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Suíça debate o reconhecimento da Palestina

Uma mulher palestina espera sua vez em um posto de controle israelense, perto de Belém. Keystone

No final de setembro, a Assembleia-Geral da ONU vai se pronunciar sobre o reconhecimento da Palestina como Estado independente. O pedido será apresentado pela Liga Árabe na abertura da assembleia anual dia 20 de setembro. Qual será a posição suíça?

Essa é uma questão vital para a Palestina e para a diplomacia suíça. Para começar, um debate foi organizado em Berna, capital suíça.

“Durante vinte anos nos sentamos à mesa de negociações sem obter resultados”, explica à swissinfo.ch o embaixador palestino na ONU, Ibrahim Khraishi.

“Agora chegou o momento de atual e de nos dirigirmos diretamente às Nações Unidas para que reconheça oficialmente a existência de um Estado palestino com fronteiras anteriores a 1997” que incluía a Cisjordânia, a Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental.

As negociações israelo-palestinas estão estagnadas há mais de dois anos e Israel mantém sua política de ocupação de Jerusalém Oriental e a construção de um muro na fronteira com a Cisjordânia. Cansada dessa situação sem saída, a Autoridade Nacional Palestina (ANP) apresentou um pedido de adesão à ONU como 194° Estado membro.

A essa reivindicação se opõem Israel e Estados Unidos. A um ano das eleições presidenciais Washington não pode se indispor com o importante “lobby” pró-israelense no Congresso e deverá exercer seu direito de veto no Conselho de Segurança.

“Se encontrarmos resistência por parte dos Estados Unidos, que é o que esperamos, apresentaremos à Assembleia-Geral um pedido de reconhecimento da Palestina como Estado observador, o mesmo estatuto do Vaticano”, explica Ibrahim Khraish, convidadado de uma mesa-redonda organizada esta semana pelo Foraus, fórum independente de política exterior suíça. “Neste órgão necessitamos o respaldo de uma maioria de países. Até agora, mais de uma centena reconhecera a existência de um Estado palestino”.

Entre eles não a Suíça nem a União Europeia (UE), mas  Ibrahim Khraishi se mostra otimista: “Berna já demonstrou em reiteradas ocasiões que acredita em uma solução de dois Estados, conforme estabelece a resolução da ONU, e confio que em setembro adote a decisão adequada”.

Israel denuncia um ato unilateral

O Estado hebreu contesta claramente as aspirações palestinas. “A Palestina toma uma decisão unilateral, que exclui Israel da mesa de negociações”, sublinha à swissinfo.ch o embaixador de Israel em Berna, Ilan Elgar.

“Pede ao mundo que tome uma posição, porém não parece disposta a retomar as negociações conosco que somos diretamente interessados. A base de uma negociação são a confiança e o respeito recíproco. Como vamos avançar se esses dois elementos não estão reunidos?

Para o diplomata, mesmo que a ONU reconheça o Estado palestino não permitirá resolver questões cruciais como a delimitação de fronteiras, a divisão de Jerusalém ou o regresso dos refugiados.

 Ilan Elgar reitera que um Estado palestino somente pode ser fruto de uma negociação direta, mão não precisa em que bases Israel – militar e politicamente mais forte – está disposto a fazer concessões.

Um ato “simbólico” com consequências perigosas

Na Europa, Israel pode contar com o apoio da Alemanha e da Itália, enquanto o governo suíço vai se pronunciar no final de agosto, com base nas recomendações das comissões de política exterior do Parlamento.

A comissão do Senado já discutiu e aconselha que a Suíça não deve tomar nenhuma iniciativa, “por enquanto”. A comissão da Câmara ainda não se pronunciou.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Adrian Solberger, declarou ao jornal Le Temps que “não existe atualmente nenhum pedido nem um projeto de resolução concreto. A Suíça tomará posição no momento certo”.

O tema provocou um amplo debate. Se políticos e académicos parecem concordar com a necessidade de encontrar uma solução pacífica para o conflito, as opiniões divergem quanto à pertinência de reconhecer o Estado palestino sem o aval de Israel e dos Estados Unidos. 

 Para Daniel Möckli, do Centro de Estudos sobre Segurança da Escola Politécnica Federal de Zurique (EPFZ), se trataria – quando muito – de um “ato simbólico, que ameaça deteriorar as condições de vida do povo palestino e compromete a participação de Israel em futuras negociações de paz”.

