfo.ch: Quem será o responsável pela construção do metaverso? Será uma única empresa, ou será uma plataforma aberta?

R.D.:  O Facebook não vai construir, possuir ou administrar o metaverso por conta própria. É necessária a colaboração com formuladores de políticas, especialistas e parceiros do setor para fazer que ele aconteça. Construir isto será mais como quando a Internet surgiu do que como qualquer outro aplicativo que já foi lançado. Colaboraremos em todas as etapas com outras empresas, desenvolvedores, especialistas e formuladores de políticas.

swissinfo.ch: Meta ainda tem que lidar com alguns problemas em suas plataformas como discurso de ódio, bullying, desinformação, notícias falsas e fraude informática. Defensores e pesquisadores do direito à privacidade dizem que o metaverso também poderia comprometer a privacidade do usuário. Como a Meta protegerá os usuários contra abusos em sua plataforma?

R.D.: Esta é uma pergunta super importante. Do ponto de vista de um desenvolvedor, acho que há dois níveis para essa resposta. Primeiro, tudo o que estamos desenvolvendo, nós desenvolvemos com a privacidade em mente. Temos processos de privacidade. Temos processos para quando nossas equipes em Zurique estão desenvolvendo novas funcionalidades. Temos um processo de privacidade bastante rigoroso que estamos seguindo. Temos verificações em vigor, assegurando que pensamos sobre como tratamos os dados que entram e saem da plataforma que permite o metaverso.

Além disso, digamos que a Swissinfo queira implementar sua própria rede social, um grupo de conversação ou um grupo onde as pessoas que estiveram na Suíça possam compartilhar experiências em 3D. As pessoas podem se encontrar em torno dessas experiências e obter orientação sobre as ferramentas a serem utilizadas na Suíça: o moderador desse grupo seria um provedor de aplicações. Neste caso, a sua empresa. Você precisa pensar no metaverso muito mais como a Internet do que como o próprio aplicativo do Facebook. O aplicativo do Facebook em si será apenas um aplicativo, na plataforma Horizon, por exemplo. Como a Meta é proprietária da Horizon, será responsabilidade da Meta implementar as políticas, como é hoje no Facebook, para impor seus padrões comunitários.

* abaixo: A sala de trabalho SWI swissinfo.ch foi montada para a entrevista com Rasmus Dahl, chefe do escritório da Meta Zurich.

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swissinfo.ch no metaverso

Este conteúdo foi publicado em Escritório virtual da SWI swissinfo.ch construído pelo autor da entrevista no metaverso

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swissinfo.ch: Um obstáculo para as tecnologias como a realidade virtual (VR) e a realidade aumentada (AR) é o enjoo do movimento, que acontece quando os movimentos no mundo real não correspondem aos do virtual. Estima-se que uma em cada três pessoas tenha enjoo de movimento em algum momento. Como Meta quer lidar com este problema?

R.D.: Eu sofro de enjoo de movimento e quando experimentei alguns dos primeiros visores, antes mesmo de entrar na Meta, sofri de enjoo de movimento com eles. O truque é, mais uma vez, deixe-me voltar ao que desenvolvemos aqui em Zurique, o sistema de rastreamento posicional. O sistema de rastreamento que usa essas câmeras, precisa ser super preciso. É uma precisão sub-milímétrica com uma latência muito baixa, latências abaixo de 20 milissegundos, abaixo da sensibilidade de onde você está.

Seu sistema de percepção visual difere dos outros sistemas de percepção que você tem em seu ouvido interno. Se houver uma discrepância entre o que seus olhos estão experimentando e o que seu ouvido interno mede a partir do movimento de sua própria cabeça, você ficará enjoado por causa do movimento. Há um certo requisito que você precisa satisfazer em todas as condições para evitar o enjoo de movimento em uma grande parte da população. Eu experimentei os primeiros protótipos que desenvolvemos e pude ver semana após semana como os algoritmos melhoraram e como eu fiquei cada vez menos enjoado.

swissinfo.ch: Como é possível metaverso integrar os mundos virtuais existentes como The Sandbox, Decentraland, Cryptovoxels e de Gaming-Communities como Fortnite? No futuro, todos esses mundos deveriam ser interoperáveis?

R.D.: Não é nosso objetivo controlar o que diferentes empresas independentes fazem e como elas priorizam seus planos. Mas o que posso dizer é que este será um ecossistema verdadeiramente aberto que permite que desenvolvedores de todos os tipos possam prosperar e crescer.  Nossa prioridade é capacitar os criadores de conteúdo. Os criadores de todo o mundo estarão entre os primeiros a experimentar o potencial transformador desta nova tecnologia social on-line.

swissinfo.ch: A Gucci fez sua entrada oficial no metaverso ao comprar um terreno virtual no The Sandbox. Um terreno virtual adjacente ao Sandbox Estate do Snoop Dogg está sendo vendido por 450 mil dólares. A Meta também planeja vender terrenos, casas ou lojas no metaverso?

R.D.: Se sua pergunta é se estamos no negócio de NFTs (tokens não-fungíveis) agora, então a resposta é não. Agora estamos nos concentrando no hardware e no software para aperfeiçoar a experiência para possibilitar experiências de realidade virtual.

swissinfo.ch: Você trabalhou por muitos anos na Nokia. Hoje, a empresa praticamente desapareceu. No final dos anos 2000, a empresa sofreu com uma série de más decisões administrativas, e logo viu sua participação no mercado de telefonia móvel cair drasticamente. Agora você está na Meta. Você acredita que sua empresa está no bom caminho?

R.D.: Em primeiro lugar, acredito que são outros tempos e empresas diferentes. Não creio que haja uma correspondência exata entre a fase final da Nokia e o desenvolvimento inicial do metaverso. Eu não acho que eu poderia ver como se consertou X, Y e Z na Nokia, e trazer isso para a Meta. É simplesmente um momento muito diferente. Onde eu vejo analogias é a forma como operamos muito no começo na Nokia, o que reflete onde estamos com muitos desses aparelhos, já que eu fazia parte do desenvolvimento essencialmente da maioria dos telefones que saíam de lá. E a maneira como aprendemos com a experiência, o feedback que recebemos de nossos consumidores, etc., a maneira como desenvolvemos protótipos e aprendemos, e como definimos a escala e nos adaptamos ao mercado é algo que eu também vejo acontecendo na Meta. E para realizar esse tipo de experiência, você precisa de ambos: você precisa da maturidade tecnológica; você precisa que a tecnologia esteja disponível; você precisa de uma equipe que se dedique a resolver alguns daqueles problemas difíceis que você nunca viu antes, e que escute com muita atenção o que é importante para os consumidores.

Adaptação: DvSperling

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