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Boxe feminino: uma luta pela igualdade

Frau von Ende 19. Jahrhundert in Boxkleidung
A senhorita Sanderson foi esposa de Pierre Vigny, que dirigiu, a partir da década de 1890, uma escola de artes marciais em Genebra. Em uma aparição publicitária da escola de Vigny em 1908 sobre o tema da autodefesa, ela é chamada de “campeã de boxe”. Como tal, ela é provavelmente uma das primeiras e, na época, poucas pugilistas na Suíça. The Bartitsu Society

Foi por volta de 1880 que algumas mulheres na Suíça pegaram suas luvas de boxe e entraram em um ringue pela primeira vez. Menosprezadas inicialmente como personagens para espetáculos de circo, as mulheres tiveram de lutar até aos anos 90 para finalmente poderem participar de lutas reais e competir no esporte.

Em todo o mundo, pode encontrar-se uma grande variedade de culturas em que a luta de punhos é praticada como esporte, arte ou autodefesa. Provavelmente o tipo mais conhecido e mais difundido de luta de socos é o boxe moderno, que tem suas raízes na Inglaterra e foi aí praticado pela primeira vez com regras que ainda hoje são geralmente válidas.

É verdade que o boxe ainda é considerado um esporte masculino, um domínio de homens, violento e, dependendo da perspectiva de cada um, pode ser visto como brutal. Mas, historicamente, o gênero feminino também se distinguiu no boxe. Desde os tempos antigos, o pugilismo também tem sido comum entre as mulheres. No entanto, tal aspecto ainda é pouco estudado e permanece mal compreendido. E é, portanto, o empenho das mulheres suíças para conquistar um lugar no boxe, no sentido mais verdadeiro da palavra, que deve ser mostrado a seguir:

SWI swissinfo.ch publica regularmente artigos do blogLink externo do Museu Nacional Suíço sobre temas históricos. Estes artigos estão sempre disponíveis em alemão e geralmente também em francês e inglês. Este post no blog é baseado nos primeiros resultados de pesquisa da tese de mestrado de Sven Gautschi intitulada “Mulheres e ‘A arte masculina’ na Suíça. Uma primeira análise sobre o boxe e sua difícil relação com a população femininaLink externo“.

As primeiras referências concretas ao boxe feminino na Suíça datam de cerca de 1880. Louis Brun, um professor de ginástica e esgrima de Lausanne, e seu sogro C. Reynold ofereciam treinamento de boxe em grandes salões. No entanto, estas foram dificilmente sessões de treino para o boxe competitivo, mas para performances de natureza artística baseadas em técnicas de ginástica, esgrima e autodefesa.

De acordo com os chamados papéis de gênero “naturais” da época, mas fundamentados em teorias pseudocientíficas, as mulheres deveriam cuidar de sua saúde física com a ajuda de ginásticas “suaves” (o que significava principalmente a capacidade de gerar filhos a serviço da nação) e ser educadas para se tornarem “moças graciosas e elegantes”.

Em conformidade com essa lógica biológica, os homens também deveriam praticar esportes tendo em conta sua saúde, a fim de poder transmitir “genes valiosos”. Para os homens, os cuidados preventivos de saúde eram conotados com força e combate, capacitando-os a assegurar a “sobrevivência do povo” como cidadãos e soldados. Assim, as artes marciais como o boxe receberam o predicado “masculino”, enquanto as mulheres que se aventuravam no boxe colocariam em risco a própria “beleza”.

Bescheinigung für einen Kurs
Certificado de participação de um curso de Louis Brun em 1905. Archives cantonales vaudoises

Até 1910, novas academias de boxe destinadas ao público feminino foram fundadas na Suíça francófona. No entanto, elas representavam um fenômeno marginal no mundo do esporte e ginástica suíços. As primeiras pugilistas eram, portanto, muitas vezes as esposas ou filhas dos treinadores de boxe. A partir daí, as academias concentraram-se conspicuamente na ginástica e na dança.

Por conseguinte, o boxe especificamente feminino foi insidiosamente cortado pela raiz no instante de seu surgimento. Não é possível determinar claramente por que isso aconteceu, mas alguns desenvolvimentos paralelos podem indicar por que razão o boxe feminino foi suplantado.

A fundação da Federação Suíça de Boxe (FSB) em 1912 desempenhou um papel importante na definição do que se entendia por boxe na Suíça: uma arte marcial regida pelas regras do modelo inglês e reservada exclusivamente aos homens. Além dos habituais estereótipos de gênero acima mencionados, a FSB foi igualmente orientada por alguns desenvolvimentos nacionais e internacionais.

