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O fim da concordância?

A eleição de 12 de dezembro marca uma reviravolta na política helvética.

Com a não reeleição do ex-ministro da Justiça e Polícia, Christoph Blocher, do poder e a passagem do seu partido, a União Democrática do Centro para a oposição, a fórmula que caracteriza a política suíça há quase 50 anos desaba, pelo menos temporariamente.

Para os cientistas políticos, o choque das eleições não representa ainda que o sistema da concordância morreu. Porém 2008 pode ser um ano de muitas turbulências na política helvética.

Quinta-feira, 13 de dezembro de 2007 às 08h10: “Eu aceito a eleição!”. Foi com essas palavras, pronunciadas pela nova ministra Eveline Widmer-Schlumpf, que uma forma de governo que rege a Suíça há quase meio século ruiu. Do ponto de vista político, é como se o Cervin, a montanha-símbolo do país, tivesse desabado.

A palavra “oposição” ganha, pelo menos em parte, um novo significado na Suíça. Desde 1959, os quatro partidos que governam o país representavam 80% do eleitorado. Mas agora, a União Democrática do Centro (UDC, direita nacionalista), que recebeu nas últimas eleições federais impressionantes 30% dos votos, declara não se sentir mais representada pelos seus dois ministros (Samuel Schmid e Eveline Widmer-Schlumpf) e anuncia que passa para a oposição.

Um fosso cada vez maior

Certo, não está escrito nos genes da classe política suíça que não é possível gerir o governo unicamente através de um sistema de concordância e a procura sistemática do compromisso. Mesmo um país como a Suíça – pouco inclinada às mudanças e muito atenta à manutenção do equilíbrio institucional, federal e cultural – deve poder se transformar e adaptar a uma nova realidade política.

Nos últimos anos, com a polarização entre a esquerda e direita, o fosso entre os partidos governamentais se tornou muito grande para esconder as diferenças. A UDC, em particular, cada vez mais balança entre as duas posições, a de partido do governo ou de oposição. Essa dualidade pode ser vista durante toda sua campanha para as eleições legislativas de outono.

“Sabíamos há muito tempo que o jogo de oposição agradava a UDC. Nos últimos quinze anos esse partido tem combatido regularmente as decisões do Parlamento através de referendos populares ou não levando a sério a classe política, os ministros e mesmo seu correligionário Samuel Schmid, que representa o partido no governo federal”, analisa Georg Lutz, cientista político na Universidade de Berna.

Muitas incertezas

A vontade do Partido Social-Democrata, do Partido Democrata-Cristão (PDC, centro-direita) e do Partido Verde da Suíça de não reeleger Christoph Blocher, levando a UDC a não apoiar mais seus dois ministros, levanta, porém, inúmeras questões. A mais importante: a Suíça passa agora a ter um sistema de maioria-oposição, como existe em quase todos os outros países europeus?

“Ainda é difícil dizer. Nós acabamos de entrar numa nova fase, durante a qual as incertezas tentem a cobrir a verdade. Um aumento das rivalidades, da polarização e da personalização da política será, em todo caso, temas importantes durante os próximos aos. Esperamos uma fase de turbulência muito mais forte”, estima Oscar Mazzoleni, professor nas Universidades de Lausanne e Genebra.

O grande ponto de interrogação é saber se um partido forte e bem organizado como a UDC terá realmente a possibilidade de bloquear as decisões do Parlamento e do governo, utilizado para isso os instrumentos democracia direta como o referendo e a iniciativa popular.

“Podemos esperar uma recrudescência da parte da UDC a uma intensificação dos meios utilizados para promover o seu papel de oposição. Por outro lado, esse partido obteve o apoio de uma parte do mundo econômico durante os últimos anos. Se a UDC começar a obstruir sistematicamente o processo político, ela poderá perder esse apoio”, prevê Mazzoleni.

A nova locomotiva Blocher

No futuro, a UDC poderá contar mais uma vez com a disponibilidade de Christoph Blocher. Liberado das obrigações governamentais, o líder da direita nacionalista será um importante auxílio no reforça da base eleitoral do partido.

“Blocher vai colocar ainda mais dinheiro à disposição da UDC para permiti-la a apoiar iniciativas, referendos e novas campanhas eleitorais. Porém, numa democracia, existem sempre limites para as possibilidades de comprar o eleitorado. Além disso, a UDC não poderá mobilizar a cada dia, durante quatro anos, o seu aparelho para recolher assinaturas”, estima Georg Lutz.

“A UDC pode ganhar novos eleitores, porém ela corre o risco de se esgotar ao multiplicar os referendos e as iniciativas. A evolução da situação dependerá muito da política seguida pelos partidos que assumem ainda uma responsabilidade governamental”, estima Pascal Sciarini, cientista político da Universidade de Genebra.

Esses partidos – o Partido Social-Democrata, o Partido Democrata-Cristão e o Partido Radical-Democrático (PRD, direita) – dispõem agora que quatro anos para elaborar uma plataforma comum e experimentar novas vias para frear sua hemorragia eleitoral.

“A vitoria daqueles que elegeram Eveline Widmer-Schlumpf poderá se revelar um desafio enorme nos próximos anos para enfrentar a mobilização do partido de Christoph Blocher, que agora está unido após essa grande derrota”, conclui Mazzoleni.

swissinfo, Armando Mombelli

Após o nascimento do Estado federal moderno na Suíça, em 1848, o Partido Radical ocupou durante quarenta anos os sete postos de ministro no governo.

Foi apenas em 1891 que um representante dos católicos conservadores (ancestrais do Partido Democrata-Cristão) conseguiu ser admitido no poder executivo.

Em 1929, o Partido Agrário (ancestral da União Democrática do Centro) colocou um dos seus representantes no governo federal.

Enfim, o Partido Social-Democrata obteve seu primeiro posto em 1943.

Desde 1959, o governo suíço foi sempre formado pelos quatro maiores partidos. Juntos eles representam 80% do eleitorado.

Em 12 de dezembro, o Parlamento confirmou seis dos sete atuais ministros nas suas funções. Porém ele não reelegeu Christoph Blocher, dando seu lugar à Eveline Widmer-Schlumpf, membro do governo cantonal dos Grisões.

Os parlamentares (senadores e deputados) puniram Christoph Blocher (que até então havia exercido o cargo de ministro da Justiça e Polícia) pelo seu comportamento considerado pouco consensual, nos quatro anos passados no poder.

Seu partido, a União Democrática do Centro (UDC, direita nacionalista) protestou contra o voto. Seus representantes declararam que não se sentem mais representados no governo federal e que passaria a assumir o papel de oposição.

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