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O ‘business as usual’ não é uma opção para o sistema alimentar global

Frank Eyhorn

Desnutrição, crise da biodiversidade, mudanças climáticas: precisamos repensar nosso sistema alimentar com urgência. Veja como podemos concretizar a transformação.

O debate sobre o futuro do nosso sistema alimentar está fortemente polarizado. Vimos isso em primeira mão na Suíça, com a recente votação das iniciativas agrícolas. Por um lado, existe a exigência legítima de que a produção agrícola não sobrecarregue excessivamente a saúde e o meio ambiente; ao passo que, por outro lado, existe uma preocupação igualmente válida com a sobrevivência econômica das empresas.

Os preparativos para a Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU também foram marcados por tensões entre campos profundamente divididos. Algumas organizações da sociedade civil pediram um boicote ao evento, temendo que o setor privado tenha influência demais. No entanto, na busca de soluções, essa amarga guerra de trincheiras não nos levará a lugar nenhum; muito pelo contrário. Repensar nosso sistema alimentar – do campo ao prato – é uma tarefa enorme para a sociedade como um todo e que devemos enfrentar juntos.

Os sistemas alimentares de hoje levam a um beco sem saída

Afinal, todos nós comemos comida. Todos os dias. O que comemos e como produzimos nosso alimento afeta nosso planeta e nossas sociedades como nenhuma outra atividade humana. A agricultura atual é amplamente responsável pela perda alarmante de biodiversidade e de fertilidade do solo, além da pressão sobre os recursos hídricos. Quase um terço das emissões globais de gases de efeito estufa vêm do sistema alimentar.

Ao mesmo tempo, analisando uma perspectiva global, o setor de alimentos está fazendo um péssimo trabalho no cumprimento de seu verdadeiro propósito: hoje, cerca de dois bilhões de pessoas sofrem de fome ou desnutrição e a dieta de três bilhões de pessoas é prejudicial à saúde. Aqueles que ganham a vida no sistema alimentar – agricultores, processadores, cozinheiros, vendedores – geralmente estão nos grupos de renda mais baixa.

Na cúpula da ONU, a comunidade global discutiu como deve ser o futuro de nossos sistemas alimentares. Antes da reunião, dezenas de milhares de pessoas e centenas de organizações da sociedade civil, da política, da ciência e do setor privado, em 145 países, debateram possíveis soluções. Um nível surpreendente de consenso foi alcançado: “Business as usual” não é uma opção; uma mudança de paradigma é urgentemente necessária. O foco atual nos maiores rendimentos possíveis e calorias baratas leva a um beco sem saída e acarreta custos sociais insuportáveis. Abordagens holísticas são necessárias para fornecer alimentos saudáveis ​​para todos, produzidos de uma forma que respeite o meio ambiente, o bem-estar animal e os direitos humanos, e com salários justos para todos.

A Biovision foi fundada em 1998 pelo ganhador do Prêmio Swiss World Food, Hans Rudolf Herren, com o objetivo de melhorar de forma sustentável a vida das pessoas na África, enquanto conserva o meio ambiente como base para toda a vida. A Biovision combate a fome e a pobreza e está empenhada na disseminação e aplicação de métodos ecológicos que melhoram de forma sustentável as condições de vida em África, ao mesmo tempo que preservam o ambiente.

Conectando produtores e consumidores

Pela primeira vez em uma cúpula da ONU, a agroecologia foi reconhecida como um conceito promissor e unificador para o processo de transformação tão necessário – um método que oferece práticas com base científica para a produção ecológica. Princípios agroecológicos – como promoção da biodiversidade, observância e trabalho conjunto com os ciclos naturais e redução do uso de fertilizantes químicos e pesticidas – podem ser usados ​​para projetar sistemas alternativos inteligentes. As técnicas agroecológicas também podem nos ajudar a melhorar gradualmente os métodos de produção convencionais. Além disso, a agroecologia busca conectar produtores e consumidores ao longo de cadeias de valor justo.

Trazer a transformação urgentemente necessária dos sistemas alimentares – na Suíça e globalmente – requer vários tipos de estímulos. Isso inclui desenvolver e disseminar métodos de produção ecológicos e investir mais em empresas e projetos que operam de forma sustentável no setor de alimentos. Para tanto, os formuladores de políticas devem criar incentivos e regulamentar as práticas prejudiciais. Isso também significa superar a forte influência de grupos de interesse, cujos modelos de negócios ainda se baseiam em abordagens e conceitos desatualizados.

Também é vital promover a conscientização pública sobre a relação entre alimentação, meio ambiente, saúde e prosperidade. Em última análise, todos nós moldamos nossos sistemas alimentares exercendo nossos direitos políticos e decidindo nossos padrões de consumo diário. Todos nós podemos influenciar a aparência do mundo do futuro, porque todos nós comemos. Todos os dias.

Frank Eyhorn é um especialista em agricultura orgânica com mais de 20 anos de experiência em cooperação internacional. Ele é apaixonado por agricultura e nutrição sustentáveis. Com um PhD em ciências ambientais,conduziu uma extensa pesquisa e publicou vários materiais educacionais e artigos científicos.

As opiniões expressas neste artigo são exclusivamente do autor e não refletem necessariamente as opiniões da swissinfo.ch. 

Série de opinião

swissinfo.ch publica artigos de opinião de colaboradores que escrevem sobre uma ampla gama de tópicos – questões suíças ou aqueles que afetam a Suíça. A seleção dos artigos apresenta uma diversidade de opiniões que visa enriquecer o debate sobre os temas discutidos.

Adaptação: Clarissa Levy

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