Só PF não é suficiente e Estado tem de estar mais presente na Terra Yanomami, diz diretor-geral
Por Ricardo Brito e Anthony Boadle
BRASÍLIA (Reuters) – O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou que todo o peso do Estado precisa estar presente no Território Indígena Yanomami para expulsar definitivamente os garimpeiros ilegais, ressaltando que apenas a presença da Polícia Federal não é suficiente, após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançar um novo plano para enfrentar uma crise humanitária na região.
Em uma reunião de emergência realizada na terça-feira com diversos ministros e autoridades, o governo Lula anunciou que gastará 1,2 bilhão de reais em esforços de segurança e assistência para o povo Yanomami, que vive na maior reserva indígena do Brasil, em Roraima, na fronteira com a Venezuela.
“Só a Polícia Federal não é suficiente… Não se consegue asfixiar (a criminalidade), por si só, com o trabalho da Polícia Federal”, disse Rodrigues, em entrevista exclusiva à Reuters horas após participar da reunião.
“Não só a União, mas (é importante que) municípios e o Estado possam entrar com serviços, com assistência à saúde, com assistência educacional, com meios de produção, com oferta de alternativas econômicas, enfim. É todo um processo que levará, aí sim, a volta à normalidade daquela região”, reforçou.
O diretor-geral destacou que, no encontro de terça, “ações estruturantes” foram discutidas para permitir que o Estado brasileiro, nos três níveis federativos, possam encontrar uma “solução definitiva” para que os povos indígenas possam ter o seu ambiente preservado.
O Território Yanomami, uma área do tamanho de Portugal, tem sido invadido por garimpeiros há décadas, mas as incursões mais destrutivas se multiplicaram nos últimos anos, especialmente depois que o então presidente Jair Bolsonaro desmantelou os esforços de proteção ambiental.
A mineração ilegal e o desmatamento exacerbaram uma crise humanitária no território, marcada por desnutrição e doenças como malária, além de abusos sexuais. Os rios foram poluídos e os peixes envenenados pelo mercúrio utilizado pelos garimpeiros, enquanto a fauna de que os yanomami dependem desapareceu.
PROTEÇÃO
O chefe da PF afirmou que as Forças Armadas devem estar presentes não apenas para proteger os cerca de 30.000 yanomami que vivem na reserva, mas também para fornecer apoio logístico com aeronaves em uma área de selva inacessível, onde as estradas são inexistentes.
Desde que Lula lançou uma força-tarefa para expulsar os garimpeiros no início do ano passado, a PF apreendeu mais de 600 milhões de reais em bens, principalmente ouro, realizou cerca de 160 prisões e destruiu dezenas de barcaças de dragagem usadas pelos garimpeiros nos rios, segundo ele.
Rodrigues afirmou que a força-tarefa expulsou 80% dos estimados 20.000 garimpeiros ilegais, mas outros resistiram em áreas remotas.
Lideranças yanomami afirmam que os garimpeiros ilegais estão começando a retornar após a saída do Exército de uma base avançada na reserva, e a crise humanitária continua, com o aumento de doenças e desnutrição entre seu povo.
Agentes do Ibama disseram à Reuters que foram deixados sozinhos para enfrentar os garimpeiros que voltaram, em uma guerra que consideram ser impossível de vencer sem o apoio das Forças Armadas. Eles afirmaram que a Força Aérea Brasileira (FAB) não aplicou efetivamente uma zona de exclusão aérea para os aviões dos garimpeiros que pousam em pistas clandestinas na selva.
Críticas à resposta do governo à crise levaram Lula a convocar ministros, agências ambientais e indígenas, comandantes militares e chefes de polícia para intensificar os esforços do Brasil contra os garimpeiros.
“É importante se dizer que o esforço é permanente, é contínuo. Não adianta nós fazermos uma ação pontual, retirarmos toda a estrutura de segurança de agências de lá e achar que o cenário vai permanecer inalterado”, disse Rodrigues.
“Infelizmente, o crime zero é um sonho, é um desejo, mas a gente tem que conviver sempre com o constante enfrentamento”, ressaltou.
O plano do governo inclui a criação de um quartel-general de segurança local para coordenar a ação das diferentes forças estaduais. Outras medidas incluem a distribuição de alimentos e um novo centro de saúde.