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Experiências com um grande artista suíço

"Variações de Giacometti" de John Baldessari, na Fundação Prada, Milão. Cortesia

As esculturas de Alberto Giacometti cresceram e multiplicaram-se na Fundação Prada, em Milão. Elas ganharam uma versão superdimensionada e irromperam o mundo da moda a passos de gigante.

As grandes estátuas foram realizadas em resina sintética pelo artista plástico americano, John Baldessari. swissinfo.ch esteve por lá.

As figuras foram dispostas como se estivessem caminhando sobre uma passarela, entre uma coluna e outra de ferro da antiga indústria que abriga o braço filantrópico e cultural da famosa grife. E elas parecem participar de uma singela marcha contra o excesso de consumo.

A exposição contém nove imagens apresentadas como totens de uma sociedade que cultua a beleza gerada pela moda e, ao mesmo tempo, vive e sonha com as reflexões críticas provocadas pelo cinema e pela arte. As esculturas de Alberto Giacometti se transformam em portadoras de símbolos que acompanham a evolução do pensamento e do comportamento ocidental. Elas estavam à frente do seu próprio tempo. Se nas miniaturas as figuras já continham todos os arquétipos da humanidade, agora, na interpretação de John Baldessari, elas são multiplicadas por quatro metros e meio de altura.

O artista americano vai mais além e, de uma forma ou de outra, debate com Alberto Giacometti, revivendo o espírito criativo e visionário do escultor suíço, ampliando, dividindo e apropriando-se da sua visão de mundo. Mesmo à distância metafísica – o primeiro vive, o segundo já morreu – a comunicação entre eles flui sem maiores ruídos graças à linguagem das artes plásticas, comum a ambos, impressas em obras condenadas ou salvas à eternidade. Ao jogar uma lente de aumento sobre as figuras criadas por Alberto Giacometti, John Baldessari “acelera” e veste, literalmente, o pequeno e grande ser humano descarnado com objetos do coletivo imaginário.

Arte e moda

As estátuas, magras e esbeltas, não podem não ser associadas à anorexia do comportamento fútil de quem vive a moda como uma sentença absoluta sobre o quê deve conter um guarda-roupa. A disposição das imagens interpretadas por John Baldessari lembra a das modelos em pleno desfile. Corpos esguios, quase efêmeros, cabides sobre duas pernas, ombros e dois braços imitam as manequins à serviço da criatividade do estilista da vez.

A revolução proposta pelo artista americano começa dentro da casa Prada, ao usar o peso das figuras de Giacometti para sustentar a cultura universal de formação do homem, como, de certa maneira, a marca já valoriza ao usar e a identificar a mão de obra qualificada no estrangeiro. A crítica à padronização dos usos e dos costumes, através das figuras uniformes e idênticas entre si, também está presente nesta espécie de suíte da obra de Alberto Giacometti. “Estas obras descarnadas impressionam. Acho sempre que a arte influencia a arte”, afirmou John Baldessari durante a abertura da exposição.

As imagens se prestam a uma variação de indumentária que nasce de um profundo exercício de criatividade de John Baldessari. Ele montou uma verdadeira instalação usando as esculturas como chaves de leituras para uma reflexão sobre os destinos da humanidade. “Fazia muito tempo que eu queria realizar esculturas enormes, talvez por causa da minha altura”, brincou o artista ao apresentar a instalação na cidade.

Indumentárias

A primeira “coleção” Baldessari-Giacometti traz as esculturas vestidas com ironia e inteligência Elas ganham vida na forma de um toureiro, com a capa e a espada, encarnam a figura de Rapunzel com as longas tranças descendo pela escada, se transformam em Joana D’Arc com livros na cabeça e os pés na lenha da fogueira, interpretam o homem Vitruviano de Leonardo da Vinci e assim por diante.

