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Conclusão da Rodada Doha é cada vez mais incerta

Agricultores suíços protestam contra a OMC, em Genebra (1/12/09). Keystone

A 7ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) terminou nesta quarta-feira (2/12), em Genebra, sem decisão nem agenda clara para concluir a Rodada Doha até 2010. Os EUA culpam o Brasil pelo impasse. A Suíça também não quer ceder mais.

À margem do encontro, 22 países emergentes e em desenvolvimento decidiram reduzir entre 20 e 70% as tarifas sobre os produtos que comercializam entre si. A lista de produtos que terão redução de taxas alfandegárias deverá ser anunciada no ano que vem.

Os países signatários são Brasil, Argentina, Paraguai, Chile, México, Uruguai, Cuba, Egito, Índia, Coreia do Sul, Coreia do Norte, Argélia, Irã, Marrocos, Tailândia, Sri Lanka, Vietnã, Zimbábue, Malásia, Indonésia, Nigéria e Paquistão.

Durante a assinatura do acordo, nesta quarta-feira, em Genebra, o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que o aumento do intercâmbio comercial entre os países do Sul pode contribuir para um comércio mundial mais justo.

Segundo o diretor da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (UNCTAD), Supachai Panitchpakdi, este acordo deverá aumentar em 8 bilhões de dólares o comércio entre esses países.

“O comércio Sul-Sul é uma boa resposta, apesar de não ser única, para sair da crise”, disse Amorim, que não quis, no entanto, comparar o acordo alcançado entre países com as negociações de Doha, que envolvem também as nações mais ricas.

Embora não estivesse formalmente na agenda, a Rodada Doha teve um papel importante no encontro desta semana em Genebra. Os ministros, inclusive os do G20, fizeram um novo apelo para concluir as negociações em 2010.

Anos de negociações infrutíferas

Iniciadas em 2001 com a pretensão de serem encerradas 2005, as negociações estão paradas desde agosto do ano passado, quando um pequeno grupo de países industrializados e em desenvolvimento fracassou na tentativa de alcançar acordos fundamentais na área agrícola.

Na abertura da Conferência Ministerial da OMC, na segunda-feira, o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, advertiu os ministros e funcionários dos altos escalões de 153 países-membros, que “o tempo está acabando, embora cerca de 80% do acordo estejam acertados”.

“Chegará o momento da verdade em que teremos de decidir se a meta 2010 pode ser mantida. Há consenso entre os líderes políticos de querer se encontrar, mas declarações não bastam”, disse Lamy.

O Norte e o Sul, no entanto, estão longe de concordar com drásticos cortes das subvenções agrícolas e fortes reduções das taxas alfandegárias para produtos industriais.

O representante de Comércio dos EUA, Ron Kirk, disse que sua equipe está pronta para entrar na fase final da negociação, desde que ela resulte na abertura de novos mercados para produtos e serviços dos países industrializados.

EUA criticam Amorim

Kirk pressionou os membros da OMC, especialmente economias emergentes, como Brasil, Índia e China, a assumir mais responsabilidade. Amorim disse que “é irracional esperar uma conclusão da Rodada Doha com concessões dos países em desenvolvimento”.

Durante os debates em Genebra, os EUA culparam o Brasil pelo impasse. “Se tomarmos a forma de pensar de Amorim, estaremos condenando Doha ao fracasso, porque todos estamos dizendo que queremos mudanças, mas não queremos fazer nada diferente.”

O negociador suíço na OMC, embaixador Luzius Wasescha, disse ter a impressão de que “os americanos pensam que já cederam um pouco, depois de terem anunciado drásticas reduções de tarifas para produtos não agrícolas. Agora eles esperam concessões dos outros”.

Agricultores suíços

A ministra suíça da Economia, Doris Leuthard, explicou na terça-feira à mídia que seu país não pode mais fazer concessões na área agrícola. “Fiz o melhor que pude. Não posso ir além. Na Suíça já pagaremos um alto preço por isso.”

De acordo com a última versão do documento da Rodada Doha, os agricultores suíços perderiam 30 a 50% de sua renda, disse a ministra. A Suíça sugeriu que se avalie no início do ano que vem se as negociações ainda poderão ser concluídas em 2010.

Diversos analistas duvidam de uma conclusão no próximo ano. “O fato de que muitos países não enviaram ministros ao encontro de Genebra diz muito”, afirmou o especialista em OMC Joost Pauwelyn, do Graduate Institute, de Genebra, à swissinfo.ch.

Nesta semana, foram levantadas dúvidas até sobre o efeito da Rodada Doha para a economia mundial. O Instituto Internacional de Pesquisa de Política Alimentar, em Washington, estima em 70 bilhões de dólares os potenciais ganhos decorrentes da Rodada Doha (outras fontes haviam falado de Us$ 700 bi).

A conclusão das negociações teria apenas um pequeno efeito sobre os atuais problemas econômicos globais. “O comércio e a economia mundial mudaram muito desde 2001”, escreve o instituto em um estudo.

Nova tática das ONGs

A conferência desta semana aconteceu exatamente dez anos depois da chamada “batalha de Seattle”, quando 100 mil manifestantes anti-OMC levaram o encontro ao colapso.

No último sábado, entre 3 mil e 5 mil manifestantes foram às ruas de Genebra contra a OMC. Alguns ativistas extremistas do chamado “bloco negro” quebraram vidraças e incendiaram carros (veja link e vídeo).

Embora algumas cenas de Seattle tenham se repetido, as organizações não governamentais mudaram sua tática. “Elas são parte do jogo e adotam uma estratégia mais produtiva”, diz Pauwelyn.

Geraldo Hoffmann, swissinfo (com colaboração de Simon Bradley, Genebra)

O acordo assinado hoje entre os 22 países foi negociado desde 2004, paralelamente à Rodada Doha, no contexto da Rodada São Paulo do Sistema Global de Preferências Comerciais entre Países em Desenvolvimento (SGPC).

Os países signatários são Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai, Argélia, Chile, Cuba, Egito, Índia, Irã, Indonésia, Malásia, México, Marrocos, Nigéria, Paquistão, República da Coréia, República Democrática Popular da Coréia, Sri Lanka, Tailândia, Vietnã e Zimbábue.

Juntos, esses países respondem por 13% do PIB mundial (cerca de US$ 8 trilhões) e 15% do comércio internacional (US$ 5 trilhões). Mais de 2,6 bilhões de pessoas vivem em seus territórios, o que corresponde a cerca de 38% da população mundial.

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