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Migrantes europeus: “parasitas” do sistema social

Keystone

A livre circulação de mão-de-obra não trouxe apenas trabalhadores estrangeiros à Suíça, mas também um número crescente de desempregados, criticam os partidos de direita. Enquanto seus representantes falam de um "turismo social", o governo tenta acalmar a população e ressaltar os aspectos positivos da migração para o estado-providência.

“A livre circulação foi idealizada para permitir que os cidadãos europeus trabalhassem na Suíça. Hoje aumenta o número de pessoas que chegam ao nosso país fugindo da crise e sem dispor de um contrato de trabalho, sendo que muitos também acabam ficando depois de serem demitidos dos seus empregos. E isso à custa do nosso estado-providência”, ressalta Guy Parmelin, deputado-federal do Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão).

O chamado “turismo da assistência social” é um dos temas mais discutidos na campanha da iniciativa (n.r.: projeto de lei lançado após recolhimento de um número mínimo de assinaturas e depois votado em plebiscito) lançada pelo SVP contra a “imigração em massa”, votada em nove de fevereiro. O tema ocupa também o debate político na Grã-Bretanha e Alemanha, porém com outros nuances.

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O conceito discutível do “turismo social”

Os números são conhecidos. Vamos então olhar a situação da Suíça: desde a entrada em vigor dos acordos bilaterais em 2002, a Suíça recebeu mais de 700 mil imigrantes, dos quais 60% são originários dos países da União Europeia. Não apenas aumentou o número de mão-de-obra estrangeira, mas também de desempregados e beneficiários da assistência social da UE.

É possível considerar esse desenvolvimento como a prova de abuso do sistema? Para os especialistas, a utilização do termo é incorreta. “Não verificamos um turismo social. A maior parte dos migrantes originários de países da UE tem um contrato de trabalho quando chegam à Suíça”, explica Marcel Suter, presidente da Associação das Autoridades Migratórias Cantonais (VKM).

Michel Cornut, chefe do Depto. de assistência social de Lausanne, compartilha sua opinião. Essa cidade localizada a oeste do país é uma das mais atingidas pela migração e pobreza.

“Casos de abuso óbvio, no qual, por exemplo, pessoas se organizam para trazer famílias inteiras e terminam na assistência social existem, mas em número insignificante. Porém fica claro que um aumento do número de trabalhadores migrantes faz com que alguns deles fiquem em dificuldade, mas também por estavam em uma situação de trabalho precário. Por isso eles necessitam de apoio.”

Em 2013, o índice de desemprego na Suíça foi de 3,2%. Um ano antes, foi de 2,9%.

Suíços: 2,2% (+0,1%)

Estrangeiros: 6,0% (+0,5%)

Cidadãos da UE (27 membros): 5,2% (+0,7%)

Portugueses: 7,5% (+0,9%)

Franceses: 6,1% (+0,6%)

Espanhóis: 5,8% (+1,2%)

Italianos: 4,7% (+0,4%)

Alemães: 3,6% (+0,4%)

(Fonte: Seco)

Desemprego e assistência social: quem tem direito?

Para se beneficiar do estado-providência não é preciso ter feito um estudo. Os tratados bilaterais são bastante claros nesse sentido: um italiano, que chegue à Suíça com um contrato de trabalho por tempo indeterminado no bolso, tem direito a um visto de permanência de pelo menos cinco anos, renovável também. Caso ele perca o trabalho, tem direito a se beneficiar do sistema de seguro-desemprego (ele precisa provar que trabalhou nos últimos dois anos pelo menos 12 meses) e, caso necessário, também à assistência social.

Para Guy Parmelin, cada pessoa que não seja mais capaz de contribuir ao sistema, deve retornar o mais rápido possível para o seu país, “ao invés de depender da assistência social. Mas muitas vezes eles não têm mais o interesse de fazê-lo.”

Em 2012, pouco mais de 35 mil cidadãos da UE (com os 27 membros) recebiam assistência social, o que corresponde a uma quota de 3,1% e, dessa forma, à média geral na Suíça. “Com outras palavras, a dependência do estado-providência não é uma razão para a perda do visto de permanência”, mesmo se está situação tiver uma influência na renovação do visto, ressalta Marcel Suter.

A situação é diferente para pessoas que chegam à Suíça para procurar um trabalho. Nesse caso, elas recebem apenas um visto temporário para uma estadia de até seis meses. Ela também não tem direito à assistência social, ao contrário dos países da União Europeia, onde este é parte da norma.