Não faltam as malas e uma bolsa gigante a tiracolo com uma miniatura da própria imagem- da “modelo” de Giacometti pronta para partir em viagem, nem os calçados “oversize” do palhaço do Mágico de Oz, e nem a versão de King Kong, com os aviões de época voando ao redor da enorme estátua, revivendo a cena final deste filme clássico do cinema. E um toque de “erotismo às avessas” com um laço de fita cobrindo a nudez da figura delgada de Alberto Giacometti também parcialmente exposta com a armação em madeira e linho de um vestido antigo.

A arte e a moda criam, juntas, um efeito visual de grande impacto cenográfico. E costurando as duas ao mesmo tempo, o artista decidiu também trocar as roupas das esculturas. Estão previstas 18 mudanças ao longo das oito semanas de exposição. Algumas figuras irão emprestar corpo para ganhar a alma de Humphrey Bogart, vestido com um sobretudo, em Casablanca, ou enfiar os pés nos sapatos vermelhos de Doroth, do Mágico de Oz.

Reflexão

Nestas transformações em “cena aberta”, John Baldessari expõe a moda sazonal, a reboque das estações da natureza e, ao mesmo tempo, provoca uma reflexão sobre o excesso de velocidade do consumo. A inércia e a linearidade das esculturas parecem emitir um grito mudo contra a cultura dos objetos e das roupas adquiridos no turbilhão de um mundo onde quase tudo ganha a marca do descartável.

As monumentais esculturas se tornam caricaturas, alegorias de si próprias. A disposição das figuras lembra o reflexo ao infinito de um acurado jogo de espelhos no qual os próprios visitantes acabam se projetando nas imagens gigantes. E ninguém sai da mostra indiferente.

A cadência silenciosa das figuras delgadas de Alberto Giacometti, nuas e cruas e iguais, chama o espectador para um exame de consciência contra uma humanidade passiva e uniforme, e a favor de uma grande marcha rumo a um novo destino. John Baldessari aumentou a força destas figuras corrosivas, multiplicando a potência artística de Alberto Giacometti.

Alberto Giacometti nasceu em Bornonovo di Stampa, em 10 de outubro de 1901 e morreu em Coira, em 11 de janeiro de 1966.

O escultor foi um dos maiores artistas plásticos da Suíça e do mundo, escultor, pintor e desenhista. Desde jovem acompanhava o pai, pintor, em viagens à Itália. Em uma delas, Giovanni e Alberto, pai e filho, foram ò Bienal de Veneza, era o ano de 1920.

Até 1929, Alberto Giacometti era um dos tantos artistas desconhecidos que circulavam incógnitos pelas ruas de Montparnasse, em Paris.

Neste mesmo ano, a sorte mudaria com a participação numa mostra dedicada Massimo Campigli, na galeria Jeanne Bucher. Uma sua escultura seria comprada por um rico e nobre colecionador de artes, o visconde Charles De Noailles.

Pelas mãos de Andre Breton, Giacometti adere ao surrealismo.

Alberto Giacometti volta para Genebra durante a Segunda Guerra Mundial.

Ele realizou a escultura do comandante da resistência francesa, coronel Henri Roll-Tanguy, pedido do Partido Comunista, em 1946, pouco após o seu retornar a Paris.

Nas décadas de 40 e 50 ganham força as esculturas filiformes em bronze.

Em 2004, Alberto Giacometti ganhou uma grande retrospectiva em Ravenna, na Itália.

Em 2007, a passagem de Alberto Giacometti, pela cidade italiana, de Madonna di Campiglio, aos pés das Dolomitas, no outono de 1921, foi lembrada no evento anual “Mistério dos Montes”.

John Baldessari nascem em 1931, em National City, na Califórnia, nos Estados Unidos.

Ele é um dos artistas mais influentes da sua geração, e protagonista da arte conceitual americana.

Os seus trabalhos foram apresentados em mais de 200 exposições individuais e 900 coletivas nos Estados Unidos e na Europa

O artista é membro do American Academy of the Arts and Letters e da American Academy of Arts and Sciences.

Os seus projetos incluem livros de arte, vídeos, filmes e trabalhos públicos.

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