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Orçamento Participativo ganha o Brasil e o mundo

Keystone

O programa de governo do prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad, traz como uma de suas principais propostas à adoção do Orçamento Participativo na maior e mais rica cidade brasileira.

Praticado no Brasil há 23 anos, esse mecanismo permite a setores organizados da sociedade decidir, através do voto, como será aplicada parte das verbas públicas municipais em áreas como transportes, saúde e saneamento, entre outras.

Assim como Haddad, diversos outros prefeitos eleitos no mês de outubro em todo o Brasil prometem adotar o Orçamento Participativo, meio de democracia direta que hoje, segundo estimativas, já é realidade em cerca de 350 municípios brasileiros e mil e duzentos municípios em todo o mundo. Reconhecido pela ONU como “Prática Bem Sucedida de Gestão Local”, o Orçamento Participativo recebeu em 1996 a chancela da Cúpula das Cidades, ou Habitat II, realizada em Istambul, na Turquia.

As primeiras menções ao Orçamento Participativo no Brasil remontam à década de 1970, com relatos de experiências esparsas realizadas pelas prefeituras de Lajes, em Santa Catarina, e Vila Velha, no Espírito Santo. Foi a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, no entanto, que a iniciativa ganhou base jurídica para ser multiplicada, uma vez que a carta magna brasileira previa a criação dos Conselhos Setoriais de Políticas Públicas como espaços de participação e controle social.

Bandeira histórica do Partido dos Trabalhadores, o Orçamento Participativo foi implantado a partir de 1989 em algumas prefeituras conquistadas por candidatos do PT nas eleições daquele ano. O caso mais emblemático foi o da cidade de Porto Alegre, onde a iniciativa obteve grande sucesso e apoio popular, tornando-se vitrine de uma nova forma de fazer política pública que permitiu ao PT permanecer 16 anos no poder municipal e que, mesmo com a posterior alternância de partidos no comando da Prefeitura, continua sendo realizada até hoje.

Usado como modelo, o método de aplicação do Orçamento Participativo na capital gaúcha teve pequenas alterações ao longo dos anos, mas sua estrutura básica é a realização de plenárias populares, que podem ser temáticas ou regionais. Estas plenárias, as quais são atribuídas pesos diversos de importância, definem prioridades e sugestões para cada região ou setor e elegem delegados para o Conselho do Orçamento Participativo, colegiado que define junto ao Poder Executivo qual será a destinação orçamentária das verbas municipais.

Multiplicação 

Com o sucesso obtido em Porto Alegre e em outras cidades de economia forte como Diadema (SP), o PT replicou a política em boa parte das prefeituras que viriam a ser conquistadas pelo partido nos anos seguintes. Em São Paulo, o Orçamento Participativo foi adotado entre 2001 e 2004, período em que o partido esteve à frente da prefeitura. Foi abandonado em seguida e agora será retomado. Em 1997, já havia sido adotado pelo PT em Belo Horizonte, onde também existe até hoje.

Segundo o pesquisador Brian Wampler, que realizou um estudo sobre o Orçamento Participativo pela Universidade de Boise (EUA), todas as prefeituras de grandes cidades administradas pelo PT adotaram a ideia no período entre 1989 e 2004. Mas, ao mesmo tempo, mostra Wampler, o sucesso da iniciativa fez com que ela fosse abraçada por diversos outros partidos, pois já em 2001 “praticamente dois terços das novas adoções do Orçamento Participativo ocorreram em cidades que não eram administradas pelo PT”.

Wampler diz que, a partir de 1989, “o Orçamento Participativo foi promovido pelo PT e por organizações da sociedade civil diretamente ligadas ao partido”, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Instituto Cajamar, entre outras. Segundo o pesquisador norte-americano, “uma segunda onda de adoção, entre 1997 e 2004, foi dominada por prefeituras de outros partidos, que buscavam obter benefícios gestionários e eleitorais a partir de sua associação a um programa conhecido por sua ênfase na justiça social, na transparência e na participação direta”.

O que era novidade virou realidade, consolidando uma atual forma de democracia direta em municipalidades no Brasil e no mundo. Importantes cidades brasileiras como Belém, Recife, Santo André, Guarulhos e Aracaju, entre outras, também seguiram a política adotada em Porto Alegre. Fora do Brasil, cidades como Buenos Aires, Montevidéu, Barcelona, Bruxelas, Saint-Denis e Toronto também adotaram o Orçamento Participativo. Segundo Wampler, “mais de 300 prefeituras brasileiras adotaram o programa entre 1989 e 2004, além de cidades em pelo menos outros 30 países”.

Diagnóstico 

Criada em 2007, a Rede Brasileira de Orçamento Participativo reúne atualmente 73 municípios que adotam o programa e é hoje o principal espaço de reflexão sobre as diversas metodologias de Orçamento Participativo realizadas no Brasil. O número de associados à Rede – ou mesmo o universo de 350 municípios brasileiros que, segundo ela, adotam o Orçamento Participativo – ainda é pequeno em um país que tem mais de cinco mil municípios.

“No entanto, as maiores cidades brasileiras já têm hoje o Orçamento Participativo, e a gente percebe que há um número grande de pessoas sendo alvo desse tipo de política pública”, pondera a coordenadora da Rede Brasileira de Orçamento Participativo, Kátia Pereira Lima. Para traçar um diagnóstico detalhado sobre a implantação do Orçamento Participativo em todo o país, a Rede trabalha atualmente na Pesquisa OPBrasil, que ainda não teve seus resultados divulgados.

Evento paralelo à Rio+20, e que reuniu em junho, no Brasil, cerca de 30 mil representantes de organizações, redes e movimentos sociais de todo o mundo, a Cúpula dos Povos listou sete desafios que a humanidade precisa enfrentar para fortalecer a participação popular e as formas de democracia direta na elaboração de políticas públicas:

1 – Fazer com que a participação popular seja vista como um direito, como um processo de conquista da sociedade.

2 – Romper com a fragmentação dos processos e espaços de participação popular, promovendo um exercício de intersetorialidade.

3 – Ampliar a participação popular nos debates a respeito de questões ligadas à política econômica e a infraestrutura de grande impacto.

4 – Promover práticas de participação e controle social em âmbito nacional.

5 – Pensar a sustentabilidade dos processos participativos, com propostas de financiamento, formação, transparência e comunicação.

6 – Incorporar as novas formas de linguagem e interação da cultura da internet na democracia participativa.

7 – Promover uma reforma política que garanta novos modelos de representação política, mais voltados à participação popular.

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