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“Ninguém pode integrar outra pessoa”

Encontro discutiu integração e emancipação

Após 15 anos de formação de grupos e a realização de quatro encontros nacionais, o Conselho Brasileiro na Suíça (CBS) é oficializado em Berna.

O “batismo de fogo” do conselho, o primeiro do gênero entre tupiniquins espalhados pelo mundo, foi o IV Encontro Brasileiro na Suíça, que reuniu mais de 350 pessoas na capital suíça.

Balões verdes e amarelos marcavam, na manhã deste sábado (31/10), um caminho para pedestres entre o ponto de ônibus Längasse e o Ginásio Neufeld, no norte de Berna, local do IV Encontro Brasileiro na Suíça.

Assim como as cores do Brasil harmonizavam com a folhagem colorida do outono europeu, também os brasileiros parecem se encaixar na multiétnica sociedade suíça. Pelo menos é o que pensa a embaixadora em Berna, Maria Stela Pompeu Frota. “É uma comunidade bem integrada, tranquila, que não cria problemas”, diz à swissinfo.ch.

Segundo o diretor do Departamento de Integração do Cantão de Berna, Roland Beeri, “os latinamericanos estão organizados em associações por país de origem. E isso é uma importante base para a integração”. A situação específica dos brasileiros ele diz não conhecer muito.

Embora esteja apenas dez meses em Zurique, a cônsul Vitória Cleaver, responsável por 20 dos 26 cantões suíços, conta que o consulado também é procurado por brasileiros com “problemas que derivam de sua inserção na Suíça. Há muitas brigas entre marido e mulher porque casamentos biculturais têm seus problemas”, diz.

A absoluta maioria dos imigrantes brasileiros na Suíça (quase 60 mil, segundo a embaixada) é de mulheres. Elas aparecem em segundo lugar na preferência dos suíços que casam com estrangeiras (veja link).

Às vezes, a migração, seja ela por razões amorosas, profissionais ou outras, pode ser “quase um processo traumático”, afirma Flávia Reginato, que chegou à Suíça em 1990, “quando a comunidade brasileira quase não existia e telefonar para o Brasil custava cinco dólares por minuto. Tive de criar uma nova rede de contatos”.

Formada em Comunicação Social no Brasil, Reginato trabalha em Zurique como tradutora intercultural, uma nova profissão voltada para as imigrantes, que acaba de ser regulamentada pelo governo suíço.

Ajuda estatal e autoajuda

“O Estado espera que os imigrantes deem sua contribuição, mas também dá apoio, por exemplo, financiando cursos de línguas e atividades interculturais – no cantão de Berna desde 2001”, diz Roland Beeri.

Na Suíça, com 21,5% da população formada por imigrantes, o governo reconhece o ensino da Língua e Cultura Materna como parte integrante do ensino local. Cada nacionalidade decide como organizar seus cursos e as escolas suíças disponibilizam salas de aula.

E não é só isso. O cantão de Zurique, por exemplo, investe em mais de 60 pequenos projetos de integração para estrangeiros, desde assistência jurídica até rádios via internet e cursos de idioma. Custo: 1,7 milhão de francos por ano aos cofres estaduais e 2,5 milhões de francos do governo federal. Outros cantões têm programas semelhantes.

Em princípio, ninguém duvida da utilidade da integração. O problema é que nem todos os imigrantes aproveitam as chances oferecidas. Por isso, o Conselho Brasileiro na Suíça se propôs analisar a questão da integração do ponto de vista pessoal no encontro de Berna.

“Ninguém pode integrar outra pessoa, pois os caminhos de cada migrante são diferentes. Todos têm uma forma individual de encarar e enfrentar os problemas, buscando soluções”, dizia o texto do convite.

Uma bela adormecida

Um exemplo foi citado por Flávia Reginato, ao falar sobre “a importância de tomar o destino nas mãos”. Segundo ela, “a mulher brasileira, em muitos aspectos, é bastante emancipada no Brasil, só que, às vezes, se esquece disso quando vem para a Suíça. Torna-se uma bela adormecida.” Ela deveria reativar esse seu potencial e valorizar sua independência, acrescentou.

A intenção do encontro, com o lema “Integração e Emancipação: assumindo seu próprio caminho”, foi acordar os imigrantes de sua passividade. “Em outras palavras: fazer parte da comunidade envolvente e ter autonomia para tomar decisões sobre sua própria vida, sem depender de outros.”

Segundo Irene Zwetsch, o brasileiro está um pouco acostumado a ter as coisas prontas, “a esperar que o papai e a mamãe façam tudo. É o papai governo que vai me dar qualquer coisa. As pessoas têm que aprender que elas têm de fazer alguma coisa por si mesmas.”

A ideia do Conselho, segundo ela, é dar apoio aos imigrantes e aos grupos que eles formam no país, promover o intercâmbio entre eles e a sociedade suíça. Além disso, servir de referência e informação para os brasileiros na Suíça (consultoria e banco de dados) e atuar junto aos órgãos oficiais suíços e brasileiros.

