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Porque a Suíça precisa adotar políticas de ações afirmativas

Jeff Makana

No Dia do Trabalho, tradicionalmente marcado por iniciativas que destacam os direitos dos trabalhadores, o ativista Jeff Makana argumentou que a lei precisa ser alterada para permitir um acesso verdadeiramente justo ao mercado de trabalho suíço.

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Na Suíça, pessoas de cor e outros grupos minoritários encontram muitos obstáculos para entrar no mercado de trabalho devido a barreiras administrativas que afetam desproporcionalmente algumas minorias sociais. Ações afirmativas são políticas que buscam aumentar as oportunidades para uma parte sub-representada da sociedade considerando fatores como raça, sexo, religião ou nacionalidade. Acredito que a Suíça precisa adotar esse tipo de política para nivelar o campo do jogo social.

A representatividade de grupos tradicionalmente desfavorecidos no local de trabalho é importante para acabar com a discriminação contra pessoas de cor e minorias, no país alpino.

A legislação trabalhista suíça não exige que um programa de diversidade seja estabelecido no local de trabalho, exceto entre empregadores do setor público, como o governo federal ou universidades. No entanto, uma variedade de empresas com sede na Suíça, de todos os setores da indústria (como Novartis, Roche, Swisscom, Credit Suisse, AXA, PwC e Coutts) adotaram iniciativas e programas de políticas de diversidade e inclusão. Agora é hora de dar um passo adiante.

A legislação trabalhista e os precedentes judiciais relacionados estabelecem uma política antidiscriminação no local de trabalho em relação à raça, gênero, religião, idade, nacionalidade e saúde. Mas nenhuma dessas medidas ou disposições garante uma ação afirmativa. Tal política ajudaria a garantir que os princípios estabelecidos no Artigo Oitavo da Constituição Suíça sejam plenamente realizados. O Artigo Oitavo proíbe a discriminaçãoLink externo, consagra a igualdade de direitos entre homens e mulheres e busca eliminar “as desigualdades que afetam as pessoas com deficiência”.

Um tipo diferente de racismo

O racismo simbólico pode ser encontrado no mercado de trabalho suíço e na Suíça em geral. Em geral, acredita-se que grupos historicamente marginalizados, como a população negra ou sem-teto, não enfrentam mais preconceito ou discriminação nos dias de hoje. Seguindo essa lógica, pessoas acreditam que estas populações não conseguem progredir na sociedade porque não estão dispostas a trabalhar duro o suficiente ou fazem exigências demais. Esse tipo de opinião substituiu amplamente o racismo “antiquado” em relação às pessoas de cor e os sem-teto, mas pode ser igualmente prejudicial, especialmente quando se trata do mercado de trabalho.

De acordo com uma pesquisa sobre “Afrofobia”Link externo, realizada na Suíça pelo Dr. Noémi Michel da Universidade de Neuchâtel, “o tabu que ronda a discussão sobre raça (e consequentemente o racismo) está enraizado na crença de que não existe este tipo de preconceito no continente europeu. Nessa linha, a discriminação racial não pode ser combatida sem que os próprios ativistas sejam rotulados de racistas por instigarem a conversa”.

Falei com várias pessoas na Suíça, de diferentes esferas da vida, cujas experiências sublinham o fato de que algo a mais precisa ser feito para combater o racismo simbólico e a discriminação no mercado de trabalho.

Mohammed Wa Baile é um cidadão suíço de origem queniana que trabalha na Universidade de Bern como bibliotecário e é ativista comunitário. Ele aponta a longa luta das mulheres suíças pela igualdade como um precedente e um exemplo do que os grupos minoritários enfrentam na luta pela igualdade de tratamento. Para citar alguns exemplos, as mulheres suíças não podiam votar em nível federal até 1971 e a Suíça foi um dos últimos países europeus a ratificar a convenção da ONU de 1979 que protege os direitos básicos das mulheres, também estabelecendo a licença maternidade. Na opinião de Baile, ainda que a luta das mulheres precise continuar, um trabalho precisa ser feito para que ela não ofusque as demandas de outros grupos por equidade no campo social.

“A ideia de tentar aumentar a representação de pessoas que foram discriminadas e excluídas por gerações em todas as áreas de emprego, educação e cultura é uma forma positiva de lidar com a desigualdade”, disse Wa Baile, citando práticas nos Estados Unidos e África do Sul e destacando que na Suíça as mulheres têm sido as principais beneficiárias das políticas de ação afirmativa. 

“As mulheres lutaram e ainda lutam muito para informar a sociedade sobre o sexismo”, diz ele. “Agora, o que é necessário é incluir o racismo no discurso da ação afirmativa.” 

Julgado em capacidades

Emre Firat, um cidadão suíço com raízes turcas, também apoia a ideia. Embora diga que não teve problemas para encontrar trabalho porque nasceu e foi criado na Suíça, ele conhece muitas pessoas que têm lutado para não sofrer preconceito por  sua origem e “especialmente pelo que representam para a sociedade de hoje”. Ele agora trabalha com marketing de seguros, mas enquanto trabalhava em uma agência de empregos, Firat diz que um de seus clientes explicitamente não queria aceitar candidaturas de “estrangeiros”, destacando a abrangência do problema.

Aurélie Induni, de nacionalidade suíça, pensa que “o preconceito pesa muito nos processos de recrutamento” para vagas de emprego.

“Nossa cultura pré-existente está dominando o mercado de trabalho”, diz ela. “Alguns nem mesmo têm consciência de seu preconceito”.

Induni, que trabalha na área da gestão de dívidas, tem sofrido discriminação no mercado de trabalho devido ao seu sexo. Ela já ouviu de algumas empresas que “preferiam contratar um homem”. Induni também testemunhou a um emprego sendo negado para um colega que havia ficado fisicamente incapacitado após um acidente. Ela acredita que entrevistas “ às cegas” na primeira rodada de processos seletivos podem ser uma medida útil ao permitir que as pessoas não sejam julgadas por sua cor de pele ou deficiência física.

“Pessoas de cor, pessoas com deficiência, pessoas com tatuagens (sim, aconteceu com alguém que conheço), mulheres, pessoas da comunidade LGBTQ +, pessoas com certas crenças religiosas – todas elas podem ser as melhores em alguma coisa, mas ainda assim não serem contratadas para vagas de emprego por causa de outros fatores que não têm a ver com suas capacidades”, disse Induni.

Mohammed Wa Baile resume:

“Precisamos discutir como ações afirmativas funcionariam melhor no contexto suíço, onde mulheres, pessoas trans, pessoas com deficiência, sem-teto, refugiados, negros e pessoas de cor podem participar política, social, econômica e culturalmente para ajudar a Suíça a avançar, em termos globais”. 
 

Série de opinião

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Adaptação: Clarissa Levy

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