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Iniciativa para proibir minaretes é “irresponsável”

A grande mesquita de Genebra com seu minarete Keystone

Há uma certa inquietude na Suíça: o debate acerca da iniciativa popular para vetar a construção de minaretes nas mesquitas pode provocar reações virulentas.

Para analisar a situação, swissinfo entrevistou Alberto Bondolfi, professor de ética na Universidade de Lausane, oeste da Suíça.

Dois partidos claramente de direita – UDC (nacionalistas) e UDF (cristãos fundamentalistas) – apresentaram esta semana uma iniciativa popular com cerca de 115 mil assinaturas visando proibir a construção de minaretes nas mesquitas, na Suíça.

Para ser submetida ao voto popular, a iniciativa ainda precisa passar pelo crivo do Parlamento, que poderá anulá-la se for considerada inconstitucional ou contrária a convenções internacionais firmadas pela Suíça.

Os parlamentares utilizam raramente esse direito de veto. Em geral, preferem que o povo se manifeste, advertindo que o texto pode ter difícil aplicação e recomendando que povo vote contra.

Todavia, a probabilidade de que o eleitorado aceite essa proposta parece remota.

Entretanto, o debate será inevitavelmente emocional porque aborda um tema sensível, com possíveis receios e prejuízos. Mesmo que os promotores da iniciativa afirmem que a proibição dos minaretes não limita o credo e a prática religiosa muçulmana, de fato ataca claramente um símbolo islâmico, embora se trate apenas de um elemento arquitetônico.

O governo suíço manifestou-se imediatamente contra a iniciativa e precisou que ela emana de cidadãos privados e não da autoridade helvética. A Conferência dos Bispos da Suíça e a Federação das Igrejas Protestantes declararam-se contra a proibição de construir minaretes.

swissinfo: Como explicar nos países muçulmanos amigos uma medida contra um elemento de sua religão?

Alberto Bondolfi: Acho que as autoridades desses países entendem e não estão inquietas, mas não estou seguro que a opinião pública desses países tenha a mesma opinião.

Os danos provocados por essa iniciativa para a imagem da Suíça são grandes e os autores da iniciativa, a meu ver, agiram de maneira irresponsável.

swissinfo: Com a exacerbação da discussão não se corre o risco fazer o jogo dos extremistas em prejuízo dos moderados?

A.B: Esse efeito indireto da radicalização poderá criar um contexto deplorável. Mas, além desse efeito potencial, precisamos considerar que se a iniciativa for aprovada ficaremos envergonhados. O texto é claramente contrário ao espírito dos direitos humanos fundamentais.

swissinfo: Esta iniciativa é uma tentativa de transformar o Estado em tutor da liberdade fundamental de credo em tutor do cristianismo contra o Islã?

A.B.: A meu ver, o cristianismo não sofre qualquer dano com a presença de minaretes na Suíça. É o que afirmam os autores da iniciativa, mas esse argumento não tem qualquer credibilidade.

Por outro lado, não acho que a opinião pública suíça em geral seja anti-islâmica. Só uma parte manifesta alguma hostilidade, não contra o Islã em si, mas apenas no confronto de algumas de suas expressões.

Essa hostilidade agora é concentrada nessa religião, mas no passado encontrou soluções, dependendo do ambiente político. Penso no anti-semitismo de uma parte do povo suíço nos anos 30 e 40 do século passado.

swissinfo: Na Suíça, a estrutura do Estado não está adaptada à transformação religiosa da sociedade. Não é uma oportunidade para mudar?

A.B.: São necessárias mudanças e adaptações condizentes com a nova situação. Na Suíça, o obstáculo maior me parece ser o da absoluta competência cantonal (estadual) nessa matéria. O Estado federal se limita apenas a garantir a liberdade de credo e de consciência, deixando aos cantões (estados) a possibilidade de gerir as relações com as comunidades religiosas.

É preciso reformular juridicamente toda essa matéria, dando maior poder à Confederação (Estado federal), o que daria mais homogeneidade entre os cantões (estados).

Essa operação é particularmente complexa pelo fato de termos séculos de história que formaram nossas atitudes e nossa mentalidade. Um melhor conhecimento de nossa história deveria nos ajudar a não repetir os erros do passado.

Houve um tempo em que as pessoas se escandalizavam com os ritos de outra confissão. Hoje são os minaretes. Contudo, a revolução francesa e o iluminismo originaram os direitos fundamentais garantidos por nossa Constituição.

Não se pode esquecer isso, mesmo que uma iniciativa infeliz queira reintroduzir valores ultrapassados.

Entrevista swissinfo, Sonia Fenazzi

A iniciativa popular “contra a construção de minaretes” foi lançada em maio de 2007 por um grupo da direita nacional conservadora.

O texto obteve 114.895 assinaturas de apoio, entregues dia 8 de julho de 2008 na Chancelaria Federal.

Os promotores da iniciativa afirmam que querem conter a “crescente islamização de nosso país”, sem limitar a prática da religião muçulmana.

Ele argumentam que o minarete não tem nada a ver com o conteúdo da fé, mas é um símbolo de um “imperialismo político-religioso”.

A coleta das 100 mil assinaturas necessárias para uma iniciativa não garante que a iniciativa será aprovada em votação popular.

Desde 1891, quando foi introduzido sistema de iniciativas populares na Suíça, somente 15 das 163 iniciativas federais lançadas foram aprovadas. A taxa de rejeição, portanto, é de quase 90%.

A primeira iniciativa aceita data de 1893, era pela “interdição de abate ritual” e tinha um caráter anti-semita.

A última iniciativa aprovada nas urnas, em novembro de 2005, é a que defende “alimentos produzidos sem manipulações genéticas”.

Católicos: 3,06 milhões;
Protestantes: 2,57 milhões;
Muçulmanos: 310 mil;
Ortodoxos: 132 mil;
Judeus: 18 mil.

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