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Especialistas criticam OSCE

Uma patrulha de policiais em 24 de abril de 2014, em Bujanovac, Sérvia. Keystone

Os Bálcãs ocidentais tornam-se o maior campo de operações da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa - OSCE. Nota-se, porém, muita discordância sobre a eficácia dessa entidade internacional, presidida neste ano pela Suíça e muito envolvida atualmente com a Ucrânia.

Para se ter uma ideia das divergências basta reunir, por exemplo, um grupo de jornalistas ou analistas políticos em Belgrado e Priština e tocar no assunto OCSE. É mais que provável que a maioria expresse dúvidas sobre a utilidade e a eficiência das missões destinadas a estabilizar o Kosovo, região balcânica sacudida por fortes tensões étnicas.

Mas apresente essas críticas aos representantes dos 57 países membros do organismo ou de organizações não governamentais que se encontram no terreno e, sem surpresa, o tom muda completamente.

Uma recente missão de informação, organizada pelo Ministério suíço das Relações Exteriores, esclareceu alguns pontos e deixou mais questões pendentes, dando margem até a piadas.

E, de fato, não durou muito tempo para que – seja nos bastidores, seja nos bares – a OSCE fosse rebatizada com humor ‘Organização para Servir Café na Europa’. E esta não passa de uma das várias denominações jocosas.

Besa shahini, tarimbada jornalista do grupo de reflexão ‘Iniciativa para a Estabilidade Europeia’, é mais categórica.

“Não entendo por que a OSCE precisa de 600 pessoas no Kosovo. Não concordo que fosse necessário para as eleições (de 2013) no Norte, pois outra organização poderia muito bem ter-se ocupado da tarefa. Poderíamos ter utilizado a missão de controle para o processo eleitoral.” A jornalista lançou esse ataque durante uma mesa-redonda informal reunindo jovens especialistas.

Sahini realça que, tirando as eleições, o desempenho da OSCE limitou-se ao papel de um grupo de reflexão no Kosovo, a observar a aplicação de várias leis relacionadas com a minoria no Kosovo e a cooperar no processo político.

O mesmo tom crítico se nota em Leon Malazogu, cofundador de ‘Democracia para o Desenvolvimento’ – outro grupo de reflexão -, sediado no Kosovo.

Em debate de crescente intensidade no encontro, ele descreve a OSCE como organismo de “pouca serventia” e “90% inútil.”

“Excetuando as eleições no Norte do Kosovo e alguns relatórios interessantes sobre a observância da lei, a OSCE pode dificilmente justificar sua maciça presença.” (A missão no Kosovo é a mais importante da OSCE.) 

Malazogu refere-se a eleições de 2013, quando a organização foi acusada de tomar partido de políticos, em vez de apoiar ONGs que descobriram suspeitas de irregularidades.

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Visibilidade

O ceticismo persiste também entre jornalistas e correspondentes de países ocidentais.

Jeta Xharra, diretora da ‘Balkan Investigative Reporting Network’ (rede de jornalismo investigativo dos Bálcãs) não mede palavras ao qualificar a missão da OSCE de “inoperante.”

O respeitado jornalista duvida se presidência exercida pela Suíça, neste ano, fará muita diferença quanto à possibilidade de melhorar a situação.

Por seu lado, Walter Müller, correspondente da SRF (rádio pública suíça) na Europa do sudeste, não vai tão longe na sua crítica, embora questione a eficácia e a visibilidade dos esforços da OSCE na região.

“A presença de representantes da OSCE, especialmente no Vale Preševo, Sul da Sérvia, serviu muito para prevenir a violência. Mesmo assim me pergunto para que serve tanto pessoal,” alfineta Müller.    

    

No total, a OSCE empregou, em 2013, quase 2.900 pessoas nas suas 26 missões no terreno e na sua sede, em Viena. E dispõe de um orçamento de €144.8 milhões (CHF176.6 milhões).

No terreno

O mandato da maior organização de segurança do mundo – criada como um foro de diálogo entre o Leste e o Oeste, durante a Guerra Fria – é promover os direitos humanos e providenciar competência no desenvolvimento de sociedades democráticas, incluindo a aplicação da lei e a boa governança.

E a prioridade é a proteção das minorias no Kosovo e na Sérvia.

Entre os projetos respaldados pela força-tarefa suíça na OSCE figura um curso de quatro meses na escola secundária da cidade de Bujanovac. O objetivo é estimular os estudantes de língua albanesa a aprenderem o sérvio, visto que os conhecimentos insuficientes de linguagem reforçam a segregação numa das regiões mais pobres da Sérvia.

O desenvolvimento de um serviço de polícia de uma comunidade multiétnica, na mesma região, é outro elogiado programa da OSCE.

Patrulhas mistas de sérvios, albaneses e roms (ciganos doa Bálcãs) contribuíram para reforçar a confiança nas autoridades, de acordo com oficiais da polícia local e de funcionários da OSCE.

Sonja Licht, importante ativista política e destacada resistente ao ex-presidente Slobodan Milošević, enaltece a cooperação entre ONGs e a OSCE.

