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“Sinto que nasci no Brasil por engano”

Para muitos imigrantes o aeroporto é a única saída para seus problemas. Keystone

O artigo "Sonho da volta ao Brasil pode se tornar pesadelo" (clicar na janela abaixo), da colaboradora Liliana Tinoco Baeckert, teve uma grande repercussão no site da swissinfo.ch. O tema do retorno à pátria, seus desafios e problemática, levanta uma questão fundamental a todos os migrantes, mesmo os que não são lusófonos. Mais de 35 mil leitores "curtiram" o texto no Facebook e 114 comentários foram publicados. Fizemos um resumo.

A maioria dos leitores que participou do debate no site da swissinfo ressaltou os problemas enfrentados hoje no Brasil como a criminalidade, o custo elevado de vida, os déficits no transporte, educação e saúde, dando-os como argumentos para não querer mais voltar a viver no Brasil. Uma leitura rápida dos 114 comentários dá uma impressão desse pessimismo generalizado.

“…Eu não sabia que o que eu sentia tinha nome: síndrome do retorno. Não tenho a menor expectativa de me curar disso, até porque a cura deve passar necessariamente por uma mudança brutal da situação do Brasil…”, escreveu o leitor Fabio Ottolini, que relatou ter retornado apenas por motivos profissionais. Nem os familiares entenderam. “E a matéria tem razão: nem mesmo os que me amam de maneira profunda conseguem me entender…”

Já Irami, uma brasileira residente na Itália, falou dos problemas da sua cidade natal. “…Moro na Itália há sete anos. Hoje sou separada e tenho uma filha de quatro anos. Tenho todas as dificuldades do mundo, mas apesar disso não penso em voltar ao Brasil. Morava em Maceió e quando li uma matéria onde indicava que ela é a quinta cidade mais violenta do mundo, tive somente a certeza de que voltarei somente em ultimo caso…”

Ana Paula, que retornou ao Brasil depois de passar um ano nos Estados Unidos, se arrependeu. Ela conta no seu depoimento que a residência familiar foi assaltada duas vezes e vê com desilusão o cenário político do país e o futuro profissional. Ao final, coloca a própria nacionalidade em questão. “Hoje sinto que nasci no Brasil por engano. Esse não é o meu lugar! Um dia voltarei à nação que tão bem me acolheu e oportunidades me deu, se Deus quiser!…”

Muitas vezes, o choque do retorno não se deve aos problemas de infraestrutura, mas sim de foro íntimo. “Morei na Espanha oito anos. Mesmo que essa não fosse a intenção, passei oito anos sonhando com o dia em que voltaria ao Brasil, voltaria a viver minha vida, aquela vida feliz que tinha deixado, cheia de amigos, familiares e momentos felizes. Faz cinco meses que voltei e se arrependimento matasse, já estaria morta há cinco meses. Aquela vida maravilhosa que eu guardava na memória já não existe. Sinto-me uma estranha no meu da minha família. Eles vivem de uma forma diferente e não querem mudar. Para eles tudo esta bom…”, relata Simone.

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Sonho da volta ao Brasil pode se tornar pesadelo

Este conteúdo foi publicado em Comuns a quem volta à terra natal, os sintomas acontecem simplesmente porque o estresse de se readaptar à antiga cultura pode ser, pela surpresa, pior que a dificuldade em se adaptar  a um país estrangeiro. Desavisado, o viajante é tomado de sentimentos como solidão, arrependimento, decepção e de não pertencimento àquela sociedade outrora tão conhecida.…

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Haiti e China melhores que Brasil

Mesmo países como a China parecem ser melhores do que o Brasil. “Em cinco anos, tempo que no Rio de Janeiro se leva para construir uma estação de metro, aqui na cidade construíram cinco linhas com quase 100 estações e continuam fazendo mais linhas e estações. Novos prédios surgem por toda parte”, conta Luiz Rotstein, que vive há três anos em Shenzhen, no sul da China.

Diana Lopes chega a declarar que a vida no Haiti era melhor. “Morei no Haiti dois anos e estou de volta ao Brasil há quatro meses. Foi muito difícil a adaptação…A quantidade de luz acessa nas ruas e casas, me chocou! A quantidade de agua que e desperdiçada me chocou! Andar na rua durante a noite, foi um desafio, pois no Haiti pela falta de energia as ruas são escuras e eu não podia sair a noite. Ir ao shopping era um terror. Ver a quantidade de comida desperdiçada. As reclamações, murmurações das pessoas com relação ao país ainda me assusta. A corrupção do Brasil e incomparável à corrupção no Haiti (sem querer comparar, apenas uma observação). Antes de completar um mês no Brasil desejei comprar a passagem de volta ao Haiti…Ficar com meus amigos e viver uma vida simples!…”

