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Brasileira vende três mil bolos por mês na Suíça

Mulher segurando bolos na mão
Para mim, era muito importante que fosse gostoso, não só saudável. swissinfo.ch

Uma brasileira chegou há quatro anos na Suíça e não quis esperar para encontrar trabalho. Na cozinha de casa inventou um bolo que usa menos açúcar e abriu o próprio negócio. Hoje Luciana Esteves vende três mil doces por mês. E conta que o segredo do sucesso está no tamanho do produto.

A brasileira Luciana Esteves, fundadora da empresa “Le Smart Cake”, se mudou em 2015 para a Suíça, onde morava o companheiro dela, Bruno, também brasileiro, trazendo na bagagem a experiência que tinha acumulado trabalhando para grupos de comunicação. Já tinha atuado com desenvolvimento de negócios, venda, publicidade e marketing, mas queria fazer alguma coisa diferente. Ainda não tinha ideia do que seria, mas tinha tempo livre, que era usado na cozinha para preparar bolos, o que sempre gostou de fazer.

Quando era criança, Luciana aprendeu uma receita que fazia o maior sucesso com as amigas. Já adulta, passou a fazer versões mais saudáveis dos bolos de infância: no lugar da farinha e da manteiga, por exemplo, aveia, amêndoa, linhaça. E também chia, quinoa, todos conhecidos como “superalimentos”.  

Os bolos feitos em casa passaram, então, a ser levados pelo marido para o trabalho. O pessoal aprovou, o marido incentivou, e ela continuou. “Desde o início, eu sabia muito claramente o que era: um produto mais inteligente (“smart”), porque a ideia era exatamente trocar os ingredientes que são menos nutritivos ou menos saudáveis por outros que vão trazer mais benefícios para a saúde e, ao mesmo tempo, não comprometer o gosto. Para mim, era muito importante que fosse gostoso, não só saudável. Pensei: acho que tem uma oportunidade de mercado aí. Por que não lançar um produto? – conta. 

Criou, então, uma marca. Depois, passou a ir às lojas onde comprava os ingredientes naturais para oferecer os próprios produtos, usando um francês “ainda macarrônico” e mímica. Em seguida, foi a uma “épicerie” da Universidade de Lausanne. E não parou. Três anos depois, os produtos já estão em 70 pontos de venda, concentrados entre Lausanne e Genebra, entre cafeterias, restaurantes, estúdios e academias. 

“O que a gente faz é substituir os ingredientes de base de um bolo tradicional por outros mais nutritivos, como a aveia, por exemplo, que te dá mais saciedade. A amêndoa é uma gordura boa; a linhaça, um ingrediente rico em ômega 3. É um bolo cheio de coisa boa e com 45% menos açúcar do que um tradicional”, diz, explicando que o produto não leva conservante e tem um perfil nutritivo diferente do de outros bolos. 

Luciana conta que, quando a receita ficou pronta, consultou uma nutricionista para saber se o produto estava equilibrado. Aumenta um ingrediente aqui, faz uma adaptação ali, e ele ficou do jeito que imaginava: dentro dos critérios nutricionais e com o sabor que queria. 

Depois do “bolinho inteligente”, criado em 2016, veio a trufa, dois anos depois, usando a mesma base de ingredientes do primeiro produto da empresa, mas nesse caso, sem açúcar, só o natural das tâmaras mesmo. “Tem que ser uma experiência de prazer, mas que não vem associada à culpa. No fim das contas, você tem um “snack” que é equilibrado, saboroso, saudável e com redução ou sem açúcar”, afirma. Quase toda a produção é artesanal, o que inclui embalar os “smart cakes” e colocar o creme de chocolate, por exemplo. 

Segundo ela, os preços dos bolinhos variam de acordo com o ponto de venda, custando a partir de CHF 4,60 a unidade (20 reais), enquanto as trufas ficam em torno de CHF 2,50 (10 reais). Luciana diz que os produtos vendem bem praticamente o ano todo, exceto nos meses do verão, como ocorre com o setor de alimentação em geral na Suíça. 

Crescimento de 60 a 70% por ano 

Segundo a fundadora, o faturamento da empresa cresce entre 60% a 70% por ano, e o foco é continuar apostando no mercado suíço antes de partir para novos lugares. “A gente, primeiro, quer consolidar a nossa posição na Suíça, onde ainda tem muito espaço para crescer. Mas eu acho que existe uma demanda muito grande por esse tipo de produto em outros países, como na Alemanha. Então, temos vontade, depois, de dar outro passo”, diz. 

Enquanto a empresa crescia, o local de produção parecia ficar cada vez menor. O primeiro foi a própria cozinha da casa dela. Depois, a “boulangerie” perto de onde mora, o que permitiu produzir uma quantidade maior. Em seguida, um espaço em Savigny dividido com outra startup de comida, onde ficou durante um ano, até o final de setembro. Agora, chegou a hora de se instalar num local maior e só deles: um imóvel de 150 metros quadrados também em Savigny. 