Em grande parte, esse trabalho já vem sendo feito há muitos anos pelos grupos e pelas lideranças que agora formam o CBS. “O conselho é formado por pessoas extremamente engajadas na comunidade, com braços nos diferentes cantões, têm muito bom trânsito junto às autoridades locais e está bem atento à problemática da comunidade. Elas trabalham bastante no sentido de sensibilizar a comunidade para a necessidade de integração”, atesta a cônsul Vitória Cleaver.

“O conselho tem um amplo conhecimento de como funciona a sociedade suíça e procura agora servir de ponte para as pessoas poderem chegar àquilo de que precisam”, explica Irene Zwetsch. Algumas “gavetas cheias de informação” foram abertas pelos coordenadores dos 14 “grupos de interesse”, que discutiram questões práticas da integração no sábado à tarde, no Ginásio Neufeld.

O advogado Pedro da Silva Neves, de Genebra, explicou as mudanças da lei dos estrangeiros, em vigor desde 1° de janeiro de 2008. “Por exemplo, a violação dessa lei, que antes era tratada como contravenção, agora virou crime, que pode ser punido até com prisão” (ouça o áudio à direita).

Atuação internacional

O CBS, porém, não restringe sua atuação ao plano nacional. Zwetsch o representa na Rede de Brasileiros e Brasileiras na Europa, um grupo que discute as especificidades das comunidades brasileiras em cada país e encaminha os pontos em comum ao governo brasileiro.

A Suíça tem a sétima maior comunidade brasileira na Europa, atrás do Reino Unido, Portugal, Espanha, Alemanha, Itália e França (veja tabela na coluna à direita) e enviou dois representantes à II Conferência “Brasileiros no Mundo”, realizada de 16 a 18 de outubro passado, no Rio de Janeiro.

Segundo Regina Jomini, de Etoy (cantão de Vaud), que participou do encontro, foram marcadas para a segunda quinzena de maio, as eleições para o Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior (CRBE). As atas da conferência estão disponíveis no site www.brasileirosnomundo.mre.gov.br.

O CRBE será integrado por 16 membros: 4 da América do Norte e do Caribe; 4 da América do Sul e Central; 4 da Europa; 4 da Ásia, África, Oriente Médio e Oceania. Para participar das eleições é preciso se cadastrar nos consulados (ouça áudio de Jomini na coluna à direita).

Fim do Estado do Emigrante

No Rio de Janeiro, Jomini participou também dos debates sobre a representação política dos brasileiros no exterior. “A ideia do Estado do Emigrante (lançada pelo jornalista Rui Martins – Suíça) não vingou na conferência”, disse à swissinfo.ch.

Continua em discussão, segundo Jomini, a proposta do senador Cristóvan Buarque de criar cadeiras no Congresso Nacional para os emigrantes. “Nós das associações brasileiras no exterior achamos que isso não é necessário e só irá onerar ainda mais o contribuinte. Queremos apenas o direito de votar em parlamentares federais interessados nas questões dos emigrantes”, disse.

Por mais que os governos em Brasília e Berna e entidades como o CBS procurem melhorar a situação dos brasileiros na Suíça, isso não deve criar a ilusão de que emigrar para este país – bem como para a Europa em geral – se tornou mais fácil.

O ingresso da Suíça no Espaço Schengen e sua nova lei de imigração estreitaram a porta de entrada para não-europeus . Por isso, segundo a cônsul Vitória Cleaver, o brasileiro que sonha em emigrar para o país alpino “deve pensar bem e só vir legalmente”. Aventureiros podem se dar mal.

Geraldo Hoffmann, swissinfo.ch

Elcídia Barbosa Bolinger (CIBRA, Solothurn)

Irene Zwetsch (CIGA-Brasil, Basileia)

Magnolia Vigni (Raízes, Genebra)

Maria Rolim Janotta (Equilíbrio, Turgóvia)

Nilce Cunha (CEBRAC, Zurique)

Ocirema Kukleta (Zurique)

Patrícia Brooking Negrão (Equilíbrio, Turgóvia)

Regina Jomini (Etoy, Vaud)

Rosimary Stöckli (Atitude, Berna)

Sandra Suely Rodrigues Urech (Coral Canta Brasil, Argóvia)

América do Norte: 1.325.100
Europa: 816.257
América do Sul: 513.800
Ásia: 289.557
África: 36.852
Oriente Médio: 31.890
América Central: 5.037
Oceania: 22.500

Total: 3.040.993

Fonte: MRE, 09/2009

Reino Unido: 180.000
Portugal: 137.600
Espanha: 125.000
Alemanha: 89.000
Itália: 70.000
França: 60.000
Suíça: 57.500
Bélgica: 42.000
Holanda: 17.600
Irlanda: 15.000
Grécia: 5.100
Suécia: 5.000
Noruega: 4.100
Áustria: 3.000
Dinamarca: 3.000
Finlândia: 508
Rússia: 400
Rep. Tcheca: 347
Polônia: 336
Hungria: 230
Croácia: 170
Romênia: 110
Ucrânia: 80
Bulgária: 70
Sérvia: 60
Eslovênia: 32
Vaticano: 14

Total: 816.257

Fonte: MRE, 09/2009

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