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Supermercado suíço introduz produtos da grife “Slow Food”

O queijo inglês "Cheddar" é uma das especialidades regionais que entram na oferta da Coop (foto: Coop)

Slow Food, associação criada em 1989 na Itália para combater a "má alimentação", se une à segunda maior rede suíça de supermercados para vender produtos raros e ameaçados.

Dentre eles um pomodoro fabricado com tomates-cereja que crescem no Vesúvio, parmesão feito com queijo de vaca da raça “Rossa Reggiana” ou até sal das duas últimas salinas italianas.

Para alguns gastrônomos europeus, o melhor presunto do mundo vem de Emilie-Romagne, uma região agrícola localizada no norte da Itália. O animal que cede a carne para a fabricação dessa especialidade é o Mora Romagnola, um porco rústico e coberto de pelos negros, muito adaptado para a criação ao ar livre.

Como seu crescimento é muito lento do que as raças comuns como o “large white” e a sua carne mais gordurosa, o Mora Romagnola é considerado inapropriado para a criação industrial. Em 1997 as autoridades sanitárias contavam apenas uma dúzia de animais ainda sendo criados em uma pequena fazenda italiana. A raça era considerada quase “extinta”.

O detalhe é que a carne desse pequeno porco, muito mais próximo do javali do que das espécies domésticas, é ideal para se fazer salame, copa, presunto cru e outras especialidades italianas, depois de preparadas no inverno e colocadas para maturar em porões arejados.

Depois de ter desaparecido, os produtos do Mora Romagnola voltam agora às prateleiras na Suíça graças à rede de supermercado Coop, que decidiu introduzir a linha de produtos patrocinada pela Slow Food, o movimento autodenominado de defesa da boa alimentação criado na Itália em 1986 e que conta hoje com 80 mil integrantes, espalhados em 50 países.

Redescoberta

“A diferença dos nossos produtos e dos industrializados é que eles têm uma história para contar”, diz orgulhoso Giuseppe Domeniconi.

Depois de caminhar alguns metros por uma grande filial da Coop em Zurique, o corpulento engenheiro e membro da direção da Slow Food na Suíça, encontra o pequeno estande onde estão expostas duas dezenas de produtos “slow foodianos”.

O estande é parte de uma campanha de promoção da segunda maior rede suíça de supermercados. Em maio de 2006 a Coop e a Slow Food firmaram um acordo de cooperação, onde está prevista por dois anos a distribuição de 47 produtos da marca “Slow Food” em 100 supermercados da cadeia. Depois da análise dos resultados de venda, as duas organizações podem continuar a cooperação. “Se os produtos tiverem boa aceitação, o contrato pode ser renovado indefinitivamente”, explica Domeniconi.

A novidade parece chamar a atenção dos clientes. Um deles para e pergunta por que o pomodoro em vidro é tão caro. O suíço pega com cuidado o produto da prateleira e começa a contar a sua história.

“Esse pomodoro é feito com o ‘pomodorino al piennolo’, uma espécie de tomate-cereja de 20 a 25 gramas, que cresce no solo negro à base de lava das terras na base do monte Vesúvio, no sul da Itália, e onde o sol também costuma ser bem forte. Depois de colhidos, eles são pendurados em ramos nas varandas e sacadas das casas, onde o vento bate e conversa o pomodorino durante todo o inverno”, conta.

O cliente olha impressionado o rótulo, mas não se mostra convencido. Ele gostaria apenas de saber se o fato do produto ser “biológico” justifica o preço elevado (7,50 francos).

“Sim, acho que o preço se justifica pelo sabor incomparável desse tomate. Quando você fizer um espaguete, apenas essa garrafa já dá todo o sabor para o prato. Eu não conheço nada melhor”, replica Domeniconi.

Variedades

A maior parte dos produtos exibidos na estante em Zurique vem da Itália. Além das carnes, são oferecidos queijos regionais, arroz, lentilha selvagem, feijões raros, arenque defumado, geléias de frutas, olivas pretas secadas à moda, azeite de oliva e até mesmo sal marinho.