O componente internacional foi fornecido pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), que também só incluiu o boxe masculino em seu programa, enquanto os impulsos em nível nacional vieram de instituições estatais, a saber, a decisão do exército e da polícia de introduzir o boxe em seus programas de treinamento.

Todos esses desenvolvimentos convergiram para fomentar e reforçar a concepção masculina do boxe; a qual só via consequências econômicas e sociais negativas na propagação do boxe feminino.

Zwei Frauen aus dem späten 19. Jahrhundert beim Boxen
Também nos EUA, o boxe feminino era principalmente, a princípio, um espetáculo. Tal como as irmãs Gordon, as irmãs Bennett lutavam em apresentações circenses para divertir o público. Library of Congress

Boxe feminino, um agradável divertimento

A partir de então, as mulheres só apareciam em ligação com o boxe na esfera não esportiva: como metáforas para viragos, como espectadoras emocionadas e chocadas com a dureza da luta masculina, e principalmente como parte importante de circos e shows de variedades, nos quais se encenavam regularmente lutas de boxe.

Uma pitada de erotismo e burlesco destinavam-se a atrair uma maioria de espectadores masculinos. Esses tipos de shows eram sobretudo entretenimento que cimentavam ainda mais os papéis de gênero estabelecidos. Essa percepção é reforçada a partir de 1950 em Estocolmo, quando o boxe feminino passa a fazer parte dos concursos de beleza.

Mais tarde, o boxe nu também foi introduzido, não para retomar antigos ideais, mas sim – como tantas vezes no boxe – para encontrar novas fontes de dinheiro. O clamor coletivo foi certamente grande, mas de curta duração.

Eine Tanzgruppe beim Boxunterricht
Um grupo de mulheres inglesas recebendo aulas de box em 1929. Keystone / Imagno

Luta pela igualdade de direitos

Além disso, houve proibições oficiais que dificultaram a prática do pugilismo por parte das mulheres. O boxe feminino de competição não foi permitido pela FSB até a década de 1990, embora tenha lentamente ganho ímpeto na arena esportiva após a introdução do sufrágio feminino em 1971 e do artigo sobre a promoção esportiva na Constituição Federal em 1972.

As preocupações (principalmente masculinas) de que este esporte era demasiado brutal e inadequado para as mulheres competirem persistiram por um tempo surpreendentemente longo. No entanto, cresceu a percepção, como em outros esportes, de que o boxe é benéfico para a saúde, o condicionamento físico ou a autodefesa. Tendo isso em mente, o clube de boxe de Basileia foi o primeiro, em 1992, a introduzir treinos de boxe e o boxe como exercícios físicos para mulheres.

Conteúdo externo

O ano de 1996 pode ser considerado um ponto de viragem. Foi nesse ano que Christina Nigg, a atual e primeira presidente da Swiss Boxing (antiga FSB), entrou no ringue como boxeadora amadora. Devido à regulamentação internacional, a Federação Suíça de Boxe teve de lhe emitir, embora com relutância, uma licença de amadora.

O objetivo de Nigg era também o de obter uma licença profissional, mas a Federação recusou. Ela foi então para o exterior, obtendo licenças na Alemanha e nos Estados Unidos. Em 1999, após uma longa luta contra o preconceito e pela causa do boxe feminino, Nigg tornou-se a primeira mulher na Suíça a receber uma licença profissional.

Isso só depois de ela obter o título de campeã mundial em 1998. Nigg ainda faz campanha pela igualdade de gênero no boxe, já não com os punhos, mas com bons argumentos contra falsas opiniões de que, por exemplo, o boxe causa câncer de mama ou outros riscos de natureza médica.

A imagem das boxeadoras na Suíça mudou assim em um espaço de tempo relativamente curto. No início do século 20, o boxe feminino quase se impôs, em particular, na região de Genebra; mas sua evolução foi interrompida.

Ela passou de lutas clandestinas, circenses ou tingidas de erotismo reprovável para uma disciplina esportiva reconhecida – uma vitória árdua e obtida graças a lutadoras solitárias como Christina Nigg ou Anyia Seki. Como muitas coisas na Suíça, esse processo levou comparativamente mais tempo do que em outros lugares, e ainda é preciso avanços: as desigualdades nas receitas publicitárias, as oportunidades de treinamento e as disparidades salariais entre homens e mulheres ainda estão longe de terminar.

Adaptação: Karleno Bocarro

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