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O poder troca de mãos

Kaspar Villiger anuncia sua renúncia durante coletiva de imprensa em Berna. Keystone

Depois de 14 anos de participação no governo federal, Kaspar Villiger, ministro das Finanças, anuncia que irá renunciar em dezembro do cargo.

Eleito em 1989, Villiger já dirigiu os ministérios da Defesa e das Finanças. Seu sucessor será escolhido pelos deputados que serão eleitos em outubro para o Parlamento federal.

Kaspar Villiger anuncia sua renúncia. Um ministro abandona o poder e grande parte dos suíços parece nem se incomodar. Muitos irão descobrir a mudança meses depois. As pessoas vão, o poder permanece. Assim funciona a democracia.

Uma pequena introdução

A democracia suíça pode ser considerada única. Ela é uma das mais antigas no mundo, porém funciona tão bem como as engrenagens exatas de um antigo relógio.

O moderno Estado suíço existe desde 1848. Depois de atravessar momentos de crise como a Primeira e Segunda guerra Mundial, o poder executivo é dividido entre os principais partidos numa política de consenso chamada de “fórmula mágica”, adotada a partir de 17 de dezembro de 1959 e em funcionamento até hoje. Desde então, os sete ministros são escolhidos por eles e devem refletir a sociedade, ou seja, suas diferentes culturas e correlações políticas.

E para melhorar ainda mais essa democracia, os sete “notáveis” se revezam no cargo de “presidente” da Confederaçao Helvética, uma misture entre presidente e representante externo do país. Ao mesmo tempo, esses ministros costumam trocar entre si de ministério. Assim, cada um deles adquire experiências, que podem servir em outras áreas, como entre a educação e a defesa, por exemplo.

Como estabilidade política é um produto do tempo, a não ser em casos extremos, os ministros podem decidir quando eles querem sair do poder. Em média, eles ficam dez anos no clube exclusivo dos sete ministros.

Apenas um ministro

Nessa semana é a vez de Kaspar Villiger, ministro das Finanças, anunciar que irá pendurar suas chuteiras. Em 155 anos de história da moderna Suíça, Kaspar Villiger foi o 99. ministro eleito para o Conselho Federal.

O suíço do cantão de Lucerna completou quatorze anos no poder. Ele escolheu sua saída num momento mais do que oportuno, pois em outubro os futuros deputados do Parlamento federal serão eleitos. Em dezembro, inicia-se a nova legislatura.

Essa é uma saída “à francesa” de um ministro do cenário político e corresponde ao caráter tranqüilo de Kaspar Villiger, segundo os comentários da imprensa suíça.

Reformador das forças armadas

Quando Villiger foi eleito ministro em 1989, a Suíça vivia um período conturbado. Pouco antes a primeira mulher a fazer parte do Conselho Federal, Elizabeth Kopp, havia sido obrigada a renunciar sob uma chuva de denúncias de favorecimento político. A ministra da Justiça havia revelado ao marido, nada mais, nada menos, que funcionários da sua pasta lhe investigavam por suspeitas de crime financeiro.

Kaspar Villiger foi o nome indicado pelo Partido Radical (PR) para substituir a ministra Kopp. Depois de eleito, Villiger assumiu o cargo de ministro da Defesa, que era mais imune aos escândalos da época.

Nessa pasta ele conseguiu deixar suas marcas. No fim da Guerra Fria, os sistemas de defesa da Suíça já estavam desatualizados. O novo ministro batizou seu projeto de “Forças Armadas 95”, cujo objetivo principal era diminuir os efetivos de soldados e aumentar a profissionalização do exército. A necessidade da reforma foi reconhecida por todos os partidos e continua até hoje. Seu nome atual é “Forças Armadas XXI”.

Do exército para as finanças

Em 1995, Villiger, que já dirigiu a indústria familiar de tabaco e bicicletas, passou para o ministério das Finanças. Nessa época ele teve de resolver um outro grande problema, um escândalo que abalou a fama ilibada da Suíça no mundo inteiro: a questão do ouro nazista e dinheiro de judeus depositados e esquecidos nos bancos suíços após o caos da Segunda Guerra Mundial. Os chefes dessas instituições não haviam feito muito esforço para devolver os milhões aos proprietários de fato…e direito.

Depois de cinco décadas, essa injustiça voltou à tona. A pressão de organizações judias nos Estados Unidos, país importante para a economia de qualquer nação, terminou por obrigar a Suíça a apresentar desculpas oficiais ao mundo e indenizar as vítimas. Os bancos abriram seus cofres e ofereceram mais de um bilhão de francos suíços. Essa fantástica soma é administrada atualmente por fundações que têm a difícil tarefa de encontrar os sobreviventes e seus familiares.

Relações complicadas com o Parlamento

Nos anos noventa, segundo a opinião da imprensa suíça, Villiger desenvolveu-se no homem forte da política federal.

Sua atuação dividiu-se entre insucessos como a vontade de introduzir um imposto federal sobre as heranças. A oposição foi grande e a idéia abandonada, inclusive pelo próprio partido.

Dos sucessos, o destaque é seguramente a defesa do segredo bancário suíço, apesar de algumas concessões feitas à União Européia, como taxação de fortunas de cidadãos europeus em bancos suíços.

Entre os problemas deixados para o sucessor estarão, seguramente, o aumento da dívida pública e um pacote de medidas de economia que consegue desagradar uma grande parte da sociedade suíça.

Após quatorze anos de mandato, Villiger abandona enfim o poder. Muitos comentaristas acreditam que seu grande esforço de procurar o consenso na política, uma típica característica dos suíços, já não seja mais um valor incontestável para as novas gerações. Elas estão, afinal, mais voltadas para o confronto direto.

swissinfo, Daniele Papacella e Alexander Thoele

– Kaspar Villiger é casado e tem dois filhos. Antes de entrar para a política, o suíço dirigiu em conjunto com o irmão as empresas da família, que incluem fábricas de charutos e de bicicletas.

– Eleito para Conselho Federal em 1989, Villiger dirigiu o ministério da Defesa e, a partir de 1995, o ministério das Finanças.

– Durante quatorze anos de atuação, Villiger foi duas vezes presidente do Conselho Federal, ou seja, “presidentte” da Suíça: em 1995 e 2002.

– Originário do cantão de Lucerna, o engenheiro mecânico seguiu a carreira clássica de um político suíço:

Carreira militar: comandante de companhia.

Eleição para a Câmara Estadual do cantão de Lucerna em 1972.

Eleição para o Parlamento Federal: deputado federal em 1982 e senador em 1987.

Eleição para ministro no Conselho Federal em 1989.

Com 62 anos, após 14 anos no governo federal, Kaspar Villiger anuncia sua demissão.

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