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Referendum grego sacode “europeus indecisos”

Charles Wyplosz diz que os membros do G20 terão "palavras duras" para os europeus esta semana. AFP

Enquanto a França hospeda a reunião de cúpula do G20, o referendum grego ameaça provocar um buraco ainda maior no acordo duramente conquistado para corrigir a crise da dívida pública da zona do euro.

Charles Wyplosz, professor de economia na Universidade de Genebra, felicita o plebiscito grego sobre o resgate proposto pela União Europeia, que ele espera sacudirá os europeus “confusos” e “divididos”.

O resgate foi uma “austeridade inútil imposta aos gregos”, mas o referendo é uma oportunidade para introduzir um elemento de democracia no processo, diz Wyplosz à swissinfo.ch.

O primeiro-ministro grego George Papandreou convocou na segunda-feira, 31 de outubro, um surpreendente plebiscito sobre o novo pacote de ajuda da UE e disse que iria pedir um voto de confiança para garantir apoio à sua política para o restante de seu mandato de quatro anos, que expira em 2013.

swissinfo.ch: O que podemos esperar desta cimeira do G20?

Charles Wyplosz: Não muito, como de costume. A reunião é susceptível de ser parcialmente desviada pela crise europeia, mas não há nada que a cúpula possa fazer. Podemos muito bem ter uma continuação das recentes reuniões da zona do euro, enquanto o resto do mundo se queixa que os europeus estão atrapalhando as coisas em vez de lidar com a crise.

Uma série de outras questões foram elaboradas em relação aos movimentos de capitais e a normalização do setor, mas elas devem provavelmente ocupar um segundo plano. E haverá a discussão anual sobre moedas e o poder de voto no FMI.

Os Estados Unidos e a Europa podem estar entrando em uma recessão, mas o presidente Obama tentou aprovar seu programa para o mercado de trabalho no Congresso, e este foi recusado. Suas mãos estão atadas, e os europeus estão completamente sem saber o que fazer. Por isso, é improvável que esta cimeira seja caracterizada pela ousadia.

Eu acho que a importância do G20 é muito exagerada. Não é o lugar para negociar e tomar decisões. É muito grande e muito diversificado. É muito útil – não tenho nada contra as pessoas falando e confrontando pontos de vista – mas cada vez que há um grande aumento nas expectativas, o que sobra é uma enorme decepção.

swissinfo.ch: Qual é a sua reação à decisão da Grécia de propor um referendo público sobre o acordo de resgate concluído na semana passada?

CW: Estou muito contente por este referendo. Os europeus estão maioritariamente confusos e no caminho errado, por isso eles precisam de um grande sacudida para recomeçar e entrar em uma nova base.

Estou profundamente chocado com a austeridade inútil imposta aos gregos. A situação na Grécia está se deteriorando dia após dia e eles não vão melhorar o seu déficit orçamentário enquanto a economia estiver encolhendo.

Isso tudo é decidido de uma forma muito pouco democrática e imposta ao governo grego. A soberania do país está sendo violada, de modo que este referendo é uma ocasião para introduzir um elemento de democracia neste processo, que tem sido extraordinariamente tecnocrático.

É também um lembrete muito importante para os líderes políticos que estão criando uma dor tremenda, impondo uma cura de austeridade no meio de uma recessão, o que está fadado ao fracasso, e já está visivelmente dando errado.

swissinfo.ch: A questão da dívida europeia deve provavelmente ser levada a uma votação pelos membros do G20, como os EUA, a China e a Índia. Que reações ou apoio o senhor espera?

CW: Os europeus vêm cortejando a China e o Brasil, e alguns outros países, para conseguir algum dinheiro, o que é ridículo. Eles têm os recursos que necessitam para resolver seus problemas, mas estão muito confusos e divididos. Tenho certeza que os outros irão dar um pouco de dinheiro como um gesto simbólico e como forma de obter alguma influência com os europeus.

Espero sinceramente que haverá palavras duras dos outros membros do G20 para os europeus, para lhes dizer que não podem continuar atrapalhando as coisas assim. Já faz dois anos que eles tomam a direção errada a cada vez.

swissinfo.ch: A Suíça saiu bem da crise econômica de 2007-2008 em comparação com seus vizinhos europeus, mas apesar dos esforços para controlar o franco suíço, tem havido uma onda recente de perda de postos em empresas suíças como Credit Suisse, Novartis, Schindler e Kudelski. Como o senhor vê essa evolução?

CW: A Suíça está profundamente integrada na Europa, por isso, quando há problemas na Europa, a Suíça também tem que passar por algum tipo de dificuldade. As exportações estão sendo afetadas e algumas empresas podem decidir de se mudar. A Suíça não pode ficar esperando que a Europa caia em torno dela sem que isso lhe atinja.

swissinfo.ch: Alguns lobbies dizem que o Banco Central Suíço (BNS) deve elevar a taxa mínima de câmbio de 1,20 franco por euro para poder salvar postos de trabalho. Isso é realista?

CW: Os industriais estão claramente lutando por seus próprios interesses, que não são necessariamente os do resto da população.

O BNS fez uma aposta muito ousada que está funcionando, mas se a situação se deteriorar de verdade na Europa e houver uma explosão total do sistema financeiro europeu, o que é bem possível, a pressão sobre o franco suíço deve aumentar novamente.

Então, obviamente, quanto maior o nível, mais duro e mais difícil será para o BNS de manter a linha. Mas o câmbio de 1,20 ou 1,30 por euro não vai mudar a vida do BNS, ele só aumenta a ousadia do jogo.

Charles Wyplosz nasceu em 1947, é professor de economia internacional do Instituto de Pós-Graduação de Estudos Internacionais e Desenvolvimento, em Genebra, onde também é diretor do International Centre of Money and Banking Studies.

Anteriormente, atuou como diretor associado de pesquisa e desenvolvimento do INSEAD e diretor do programa de doutoramento em Economia na École des Hautes Etudes en Science Sociales, em Paris. É PhD em Economia pela Harvard University.

Consultor de várias autoridades e organizações: do presidente da Comissão Europeia José Manuel Barroso, do Parlamento Europeu, do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial, das Nações Unidas, do Banco Asiático de Desenvolvimento, do ministro da Fazenda da França e do governo da Federação Russa.

A reunião de cúpula sobre o euro chegou a um acordo, em 26 de outubro, de um conjunto de medidas destinadas a aliviar as tensões nos mercados financeiros, em especial as preocupações sobre a capacidade da Grécia de cobrir sua dívida.

Essas medidas incluem a redução da dívida pública grega de 120% do PIB do país até 2020.

Os credores privados também concordaram em levar um calote de 50% da dívida grega que possuem.

Os países membros da zona do euro vão investir até € 30 bilhões no pacote de envolvimento do setor privado.

Em cima disto, a UE e o Fundo Monetário Internacional vão financiar um novo programa plurianual para a Grécia, no valor de até € 100 bilhões.

Os recursos do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF) também devem ser aumentados no futuro. Em torno de € 1 trilhão estaria disponível para prevenir que a crise da dívida se espalhe ainda mais.

O EFSF tem atualmente uma capacidade de empréstimo de € 440 bilhões, dos quais  € 250 bilhões disponibilizados para Grécia, Irlanda e Portugal.

Adaptação: Fernando Hirschy

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