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“A Suíça deveria controlar mais suas multinacionais”

Nas minas da República Democrática do Congo muitas multinacionais são acusadas de violar os direitos humanos e ambientais. Reuters

As autoridades suíças devem se assegurar que as multinacionais baseadas no país respeitem os direitos humanos e ambientais em todo o planeta.

É o que exige uma campanha intitulada “Direito sem fronteiras”, lançada em conjunto por mais de 50 ONGs.

Responsável pelas questões de política comercial na Aliança Sul, grupo que abriga as principais organizações não governamentais na Suíça, Michel Egger revela os detalhes da campanha programada iniciada em três de novembro.

swissinfo.ch: Em que lógica política está sendo lançada essa campanha? 

Michel Egger: Essa iniciativa deve ser compreendida no contexto atual da globalização. Em escala internacional, o poder das multinacionais aumenta, enquanto que os meios de regulação que poderiam limitar essa tendência e garantir o respeito dos direitos humanos e ambientais não avançam com a mesma velocidade.

Existe um pacto global dentro das Nações Unidas sobre esse tema assim como iniciativas de autorregulação voluntária da parte de algumas empresas. Mas isso está longe de ser suficiente.

swissinfo.ch: E por que a Suíça? 

M. E. : A Suíça é o país que abriga a maior grande densidade do mundo de multinacionais por habitante. Inúmera delas violam os direitos humanos e ambientais nos países onde estão implantadas, principalmente através de suas filiais ou fornecedores. A legislação suíça não contém nenhum dispositivo que obrigaria essas multinacionais de responder pelos seus atos nos países em que atuam. Ela não oferece também a possibilidade para as vitimas de obter indenização e também de entrar com ações coletivas, sejam elas civis ou penais.

swissinfo.ch: O que reivindicam as ONGs com essa iniciativa? 

M. E. : É primordial que o Estado defina um contexto jurídico com obrigações claras às multinacionais. Para isso seria necessário eliminar a separação jurídica entre a casa matriz e as filiais. Alem disso, é necessário criar as bases legais para que cada pessoa sofrendo prejuízos pelas atividades das multinacionais possa ser indenizada. Atualmente a lei suíça não o permite. Pelo contrario, ela permite as casas-matrizes das multinacionais de não assumir suas responsabilidades.

swissinfo.ch: Como será desenvolvida a campanha “Direitos sem fronteiras”? 

M. E. : Nós temos dois objetivos. Na primeira fase trata-se de sensibilizar a opinião publica sobre essa problemática. Iremos apresentar casos concretos de empresas que violam os direitos humanos e ambientais nos países do Sul. Nós desejamos que a população, assim como os membros das organizações que apoiam a campanha, compreendam a gravidade da situação e constatem a falta de instrumentos, tanto jurídicos como políticos, à disposição para mudar.

Na segunda fase tentaremos convencer o Parlamento para que sejam aprovadas mudanças legais com o objetivo de mudar a atitude das multinacionais e permitir às vitimas de ter acesso à justiça. Isso implicará uma revisão do Código civil e penal. Em resumo, nós começaremos pela sensibilização para passar logo depois ao plano político e jurídico.

swissinfo.ch: A problemática não é recente. Para que lançar uma campanha dessa natureza nos dias de hoje? 

M. E. :  Podemos explicar pelo contexto internacional atual, mais favorável. Em 2005 uma iniciativa semelhante foi lançada em nível europeu. Pensamos que é importante que a Suíça e suas transnacionais não fiquem por fora desse debate.

De outro lado, um movimento internacional visando a regular – de maneira mais suave – as multinacionais foi iniciado dentro do contexto da ONU. A contribuição de John Ruggie, antigo representante especial para as questões de direitos humanos, das sociedades transnacionais e outras empresas é essencial nesse sentido.

John Ruggie definiu um quadro de referencia baseado em três pilares conceituais: a obrigação para os governos de proteger as populações contras as violações dos direitos humanos por terceiros – o que inclui as multinacionais – a responsabilidade destas de respeitar os direitos humanos e, finalmente, o direito das vitimas de serem indenizadas através do acesso à Justiça.

A campanha que estamos lançando ocorre nesse contexto. Ela exige que a Suíça leve a sério suas obrigações. Nosso país, berço dos direitos humanos e sede de inúmeras organizações internacionais, pode e deve ter um papel de pioneira.

swissinfo.ch: Não seria uma declaração de guerra da parte das ONGs contra as empresas privadas, enquanto que um dos princípios da cooperação suíça é de promover a colaboração entre o setor publico e privado? 

M. E. : Não vemos essa campanha como uma declaração de guerra. Mas é certo dizer que a cooperação suíça ao desenvolvimento seja muito permissiva com o setor privado. Inúmeras ONGs suíças têm um olhar crítico nesse ponto. Para nós, a primeira contribuição do setor privado ao desenvolvimento consiste em respeitar e promover os direitos humanos e a proteção ao meio-ambiente.

É essencial que o nosso governo assuma posições mais criticas e seja mais exigente com as multinacionais suíças. Igualmente é necessário que os autores da política exterior do nosso país, o que inclui a Secretaria de Estado para Economia (SECO), o Ministério das Relações Exteriores e também a Direção para o Desenvolvimento e Cooperação (DDC), elaborem uma estratégia mais coerente.

Mais de 50 ONGs lançaram em três de novembro em Berna a campanha “Direitos sem fronteiras”. Elas pedem que a Suíça adote medidas para que as multinacionais suíças respeitem os direitos humanos e ambientais nos países do Sul.

Dentre os iniciantes estão as seguintes ONGs: Aliança do Sul, Anistia Internacional, Helvetas,

Ação de Quaresma, Greenpeace, Terra dos Homens, E-changer, Declaração de Berna, Pão pelo Próximo e Solidar. A campanha deve contar com o apoio do sindicato Unia e a organização de agricultores Uniterre.

Adaptação: Alexander Thoele

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