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Salão em Genebra confirma vitalidade do livro

Vista parcial do Salão do Livro 2007. J. Gabriel Barbosa

Contrariamente ao que se possa pensar, o setor do livro e do escrito em geral, com raras exceções, não enfrenta crise, diz Pierre-Marcel Favre, diretor do 'Salon du Livre' de Genebra.

A 21a. edição dessa badalada feira, que reúne centenas de editores, terminou neste domingo 6 de maio, mostrando que o chefe do ‘Salão’ está com a razão…

Livros em profusão: às centenas e centenas de milhares, apresentados por cerca de 500 expositores. Livros em maioria esmagadora de língua francesa, com razoável oferta de obras em inglês, limitada em alemão, discreta em outras línguas, tirando a do país convidado que procura trazer o essencial da produção própria destinada a um grande público. Desta vez a Rússia mereceu a honra (em 2002, foi o Brasil).

Todos os anos, em plena primavera (do hemisfério norte), o Salão do Livro e da Imprensa é um evento marcante na Suíça. Um dos acontecimentos culturais mais importantes do país, atraindo de 100 a 130 mil pessoas no espaço de cinco dias. Qual outro evento, lembra Favre, congrega tanta gente na Suíça em espaço de tempo tão curto ?

Esse evento desenvolve-se no mesmo local (Palexpo), onde 2 meses antes se realiza o Salão do Automóvel, outro acontecimento incontornável para milhares de pessoas, mas de significado inteiramente diverso. O Salão aglomera outras mostras simultâneas, sendo a mais importante a Europ’Art, exposição de arte contemporânea.

Uma gigantesca ‘biblioteca’

Para os carros a mostra ocorre em amplos estandes. Para os livros são estandes mais modestos, alinhados em ruelas batizadas com nomes de escritores famosos, constituindo-se uma espécie de vilarejo. Poderia chamar-se ‘livrolândia’. Parece uma gigantesca biblioteca pública, com a diferença que os livros estão à venda.

Não fosse o inevitável bruaá constante, maior ainda seria o prazer do visitante apreciador em percorrer essas ruelas, deslumbrado pela riqueza da oferta; prazer em pegar e folhear os títulos que lhe interessem e, eventualmente, os poder comprar com discernimento. Se tiver sorte, pode até receber um autógrafo do autor.

Nessa “brincadeira” quem vai ao Salão com esses intuitos, pode passar horas e horas. E visto o número de gente que acorre ao local, como diz Pierre-Marcel Favre, o leitor não é uma raça ameaçada de extinção.

Estabilidade da produção

A este propósito, o diretor do Salão é categórico: “O setor do escrito, contrariamente ao que alguns pensam, continua estável, não enfrenta crise. Nunca houve tantas revistas, tantos livros, tantos jornais. Pode ocorrer crises setoriais, como na publicidade. Mas o número de leitores se mantém”.

Favre, que tem a própria editora, lembra que a produção de livros “permanece a mesma e talvez até tenha aumentado”. Estima ainda que se a tiragem por vezes baixa, o faturamento não diminui, “nem o número de títulos”.

Para ele, a tese de que a imagem mataria o escrito é realmente coisa do passado: “O cinema não matou o teatro, a tv não matou o cinema e os novos meios eletrônicos não prejudicaram o setor do escrito. Ao contrário”.

Fenômeno da “best-sellerização”

Para o chefe do Salão também a asserção de que os jovens lêem cada vez menos não procede: eles freqüentam o Salão (em bandos, levados pelas escolas), a produção de livros infantis e juvenis continua importante e “nunca se venderam histórias em quadrinhos como agora”.

“Honestamente não há uma queda da leitura”, arremata Favre que admite porém, uma best-sellerização de livros (que, aliás, não é garantia de boa qualidade de uma obra), como existe o fenômeno people. Mas “em todos os domínios é assim” e cita o caso do segundo turno da eleição francesa, com o duelo Segolène x Sarkozy.

Fortelecido com esses argumentos, o diretor promete manter os ingredientes de um Salão que continua suscitando interesse desde 1986, quando foi criado: “Ter um programa atrativo, com grandes exposições – Fernand Léger este ano – com convidados de honra – a Rússia em 2007 – que apresenta um grande pavilhão, etc.”

Radzinsky e Cia.