Críticas aos críticos do Brasil

Porém nem todos os leitores aceitam o pessimismo e veem o problema em outro lugar. Júnior Pansani, por exemplo, lembra que as condições de vida para brasileiros no exterior podem piores. “…Não entendo o que leva uma pessoa morar anos no exterior, falar tão mal do país de origem e acabar regressando. Sei que o Brasil não é um dos melhores países para se viver. Há muitos problemas, principalmente os sociais. Por outro lado, o país não está mais exigindo das pessoas somente curso superior e sim pós-graduações para competir com o mercado globalizado e multinacional. No entanto, viver em países de primeiro mundo com seus subempregos, claro que levará a uma profunda decepção e arrependimento na volta. Por fim, como li lá em cima – ‘quem ficou, não teve oportunidade de ter seus horizontes alargados’ – deveria escrever de outra maneira: quem ficou teve oportunidade de ter seus horizontes alargados com seus empregos, com suas pós-graduações enfrentando com isso o mercado multinacional e os problemas sociais…”

Para Landro, residente na Irlanda, as dificuldades de readaptação ao Brasil se explicam pelo nível de instrução. “Engraçado, eu não vejo ter essas crises de retorno com pessoas bem instruídas, estudadas e com bom trabalho no Brasil, mesmo morando fora há anos…Só vejo ter essas crises gente que trabalha em subemprego e que adora descer a lenha em tudo que seja referente ao Brasil e que voltam e ficam desocupadas em invés de procurar o que fazer. Lógico que é necessário um tempo de até três meses de adaptação como para qualquer lugar novo que você vá! E voltar muitas vezes para uma vida pior, ninguém quer, porque ainda vale a pena limpar privada fora do que no Brasil!…”

Os que estão felizes de voltar

A saudade da família foi um importante argumento para a leitora Lunes Ferras não se arrepender do retorno. “…Vivi um tempo na Europa e não tive problemas da síndrome do retorno porque sempre tive em mente que são duas realidades diferentes. Claro que a gente lembra-se das facilidades da vida na Europa, mas a presença da família no Brasil supera isso. Então é preciso ter em mente que não se pode comparar algumas coisas entre os dois países e infelizmente se acostumar com as coisas ruins que acontecem em nosso país…”

Foi o mesmo o que diz Afonso, um leitor que ainda vive em Portugal. “Apesar de estar há doze anos aqui e já ter ido cinco vezes de férias ao Brasil, mas olhar a minha mãe e meu pai e ver que estão ficando velhos, saber que a qualquer momento podem partir desse mundo, me fez tomar a decisão de querer retornar em um ano…”. Um ponto, no qual Lucas, residente no Japão, também concorda. “…Pessoas se prendem em outros países, pois tornam se escravos do dinheiro e do conforto que lhes é proporcionado. Porém a verdadeira felicidade é poder estar perto de seus amigos irmãos e parentes e como sinto falta de abraçar minha mãe e dizer o quanto a amo pois a um ano e meio só digo isso por telefone. A verdadeira felicidade está nas coisas simples da vida como, por exemplo, um almoço em família…”

A discriminação vivida por alguns imigrantes também é um forte razão para voltar. “…Morei na Suíça por seis anos e retornei em 2012. Não me arrependo em nada por ter voltado. Creio que isto talvez seja porque pertenço a uma família de classe média. Então o meu padrão de vida continuou o mesmo. Eu sentia muita discriminação na Suíça. Independente do seu salário, você sempre é tratado como estrangeiro por lá. Havia muita discriminação na escola com crianças de famílias não-Suíças. Eu não queria que a minha filha crescesse se sentindo uma cidadã inferior…”, reclama Fabiana.

No debate promovido pela swissinfo.ch, o leitor Itamar Olímpio aproveitou para anunciar a existência de uma comunidade online voltada ao tema.

http://www.retornei.com

Segundo Itamar, “o objetivo é oferecer suporte e apoio para esses brasileiros repatriados recém-chegados ou que estão planejando voltar”.

Dicas para retornar

Alguns dos participantes no debate dão dicas para ajudar outros brasileiros no seu processo de retorno. “Acredito que do mesmo jeito que nos preparamos para sair do nosso país, devemos nos preparar para o regresso, pois mudanças sempre vão ocorrer. Todo lugar tem seus prós e contras e não é diferente no estrangeiro. Mas ao sairmos para viver em outro lugar e cultura sempre vamos com os corações abertos e com mais paciência que de costume. Mas quando voltamos pra casa, bem, acontece exatamente o inverso. Talvez não nos primeiros dias ou meses, pois é como se fosse lua de mel, mas depois de passar a sua euforia e a dos seus amigos e familiares. Aí vem a intolerância…”, relativizou Paula Cristina, afirmando também que irá retornar de qualquer maneira ao Brasil depois do intercâmbio.

Para concluir, a psicóloga Andrea Sebben, citada no artigo, dá a sua receita. “…Trabalho na adaptação dos brasileiros no exterior e os estrangeiros aqui há 18 anos, assim como a readaptação da volta. Realmente esta ferida do retorno dói de qualquer forma: quando se esta lá, se idealiza o aqui. Quando se volta, se idealiza o lá. Assim é o coração humano: não ha logica de tempo nem espaço, mas o que se vive internamente. Minha sugestão é sempre viver o aqui e o agora como se fosse nossa última oportunidade. Caso contrário a gente vai viver entre o que foi e o que poderia ter sido…”

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