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Kinshasa não se interessa pelo dinheiro suíço de Mobutu

Mobutu Sese Seko durante uma coletiva de imprensa em 1997 no seu palácio em Libreville. Keystone

A Suíça não sabe mais o que fazer com oito milhões de francos suíços (aproximadamente cinco milhões de euros) do ex-ditador congolês Mobutu, falecido em 1997, que estão congelados até hoje nos bancos. O governo helvético quer restituir o dinheiro, mas Kinshasa parece não estar interessada.

No ano passado, as autoridades suíças haviam solicitado o governo congolês a designar um agente diplomático investido de plenos poderes para encontrar uma solução rápida à questão e permitir a restituição do dinheiro ao povo congolês. Porém Kinshasa não deu nenhum passo nesse sentido.

Durante visita à República Democrática do Congo (RDC), em julho de 2007, a ex-presidente da Confederação Helvética, Micheline Calmy-Rey, e atual ministra das Relações Exteriores, declarou durante uma coletiva de imprensa realizada junto com o presidente Joseph Kabila, que seu país estava disposto a restituir esses oito milhões de francos. “É uma pena que sejam apenas oito milhões de francos suíços no lugar de dezenas de bilhões que estávamos esperando”, comentou laconicamente o presidente Kabila à imprensa.

Oferta de assistência técnica

Essa soma não merece o envio de um representante à Berna? “Em todo o caso, essa é a resposta que recebemos do Ministério das Relações Exteriores”, explica André Rothenbühler, da Ação Mercado Financeiro Suíço, uma ONG independente, instalada na Basiléia, que persegue dinheiro “sujo” de ditadores. “Nossos parceiros no Congo explicam o impasse pelo fato de vários próximos ou fiéis de Mobutu estarem no governo congolês atual”, explica.

Em Berna, um alto responsável do Ministério das Relações Exteriores interrogado pela agência de notícias InfoSud-IPS, mas que preferiu manter o anonimato, confirma que nada se moveu nos últimos doze meses.

“Após a visita da ministra Micheline Calmy-Rey e seus encontros no mais alto escalão político, a Suíça fez de tudo para ajudar as autoridades congolesas a passar à ação. Nós oferecemos nossa assistência técnica e jurídica e continuamos também a solicitar o envio de um mandatário, mas até agora não tivemos nenhum eco de Kinshasa”, explica.

Do seu lado, o Tribunal Federal (maior instância jurídica no país) decidiu que o governo suíço não pode congelar indefinidamente os bens do antigo ditador. “Se até 15 de dezembro de 2008 nenhuma solução for encontrada, o dinheiro bloqueado será entregue à família Mobutu”, ressaltou o alto funcionário.

Sem retorno

“Hoje em dia a situação é tal que nós entramos em contato com os detentores dos direitos para que eles aceitem uma partilha de 6% para eles e 40% para o povo congolês, mas também desse lado não temos nenhuma resposta”, acrescenta.

“Há cerca de um ano vivemos uma situação mais ou menos semelhante com os bens do ex-ditador haitiano Jean-Claude Duvalier. Frente à insistência das autoridades suíças, o Haiti finalmente decidiu aceitar uma comissão de assistência jurídica, pois o presidente René Préval desejava lançar um sinal forte no contexto da sua luta contra a corrupção. Esse procedimento seria igualmente um sinal forte da parte da República Democrática do Congo, pois seria, a meu ver, a primeira vez que o dinheiro do Mobutu seria restituído ao país”, comenta o alto funcionário.

A diferença com Bemba

Para Victor Nzuzi, da ONG congolesa “Novas Alternativas para o Desenvolvimento”, é aqui que a porca torce o rabo. “Os homens políticos não vão cortar o galho no qual eles estão sentados. O dinheiro do Mobutu é fruto da corrupção e, nesse meio tempo, os hábitos políticos não se modificaram. Se as autoridades congolesas assinam contratos de exploração de minas com a China sem concorrência, por exemplo, isso significa que comissões foram pagas embaixo da mesa. Um inquérito sobre os bens de Mobutu na Suíça poderá levantar questões incômodas”.


Para o membro da ONG, Kinshasa não quer maltratar os próximos do antigo ditador, que ocupam hoje em dia funções importantes no governo como seu filho, Nganza Mobutu, ministro da Agricultura no governo de Antoine Gizenga. Outro filho de Mobutu também está no Senado, presidido por Kengo Wa Dondo, que foi várias vezes primeiro comissário de Estado sob Mobutu.

Em 25 de março, a ONG enviou uma carta ao Procurador-Geral da República, M. Mushagalusha, pedindo que ele intervenha no dossiê dos bens de Mobutu bloqueados na Suíça. “Não tivemos ainda resposta a ela. A justiça não funciona no Congo. “Por outro lado, o mesmo funcionário bloqueou as contas de Jean-Pierre Bemba quando ele estava sendo preso em Bruxelas à pedido da Corte Penal Internacional de Haia”, lembra-se.

swissinfo, Mattias Creffier/ InfoSud – IPS

Após a independência da colônia belga do Congo em 1960, o general Mobutu assumiu o poder em 1965 e, em 1971, batizou seu país de Zaire.
Após ter passado mais de trinta anos no poder, o general Mobutu foi derrubado por Laurent Désiré Kabila em1997. Em seguida ele se refugiou no Marrocos, onde morreu.
Entre 1997 e 2003, duas guerras causaram a morte de mais de 3,5 milhões de pessoas. Desde 2000, a ONU está presente no país. Com mais de 16 mil capacetes azuis e um orçamento de 1,5 milhões de dólares, é a principal missão de paz no mundo.
Após o assassinato de Kabila em 2001, seu filho, Joseph Kabila, se tornou presidente do país. Ele mudou o nome do país para República Democrática do Congo (RDC). Em 2006, as primeiras eleições democráticas em quarenta anos confirmaram Kabila no seu posto.
Em 1997, a Suíça bloqueou cerca de 10 milhões de francos depositados pela família Mobutu. Em 2001, sua mansão genebrina foi vendida por três milhões de francos.

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