É pela primeira vez que a Rússia participa, como convidada, da exposição genebrina. O país, onde a produção triplicou na última década, tem muito a mostrar a um público que geralmente conhece apenas os grandes mestres, como Dostoievsky, Tolstoi e Tchékov.

O interessante é que os autores contemporâneos, em particular os que escreveram nos últimos anos, têm a própria percepção do desmoronamento do comunismo e as recentes transformações sociais. Solicitada a apontar nomes proeminentes do momento, Nina Litvinec, responsável pelo estande russo, destacou Edouard Radzinsky, autor de obras de cunho histórico e político.

Estima que Tatiana Ustinova, autora de romances policiais e romances de amor merece destaque. Como o merece também Mikhail Chcichkine, residente na Suíça. Sua obra La Suisse et la Russie (A Suíça e a Rússia) lembra tradicionais laços existentes entre os dois países.

Laços que remontam a Dostoievsky e particularmente Lenine que viveu, com interrupções, 7 anos em solo suíço, onde preparou a revolução de 1917.

Note-se ainda a título de exemplo, o caso de Vladimir Nabokov que viveu com sua esposa de 1961 a 1977 em Montreux. O autor de Lolita e sua esposa e estão mesmo enterrados na região.

Um artista português

O Salão, por vezes acusado de evento “multipack”, tem consolidado eventos paralelos como o Salão Africano (presente pelo 4° ano consecutivo) e, particularmente, a Europ’Art, que já mencionamos.

Esta exposição em seu 16° ano de existência reuniu na atual edição 71 expositores com obras de mais de 400 artistas de 50 países. O mundo de língua portuguesa estava mal representado, em parte por causa dos elevados custos (só o aluguel do metro quadrado fica em torno de 500 francos – 300 euros, aproximadamente).

Tivemos, porém, a surpresa de encontrar um português, José Luís, da região de Sion, sudoeste suíço. Para o artista português, que já expôs em Marbella, Zurique e Barcelona, a Europ’Art é uma oportunidade para se tornar conhecido e reconhecido internacionalmente.

José Luis, que já teria criado um lugar ao sol através de uma “técnica nova” baseada em gesso, cola e resina. Uma vez que o quadro com a tela esteja estabilizado, realiza-se a pintura, “contemporânea”, inspirada em “ruínas, velhos teatros e arte romana”. (Não deixe de acessar seu site, ao lado).

Falta de originalidade

Uma das expositoras, Cyre de Toggenburg, cidadã suíça e francesa, residente em Charrin, na França, não expressou grande entusiasmo pela arte apresentada na Europ’Art. Ela acha que as obras são bem realizadas, mas carecem de “criativade, de originalidade em sua dimensão artística”.

A observação valeria para a arte contemporânea: “Acho que os artistas se questionam, se buscam, e em vez de desenvolver o próprio estilo, copiam uns aos outros, o que leva a uma homogeneidade na arte”. Isso nada teria a ver, p. ex., a poesia existente nos anos 50, pois “na época, quando um artista fazia uma descoberta, ele provocava emulação de colegas e conseqüente enriquecimento mútuo”…

Mas só vendo a exposição para se fazer uma idéia. O Salão do Livro de 2008 deve desenvolver-se de 29 de abril a 4 de maio. O convidado de honra, segundo Pierre-Marcel Favre, será “provavelmente” o Egito.

Swissinfo, J. Gabriel Barbosa, de Genebra.

Realizado de 2 a 6 de março 2007, numa superfície de 3.000 m2, o Salão do Livro e da Imprensa – que associa exposições paralelas – é um dos mais importantes eventos culturais da Suíça.

Se o Salão do Livro é a coluna vertebral da ocorrência, o acontecimento dá ensejo a mostras paralelas, como o Salão Africano do Livro, que se cristalizou recentemente, o Salão do Estudante, uma homenagem a um artista (Léger neste ano), uma exposição importante de pintura contemporânea (Europ’Art), entre outras coisas.

Não se pode esquecer ainda o “Village Alternatif”(vilarejo alternativo), uma vitrine para ONGs e associações, onde são abordadas questões primordiais relacionadas com meio ambiente, desenvolvimento sustentável, direitos humanos, desarmamento, comércio equitativo.

No item direitos humanos, Anistia Internacional, por exemplo, preparava petição denunciando o escândalo da prisão americana de Guantánamo. E uma associação tunisiana apontando as arbitrariedades da ditadura na Tunísia.

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