O hotel dos pensamentos de Dunant

Jean Henry Dunant, criador da Cruz Vermelha, ganha uma nova vida, em versão hoteleira. A abertura do hotel JHD, iniciais do seu nome, revive em forma arquitetônica e decorativa os ideais e valores deste homem que mudou o rumos do sofrimento humano.
O hotel fica na cidade de Castiglione delle Stiviere, entre Mantova e as águas do lago de Garda, no norte da Itália.
Em meio a uma região cercada de oliveiras, palco de batalhas sangrentas no século 19 – como a de Solferino – durante as quais Dunant, de passagem por ali, teve a ideia de socorrer os feridos de todas as nacionalidades sem distinção da cor do uniforme, junto com as populações locais, principalmente mulheres.
Castiglione delle Stiviere já é a sede natural do museu da Cruz Vermelha. O hotel, inspirado em Dunant, se integra ao percurso dos apaixonados pela história da associação que inclui a torre e o ossário. Ele oferece ao hóspede uma nova experiência, além de revolucionar o conceito de hospedagem. O hotel começa a ser um ponto de partida para uma imersão na história. Por exemplo, um ciclista e hóspede japonês estava pronto para iniciar o percurso rumo a Genebra, depois de se repousar fisicamente nos pensamentos de Dunant.
“Queríamos sair da fórmula tradicional e ao mesmo tempo gostaríamos de fazer algo ligado ao território, à história daqui. Junto com o designer Ermanno Preti decidimos contar a vida de Dunant em todos os quartos do hotel. Cada um representa um episódio, uma passagem de sua formação”, diz à swissinfo.ch Eugenio Gallina, proprietário do hotel que afirma ser o único do gênero em todo o mundo.
O hotel tem três andares. O primeiro é dedicado à cultura e à religião “vividas” por Dunant. O segundo pavimento traz referências às desventuras de Jean Henry Dunant no continente africano -antes e depois de Solferino – de onde retornou economicamente quebrado. O último andar é uma homenagem à sua presença na batalha de Solferino e Castiglione delle Stiviere, à fundação da associação humanitária e ao retiro em Genebra, onde viveu a miséria e a pobreza sobre a própria pele.
Impacto
O hotel está na beira da estrada e com fundos para um campo de oliveiras. Mas quem espera ver um prédio tradicional, e for um pouco distraído, vai passar sem vê-lo. Ou então pode demorar um pouco para reconhecer, no mosaico de murais nas paredes externas, o JHN, apesar da exposição clara das letras no meio fio.
A geometria criativa lembra a arquitetura de Brasília, de Oscar Niemeyer. O complexo fica num terreno retangular. Silhuetas sinuosas em meio a blocos de concreto e estruturas envidraçadas, tudo ao redor de um jardim com uma longa serpente em fibra de vidro. O conjunto arquitetônico tem forte impacto visual e prepara o visitante para o interior.
O balcão é o símbolo da Cruz Vermelha ao vento. Aliás, quase tudo no hotel passa a ideia de fluidez e movimento. Exatamente como ocorre no percurso secular dos ideais de Dunant. Nas paredes estão móveis cortados e pendurados aonde menos se espera.
Cadeiras com apenas dois pés exigem usar as próprias pernas como o restante do apoio. Objetos modernos de design casam-se com peças de arte. Nas pilastras do hall de entrada o hóspedes anotar e “pichar” suas impressões do lugar. Uma estante serve de apoio para frutas e livros de época, com as páginas amareladas pelo tempo, que contam os relatos de Jean Henry Dunant. É a interatividade com a criatividade.
Pensamento
Os corredores internos viram uma instalação audio-visual. No teto vazado com grades os monitores transmitem vídeos sobre o trabalho da Cruz Vermelha, além de denúncias e soluções para problemas sociais que movem a maior associação humanitária do mundo. O visitante pode tomar consciência sem, no entanto, constranger-se com imagens fortes. Afinal “todos nós estamos de passagem”, como reza a escrita em neon em um dos tetos, mas também em busca de repouso físico e mental.
Nos quartos – sem frigobar para induzir o hóspede a “sair” da “clausura”- as paredes convidam à reflexão sobre a vida de cada um a partir das lições de Jean Henry Dunant. Em um deles, o quarto 63, caracóis gigantes escalam os muros ao lado da cama. Na pilastra, as lesmas deixam um rastro de ensinamentos de Dunant, como o da lenta perseverança.
A criatividade artística é do designer Ermanno Preti: “eu achei o Dunant muito parecido com uma coruja, mais magro antes da experiência africana e diferente depois; foi uma inspiração minha. Esta ave é o símbolo da má sorte, mas cada noite tem a sua luz. Temos um quarto com estrelas de cinco pontas, cada uma remete a um conceito da Cruz Vermelha”, diz ele à swissinfo.ch .
Em um dos quartos, o 20, chamado de “Descompressão”, a decoração é toda em amarelo com bolas coloridas. Provoca um belo efeito visual de terceira dimensão. E no distante 71, o peso de “ Duas Mil Toneladas de Solidão”, em letras garrafais em cobre penduradas sobre o leito, ao lado do quadro de um rinoceronte na savana. São lembranças da solidão de Dunant no exílio em Genebra, de suas andanças pela África. Tanta informação sobre o ilustre anfitrião, não impede, claro, que o hóspede tenha um sono tranquilo.
O JNH é uma galeria de arte, um museu e um hotel ao mesmo tempo.
O hotel tem 78 quartos, cada um dedicado a uma visão de Dunant.
Ele tem 4 mil metros quadrados e custou 11 milhões de euros.
O hotel abre as portas para a visitas guiadas, para escolas, por exemplo.
Jean Henry Dunant nasceu em 1828 e morreu em 1910.
Ele lançou as bases da Cruz Vermelha em 1859.
Em junho daquele ano ele presenciou a batalha de Solferino, entre o exército da França, Piemonte e Sardenha, comandado por Napoleão III e a Áustria.
Dunant tinha ido ali para pedir ajuda a Napoleão III para seus negócios na África colonial.
38 mil pessoas ficaram feridas ou morreram no campo de batalha.
O suíço ganhou o primeiro Prêmio Nobel da Paz, em 1901, junto com Frédéric Passy.
As Convenções de Genebra, de 1864, foi baseada nas ideias de Dunant.

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