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Mulher falando na câmera

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E as novidades não param por aí: a trufa, até então vendida a granel, está sendo lançada em embalagem com duas unidades. No final do ano, também será criado um “e-commerce” para a compra de alguns produtos pelo site. O próximo produto já se sabe: será uma barra de cereal. A granola, o terceiro produto da empresa, lançada, primeiro, para o mercado B2B (Business to Business), já está em alguns pontos de venda. 

Empreender na Suíça

Fazer negócios na Suíça não é diferente de atuar em outro lugar, na opinião de Luciana, porque por trás dos negócios, há sempre pessoas. Porém, uma coisa chamou atenção por aqui: a relação de confiança. “No início, eu me lembro de ficar impressionada de fazer minhas entregas e as pessoas não conferirem. Elas confiavam naquilo que eu estava entregando. Se eu estava dizendo que ali tinham 50, tinham 50. Quando você vai ficando maior e trabalhando com empresas maiores, isso muda, mas essa questão da confiança me marcou muito”, diz. 

Ela diz também que as pessoas foram muito abertas e receptivas. “Eu acho que tem a ver também com como você se aproxima delas. Sorrisos ajudam muito. Tem gente que fala que os suíços são mais resistentes, mas eu tive experiências muito boas com as pessoas”, conta. 

Estilo “startup” de ser 

Uma grande vantagem competitiva, segundo Luciana, é ter um “mindset” (mentalidade) de startup. Porque isso te dá agilidade. “A gente toma decisões numa velocidade em que a maioria das empresas não consegue. Esse estilo startup de ser é muito bom, porque permite que a gente esteja sempre mudando. Lança e testa e, se funcionar, ótimo; se não funcionar, faz outra coisa. O importante é dar sequência ao que está funcionando, mas sempre manter esse motor inovador”, afirma. 

E a empresa está hoje onde pensou estar lá no início, quando tudo começou? Luciana diz, com toda sinceridade, que não tinha planos. “Eu acho bonito quando as pessoas falam que criaram um “business plan”, imaginando como tudo aconteceria. Eu não tinha. O plano é fazer o máximo sempre. A empresa nasceu por acaso e cresceu como toda criança cresce: com carinho, amor, cuidado. As coisas foram acontecendo muito naturalmente”. 

Bolos
A dica de uma feirante ajudou a empresária brasileira a encontrar o tamanho ideal para seus bolos. swissinfo.ch

E, assim, a empresa foi crescendo. De maneira enxuta, dando um passo de cada vez. No início, ela embalava os bolos e entregava; depois, passou a ter ajuda. Em seguida, funcionários na produção e terceirizados na entrega. Agora, há três pessoas contratadas que trabalham com cargas horárias diferentes. “Apesar de termos a dinâmica e a agilidade de uma startup, crescemos rápido, mas de uma maneira muito consciente. Não damos um passo maior do que a perna. Queremos ter a tranquilidade de ver o negócio crescer sem se endividar, sem perder a cabeça. A gente é pequeno e faz tudo otimizando ao máximo essa estrutura enxuta”, diz, explicando que todo o investimento na empresa é feito por ela e o marido.

Mudança no formato por sugestão de desconhecida 

No início, o “smart cake” não tinha o formato que tem hoje: eram bolos maiores, cortados em fatias. Quando Luciana vendia o produto na feira de Lausanne, nem todo mundo que provava e gostava, levava. “Uma moça no estande da nossa frente, que vendia azeite, perguntou se poderia dar uma dica. Falou que as pessoas não gastariam mais de dez francos (41 reais) em produto que não conhecessem. E perguntou se eu já tinha pensado em fazer porções pequenas com custo menor”. 

Luciana agradeceu a sugestão e começou a se perguntar se não deveria fazer aquilo. Duas semanas depois, na mesma feira, ela ofereceu o produto em formato menor e os bolinhos venderam como pão quente. “A gente viu que a porção pequena, realmente, fazia muita diferença. Aí, o “smart cake” se transformou no que ele é hoje, graças a essa pessoa que eu não sei o nome e nunca mais vi. Testar o mercado para mim é isso: é ir ao mercado e testá-lo”, diz, rindo, do que foi feito, literalmente, por ela. 

Quando olha para trás, Luciana tem a noção de que fez muita coisa em pouco tempo. E se sente realizada. “Uma sensação muito boa de ver o negócio dando certo com todas as barreiras de estar aqui há só quatro anos, de ter chegado sem falar a língua, de não ter “networking”. Quando eu olho para trás, eu só tenho a agradecer. Estamos alugando um novo espaço, com três produtos no mercado e muitos pontos de venda. É muito trabalho, mas é muito realizador. Não parece que só tem três anos que tudo isso começou”, diz. 

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