Também é a opinião Andreas Brönnimann, deputado federal do Partido do Povo Suíço (SVP/UDC, direita conservadora e maio partido suíço) e vice-presidente do grupo parlamentar Suíça-Israel.

“Essa proposta é demasiado prematura. Neste momento convivem na Palestina dois forças políticas, o Hamas e o Fatah. A prioridade não é a independência, mas uma estabilidade que os conduza um dia a assumir a responsabilidade de liderar um novo Estado palestino.”

Segundo Brönimman, hoje não se pode considerar a Palestina como Estado soberano. A Suíça deve mostrar-se “neutra” frente as partes em conflito e contribuir – como até agora – pelo processo de paz reforçando a democracia palestina e tendo um compromisso humanitário.

Kosovo e agora Palestina

Rechaçada pelos chamados partidos burgueses (centro e direita), a causa palestina goza de amplo apoio dos partidos de esquerda.

“O reconhecimento do Estado palestino trará um novo dinamismo à solução do conflito; é um primeiro passo para a abertura de negociações que estagnadas há vários anos”, diz Hans-Jürg Fehr, membro da comissão de política exterior da Câmara.

Para ele, deputado federal socialista, é do interesse da Suíça e da Palestina reconhecer a legitimidade desse ato. “Assim entendemos a neutralidade ativa; significa não calar, mas falar, negociar, ajudar. Como no caso do Kosovo, também no caso da Palestina não há outras soluções possíveis a não ser reconhecer um Estado independente”.

Outros pesquisadores do Forau chegam à mesma conclusão e recomendam que a Suíça apoie a Palestina na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York. “É uma consequência lógica do compromisso suíço no Oriente Médio, coerente com a iniciativa de Genebra de 2003”, explica o cientista político Andreas Graf.

“No caso do Kosovo, a Suíça interpretou a noção de Estado em um sentido amplo, reconhecendo assim a legitimidade das aspirações independentistas. O mesmo deveria aplicar-se à Palestina, respeitando o direito internacional. E, conforme o princípio da universalidade, as relações bilaterais com a Palestina deveriam ser adaptadas as essas novas condições”.

Na abertura da Assembleia-Geral da ONU, dia 20 de setembro, em Nova York, a Liga Árabe apresentará o pedido formal de adesão à ONU do Estado Palestino, com fronteiras anteriores à Guerra dos Seis Dias de 1967. Esse território compreende a Cisjordânia, a Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental.

Essa iniciativa requer aprovação do Conselho de Segurança. Os Estados Unidos já advertiram que são contra e que exercerão o direito de veto.

No entanto, a Assembleia-Geral da ONU pode conceder à Autoridade Nacional Palestina (ANP) um mudança de estatuto: passar de “movimento observador” a “Estado observador” da ONU, como o Vaticano. Nesse caso, a questão não passaria pelo Conselho de Segurança.

Duas facções disputam o controle dos territórios palestinos: Fatah e Hamas.

O Fatah é um movimento laico fundado em 1959 por Yasser Arafat. Até 2006 foi a principal organização palestina. O partido controla a Cisjordania e é dirigido por Mahmud Abbas (Abu Mazen), presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP). Para Israel é o único interlocutor válido no processo de paz.

O Hamás é um movimento de inspiração islâmica criado em 1987 pelo xeique Ahmed Yassin. Figura na lista das organizações terroristas de vários governos ocidentais, por negar-se – entre outras coisas – a reconhecer o Estado de Israel. Nas últimas eleições (2006), regulares segundo observadores, teve a maioria dentro da ANP, e passou a controla a Faixa de Gaza.

As tensões entre o Hamas e o Fatah depois da morte de Arafat se intensificaram depois da vitória eleitoral do partido islamista.

Além da disputa pelo poder, os dois partidos divergem sobre as condições para de diálogo com Israel.

No final de abril, o Fatah e o Hamas firmaram um acordo de reconciliação, mas até agora não se entenderam para nomear um chefe de governo.

Nos últimos cinco anos, houve uma  guerra civil, sobretudo na Faixa de Gaza. Apesar de diversos acordos de cessar-fogo e da negociações de 2009,  o conflito já provocou centenas de mortos.

Adaptação: Claudinê Gonçalves

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