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“Blatter caiu de podre”

Para os jornais, Blatter deixa um trono "podre e fedorento"... AFP

A demissão surpresa de Joseph Blatter na terça-feira, "o intocável chefão" da Federação Internacional de Futebol, é uma "boa notícia" para o futebol, comemora a imprensa mundial nesta quarta-feira, 3 de junho. Para os jornais suíços, brasileiros e portugueses, fica a esperança de que a Fifa recupere sua "honra perdida".

Para o jornal La Liberté, “O Kim Jong-un da FIFA finalmente abdicou. Uma ideia estranha que não chegou a atravessar as mentes de outras pessoas importantes dedicadas à causa do futebol”, anuncia o editorial do jornal de Friburgo, que dá nome aos bois – ou vacas sagradas – da bola.

Assim, continuam em seus postos os diretores da Adidas, Coca-Cola, McDonald’s, Budweiser, Continental, Castrol e outros principais patrocinadores comerciais da FIFA, que investiram dezenas de milhões e ganharam mais ainda patrocinando as últimas edições da Copa do Mundo, “cujas atribuição e organização eram decididas por subornos”, diz o jornal, que cita ainda o grupo Vinci, uma das construtoras envolvidas nas controversas obras no Catar, além dos mandachuvas da televisão, “que pagam fortunas para transmitir os jogos da Copa do Mundo e raramente se decepcionam com as receitas de publicidade e audiência alcançadas com o principal campeonato da FIFA”.

Já o jornal Le Temps, da Suíça francesa, acha que “Sepp Blatter finalmente percebeu que ele não teria tamanho para enfrentar a justiça americana e suas investigações sobre o sistema de corrupção que infectou até a cabeça da organização.”

Por sua vez, o analista do jornal Tribune de Genève considera que a saída de Blatter deixa um imenso vazio, atrás dele ficaria “um campo de ruínas, uma federação em decomposição, um sistema pernicioso, duas Copas do Mundo controversas e uma sucessão ainda a ser decidida. Um vácuo cheio de interrogações”.

Mas o jornal de Genebra termina com uma nota de esperança: “felizmente a próxima Copa do Mundo Feminina, sem batota e sem dinheiro, vai nos reconciliar com o futebol”.

Surpresa ingênua

O tabloide Blick se mostra surpreso no seu comentário. “Quer dizer que ele parte? Então cometeu algum erro? Existe algo que o incrimine? Ou a reeleição na última semana já é suficiente para ele como um legado? Ou foram razões privadas? Ainda no congresso no pavilhão em Zurique-Oerlikon, Blatter insistiu ao declarar que pretendia liberar o futebol da má reputação trazida pela corrupção, como presidente. Agora na sua despedida de ontem, ele soava diferente, amargurado, quebrado…”

O editor de esporte do jornal de Zurique Tagesanzeiger também ressaltou as dúvidas que pairam na sua demissão. “Por que ele tomou essa decisão repentina depois de, por tanto tempo, ter dito que não queria saber de uma retirada? Depois de tanto dizer que não era a sua culpa o fato de haverem tantos funcionários corruptos na Fifa? Suas razões (ainda) são desconhecidas.”

Ueli Kägi ainda levanta hipóteses. “Talvez o alegado suborno de 10 milhões de dólares, orquestrado pelo seu funcionário mais próximo, Jérôme Valcke, que no passado sempre chamou atenção pelo comportamento questionável? Estaria Blatter, um homem obcecado pelo poder, percebendo a chegada de uma onda capaz de varrê-lo? Alguma coisa deve ter acontecido desde a última sexta-feira. Alguma coisa…”

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A vida colorida de Sepp Blatter

Este conteúdo foi publicado em Em 17 anos de carreira, o suíço nunca perdeu uma oportunidade para posar, seja em trajes típicos de um país em que visitava, ou para mostrar a uma freira como chutar a bola. Qualquer que seja seu sucessor (a próxima eleição, provavelmente não ocorrerá até dezembro), ele terá que trabalhar duro para gerar tantas imagens…

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Porém o comentarista do Tagesanzeiger ressalta que a demissão do presidente da Fifa não significa que os problemas estão resolvidos. “Blatter teria sido o homem errado para liderar a Fifa em direção ao futuro. Afinal, seu nome ficou por muito tempo carregado. Agora o homem de 79 anos vai, mas o sistema continua o mesmo. Alguns funcionários de reputação duvidosa continuam”, escreve e dá os nomes. “Um deles, por exemplo, é Issa Hayatou, vice-presidente e assim, o segundo homem mais importante da Fifa.”