“Em conflitos de menor importância a OSCE desempenha papel de destaque. A entidade convenceu o governo sérvio a empenhar-se na qualificação da polícia, na segurança das pessoas e nas questões de gênero.”

Ela lembra ainda um projeto em benefício dos jovens roms, apoiado pela organização.

“É um projeto que trouxe esperança aos jovens. Mas infelizmente o programa não atraiu muita atenção do público,” lamenta Sonja Licht.

Boa reputação

O chefe da missão da OSCE em Belgrado, o suíço Peter Burkhard, reage rapidamente a uma alegada falta de visibilidade de sua organização.

“Nos Bálcãs não se precisa explicar o que é a  OSCE,” esclarece. A entidade goza de excelente reputação.”

E afirma que, pela sua simples presença, a OSCE facilitou a solução do conflito no Sul da Sérvia e nas regiões de Sanžak.  

Peter Burkhard e dez de seus funcionários superaram claramente o número de um pequeno grupo de jornalistas durante uma reunião no escritório de Belgrado sobre as atividades de sua missão, abordando a reestruturação do sistema judiciário, capacitação no campo da mídia, controle do processo democrático e luta contra a corrupção.

“A OSCE ajudou a Sérvia a romper o isolamento,” comenta Paula Thiede, vice-chefe da missão.

Gordana Jankovic, chefe da missão, aborda o que parece um dilema inerente: “Como se ilustra a criação de uma boa lei?” E prossegue: “Somos ativos nos bastidores.”  

O Ministro suíço das Relações Exteriores, Didier Burkhalter – atual presidente da OSCE – explica os interesses da Suíça em promover projetos de integração no Kosovo e na Sérvia.

A Suíça exerce, em rodízio, neste ano a presidência da OSCE (Conferência para a Segurança e Cooperação na Europa) e apoia o mesmo papel a ser desempenhado pela Sérvia, em 2015. É segunda vez que a Suíça dirige essa organização. A primeira foi em 1996.

Uma das prioridades da atual presidência pela Suíça – exercida pelo ministro das Relações Exteriores, Didier Burkhalter – é a reconciliação e a cooperação na região dos Bálcãs Ocidentais.

A OSCE mantém atualmente 16 campos de operações. A missão no Kosovo é a maior, com 600 pessoas e um orçamento de mais de €20 milhões, em 2013.

A missão da OSCE na Sérvia, chefiada pelo suíço Peter Burkhard, é integrada por 166 pessoas e contou com um orçamento regular de €7 milhões no mesmo período, segundo informes publicados pela organização.

Confuso?

Ficar nos bastidores é um papel pouco adequado para o porta-voz da missão da OSCE no Kosovo, Nikola Gaon. Personagem eloquente, nada lhe escapa, pelo menos todas as críticas a seus superiores.

Seja na visita aos escritórios da rede de jornalistas de investigação em Priština, seja num encontro de analistas políticos, o porta-voz da OSCE sabe quando e como corrigir um equívoco.

Às vezes seu trabalho é facilitado. Por exemplo, quando Naim Rashiti, analista do Grupo de Pesquisa Política dos Bálcãs comenta: “Estou feliz porque a OSCE desempenha um papel no diálogo, pois as Nações Unidas perderam essa batalha para sempre.”

Rashiti considera que o monitoramento será uma função importante para a OSCE, levando Nikola Gaon a responder que são também importantes o “desenvolvimento institucional” e o papel não executivo da organização.

“A OSCE é uma vítima empacada em consequência de desentendimento entre os estados membros. Rússia e Sérvia, por exemplo, insistiram em manter a missão nas dimensões atuais, com um mandato modesto,” observa Naim Rashiti.

Os incrédulos quanto à utilidade da OSCE nos Bálcãs podem se consolar com um outro apelido que a entidade recebeu no Kosovo: ‘Organization for Spreading Confusion in Europa’ (organização para espalhar a confusão na Europa).

Eleições gerais antecipadas realizam-se no Kosovo dia 8 de junho deste ano de 2014.

O escrutínio, previsto para novembro, é realizado antes do prazo na tentativa de romper um impasse no Parlamento sobre numerosas questões, incluindo a criação de forças armadas no território.

A OSCE apoiará o processo eleitoral em quatro municipalidades situadas no Norte, dará assessoria às comissões eleitorais locais, além de providenciar apoio técnico nos postos de votação e transporte do material eleitoral.
 
Cerca de 120 pessoas estarão ocupadas nessas tarefas, dia 8 de junho, segundo o porta-voz da OSCE, Nikola Gaon.

As autoridades do organismo esperam que as eleições estabilizem um estado economicamente fraco, e abalado por fortes tensões étnicas; estado que se declarou independente da Sérvia em 2008.

As eleições locais de novembro de 2013 foram perturbadas principalmente nas regiões de maioria sérvia no Norte do jovem país.

Na ocasião, a OSCE enviou observadores às eleições para monitorar o escrutínio. Eles registraram numerosos incidentes, com adversários destruindo locais de voto, principalmente na dividida cidade de Mitrovica.

Adaptação: J.Gabriel Barbosa

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