“Acredite ou não, mas até o sal tem a sua história: ele vem das duas últimas salinas da Itália, que estão entre Trapani e Marsala, na Sardenha. O produto é feito à mão e tem um sabor muito melhor do que o sal de cozinha que compramos normalmente no supermercado”, explica o suíço.

Perguntado sobre a falta de produtos suíços ou de outros países, Domeniconi lembra que o interesse da Slow Food é também é de aumentar a variedade e incentivar a produção de especialidades raras na Suíça. O acordo firmado com a Coop prevê também o apoio para a criação, entre 2007 e 2008, de vinte cooperativas patrocinadas no país. Em cada uma delas, os produtores se responsabilizariam de manter métodos tradicionais e ecológicos de produção de especialidades raras.

Parceria desigual

Criada para combater a popularização do “fast-food” e valorizar produtos regionais e ameaçados, a Slow Food surpreendeu alguns dos membros ao se associar à Coop, que também é conhecida na Suíça pela venda de pratos pré-fabricados da linha “Betty Bossi”, considerados por muitos como tão danoso para os hábitos alimentares da população como freqüentar o MacDonald’s.

O presidente da Slow Food Suíça, o espanhol Rafael Peres, já esperava as críticas. Em entrevista dada ao jornal da associação, ele tenta resumir o dilema. “Não é possível proteger uma espécie de maçã ameaçada apenas com campanhas de recolhimento de assinaturas. Para fazê-lo de forma efetiva, é necessário fabricar bons produtos com ela e encontrar canais de distribuição e compradores”.

Um exemplo é dado no supermercado em Zurique. Giuseppe Domeniconi tira um pequeno saco de lentilha, mostrando que ela é uma espécie selvagem da ilha de Ustica, que se destaca por ter um sabor inigualável.

“Essa lentilha é colhida e depois separada da casca no momento em que o agricultor joga a planta no vento. A quantidade produzida é tão pequena, que dificilmente a Coop poderia ter lucros. Porém ao vender os produtos, a rede está se diferenciando dos concorrentes. E para nós, da Slow Food, o consumidor passa a ter outros sabores”, explica.

Domeniconi, assim como outros membros da Slow Food, mostra que seu trabalho também está ligado ao prazer. Nas horas vagas o engenheiro gosta de se encontrar com amigos para preparar novos pratos e provar bons vinhos. Ele está convencido das vantagens da boa cozinha.

“Se as pessoas descobrem um novo sabor, elas percebem que a natureza pode oferecer muitos outros. Então elas não param mais…”, conclui.

swissinfo, Alexander Thoele

LISTA DE PRODUTOS:
Fagiolo badda di Polizzi
Lentille blonde de la Planzèze de Saint-Flour
Lenticchia di Ustica »
Riso di Grumolo delle Abbadesse
Riso Basmati di Dehradun
Cicerchia di Serra de’ Conti
Manoomin degli Anishinaabeg
Riz rouge de Andasibe
Culatello di Zibello
Mortadella classica di Bologna
Razza suina Mora Romagnola
Lardo di Colonnata
Aringhe salate e affumicate di Sunnmøre
Fragolina di Ribera
Confettura Extra di Castagne
Limone Interdonato
Limone Sfusato di Amalfi
Oliva infornata di Ferrandina
Vacca rossa reggiana
Castagna essiccata nei tecci di Calizzano e Murialdo
Bitto “Valli del Bitto”
Canestrato di Castel del Monte
Vezzena
Cheddar artigianale del Somerset
Oilo di Argan
Pomodorino al Piennolo
Sale Marino artigianale di Trapani

A seção suíça de “Slow Food” é uma das quatro associações reconhecidas oficialmente para fazer o inventário do patrimônio culinário helvético, projeto iniciado em 2004 e ainda não concluído.

Além de promover atividades ligadas à gastronomia, “Slow Food” Suíça publica para seus membros a revistra trimestral “Adagio”.

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