O Basler Zeitung, jornal diário da Basileia, aventa a hipótese de uma estratégia por trás da decisão do suíço. “É possível que Blatter tenha reconhecido há uma semana que o seu tempo passou. Todavia, por que ele não desistiu da sua reeleição? Talvez por estar consciente de que o único candidato restante, o apagado príncipe Ali bin-al Hussein, da Jordânia, um país em desenvolvimento na área do futebol, nunca e de forma nenhuma teria o formato para se tornar presidente da Fifa. E também não teria a força para executar as reformas necessárias da organização”, escreve o redator-chefe Peter Jost, concluindo com um elogio ao suíço. “Uma história surreal? Pode ser, mas Joseph Blatter, esse estrategista astuto, esse amigo apaixonado do futebol, seja capaz dessa jogada de mestre.”

A missão de Blatter

Para o NZZ, o jornal suíço de maior renome no exterior, o presidente da Fifa desiste do cargo em um momento em que ainda tinha muito a realizar. “Na verdade, Blatter queria ‘cumprir uma missão’. Tratava-se de concluir um processo de reformas iniciado em 2011 pelo jurista Mark Pieth. Trinta e sete das quarenta reformas já haviam sido introduzidas, pelo menos institucionalmente”, escreve o comentarista Elmar Wagner. Todavia, as três restantes seriam de grande importância. “Os limites de duração do mandato e também limites de idades para os funcionários da Fifa, além da transparência na remuneração dos funcionários.”

O NZZ considera que o suíço poderá concentrar seus esforços até sair definitivamente na última reforma. “Blatter poderá concentrar-se no seu último desejo sem se preocupar com a reeleição. Talvez ele até consiga até fazê-lo trazendo a Uefa, como oponente, para o seu barco”. E por que ele o faria? “Esse seria o seu legado positivo, uma forma de obra-prima. Nós poderíamos esperar isso dele, alguém que sempre soube consolidar a sua longa carreira, mesmo com constantes mudanças de coalizões de poder.”

O jornal gratuito 20 Minuten, o de maior circulação na Suíça, questiona se a ação repentina do presidente da organização será uma verdadeira reviravolta. “É claro que, com sua surpreendente demissão, Blatter está tentando evitar danos maiores para a sua querida Fifa. Porém ainda não se sabe se é tarde demais para isso.”

Fruta podre

Em Portugal, A Bola estampa em manchete “Joseph Blatter demite-se e convoca congresso extraordinário”. O jornal precisa que Blatter é investigado por procuradores norte-americanos e FBI.

O Público é mais enfático com a manchete “O dia que Joseph Blatter caiu de podre”. Afirma ainda que “é o fim anunciado de uma era na Fifa. O suíço de 79 anos será o foco das autoridades norte-americanas na investigação à corrupção no organismo”.

No artigo precisa-se que “A saída do suíço de 79 anos não será imediata. Uma vez que o presidente da FIFA é eleito pelo congresso da organização e a próxima reunião ordinária está marcada para 13 de maio de 2016, Blatter convocou um congresso eleitoral extraordinário para evitar o “atraso desnecessário”. “Vou instar o comité executivo a organizar o mais rapidamente possível o congresso extraordinário para a eleição do meu sucessor. Isto terá de ser feito de acordo com os estatutos da FIFA e deverá dar tempo a que os melhores candidatos se apresentem e façam campanha”, sublinhou.

E conclui: “Aquilo que até há pouco tempo era difícil de imaginar está mais perto de tornar-se realidade: Blatter, o tragicómico homem-FIFA, vai ceder o trono do futebol mundial. O processo de limpeza e reconstrução será longo, mas poderá finalmente começar.

Mau cheiro

No Brasil, todos os sites dos grandes jornais estão repletos de manchetes e análises. O site Esporte Fino, por exemplo, estampa a manchete “Let’s go, Fifa! E Blatter se foi”. No artigo, Bruno Winckler escreve: “Quatro dias depois de gritar com um sorriso amarelado “Let’s go, Fifa! Let’s go, Fifa!” ao ser reeleito para seu quinto mandato, Joseph Blatter renunciou à presidência da entidade que dirige desde 1998. Ele se vai com uma reputação em frangalhos, mas fica no cargo até que um congresso extraordinário seja convocado para nova eleição de um sucessor. O 2 de junho de 2015 é histórico, ainda que o futuro da Fifa sem os dirigentes que saquearam o futebol mundial seja uma incógnita”.

A Folha de São Paulo traz várias manchetes, entre elas a do artigo de Clóvis Rossi: “O bode se retira, mas o mau cheiro permanece dentro da Fifa”. Em outro artigo, o jornal afirma que “Saída de Blatter torna cenário imprevisível”, mas já aposta em um sucesso na Fifa: “Como bom vinho francês, Platini resiste ao tempo e ganha força”.

Para o Estado de São Paulo, entre outras manchetes, “Blatter renuncia antes de virar réu”. O Globo cita o New York Times e a ABC News, com a manchete “FBI e procuradores dos EUA investigam Joseph Blatter”. O jornal também destaca que “Zico pensa em concorrer à presidência da Fifa”.

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