Todavia, algumas comunas (municípios) na Suíça preveem uma espécie de ajuda, uma prática cada vez mais controversa e que o governo federal quer coibir através de uma nova lei, apenas algumas semanas antes da votação.

O problema dos contratos forjados

Uma brecha na lei é apontada pelo SPV, o chamado princípio da totalização: teoricamente, esclarece a Secretaria de Estado da Economia (Seco) – um cidadão francês ou alemão poderia ter trabalhado apenas um dia na Suíça e depois já poder se beneficiar do seguro-desemprego, caso ele tenha trabalhado um ano inteiro em um país da União Europeia.

“Esses casos são aceitos pelas autoridades, o que faz com que o balanço do sistema do estado-providência seja claramente negativo”, afirma Parmelin. Para ele, a suspeita de contratos forjados parece ser justificada.

Segundo números do Seco, apenas 1.800 pessoas em 2013 se beneficiaram desse dispositivo, o que corresponde a 2,5% dos 73.318 novos migrantes. Embora o número de casos seja crescente, eles ainda permanecem em níveis muito baixos.

Por isso o governo decidiu reforçar a cooperação e o controle entre os diferentes órgãos públicos, com o objetivo de detectar possíveis contratos falsos ou casos de abusos do sistema do estado-providência.

Segundo um relatório da Secretaria Federal de Previdência Social (BSV), as contribuições de cidadãos da UE ao primeiro pilar do sistema previdenciário (AHV) de 2001 a 2010 aumentou de 18,5 para 22%. As contribuições de trabalhadores suíços diminuiu no mesmo período de 75,2 a 72,8%.

Em 2012, os cidadãos europeus beneficiaram de apenas 15% das aposentadorias pagas no primeiro pilar.

As autoridades consideram “impossível fazer uma previsão confiável e precisa” do impacto da imigração sobre os custos futuros das pensões.

(Fonte: Secretaria Federal de Previdência Social)

Influência na previdência social

Ao mesmo tempo, o Seco tranquiliza o cidadão: o aumento do desemprego permanece no padrão e o impacto da migração no seguro social é positivo. „A imigração de países da UE e AELC (Associação Europeia de Livre Comércio) diminui o processo de envelhecimento da população e, dessa forma, colabora com o sistema de previdência social financiado principalmente por um regime de repartição, explica a porta-voz do Seco, Isabel Herkommer.

Sem a migração, o primeiro pilar do sistema suíço de previdência social (AHV, na sigla em alemão), já estaria deficitário desde 1992. No que diz respeito ao sistema de seguro-desemprego (ALV), a Seco considera que “há um equilíbrio entre a receita e os gastos para os cidadãos dos países da UE e AELC.”

Então não há razão para preocupação? Não completamente, considera Cornut, do Depto. de assistência social de Lausanne. “Cada acréscimo de dependentes da assistência social, sejam eles suíços ou estrangeiros, é preocupante. Segundo o governo, a livre circulação trouxe mais vantagens do que desvantagem. Mas também há efeitos colaterais como o aumento da pobreza, não devemos negar.”

Parmelin se mostra cética em relação às estatísticas, pois elas não espelhariam a realidade e não levaria em consideração o cenário de uma possível recessão da economia suíça.

“Estamos diante de uma bomba-relógio. Em trinta a quarenta anos, os migrantes europeus que hoje colaboram no financiamento das nossas pensões terão direito à aposentadoria. E quem irá pagá-las?”, se questiona. “A migração faz apenas com que retardemos as medidas necessárias contra o processo de envelhecimento da sociedade.”

Atualmente a Suíça porta-se como um dos países que mais têm se beneficiado da livre circulação da mão-de-obra. Essa é a conclusão de um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como publicado pelo jornal semanário NZZ am Sonntag.

Ao comparar com os custos causados pelos migrantes para a administração, infraestrutura e sistema social com os benefícios trazidos como os impostos recolhidos e taxas pagas, o lucro para a Suíça é de 6,5 bilhões de francos, consideram os autores. A luta dos números parece continuar ainda por um bom tempo. 

Número de beneficiários da assistência social em 2012: 250.333, o que corresponde a 3,1% da população.

Pessoas originárias do exterior têm um risco maior de passar por dificuldades financeiras devido ao seu menor grau de instrução, o fato de terem maiores famílias ou uma situação precária de trabalho.

Segundo o Departamento Federal de Estatísticas, em 2012 a participação de estrangeiros entre os beneficiários da assistência social era de 6,3%, sendo que a de suíços era de apenas 2,6%.

(Fonte: Departamento Federal de Estatísticas)

Adaptação: Alexander Thoele

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