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Trinta anos de cooperação Suíça-Moçambique

Armando Guebuza e Doris Leuthard durante coletiva de imprensa. Armando Munguambe

A ajuda ao desenvolvimento prestada desde 1979 pela Suíça a Moçambique mistura pioneirismo com experiências difíceis e reflete a história recente do país africano.

Berna faz um balanço da cooperação de 30 anos, que já totaliza um volume total de 700 milhões de francos (US$ 643 milhões), e adverte que não dá cheque em branco a Maputo.

A retrospectiva “Suíça-Moçambique: 30 anos de cooperação bilateral de 1979 a 2009”, publicada pela Agência Suíça de Desenvolvimento e Cooperação (DEZA, na sigla em alemão) e a Secretaria Federal de Economia (Seco), pergunta quais foram os resultados de toda essa ajuda.

Os autores do relatório de 84 páginas admitem que “não é possível reduzir a um denominador comum 30 anos de desenvolvimento contraditório e inconstante num país enorme. Claro que Moçambique progrediu muito graças à ajuda internacional. Referimo-nos aqui à paz, à democracia, às melhorias a nível da saúde e do abastecimento de água, assim como à diminuição da pobreza. Mas é igualmente evidente que continuam a existir enormes desafios.”

Guerra, catástrofes e transição política

Com 20,5 milhões de habitantes e uma renda per capita inferior a um dólar por dia, Moçambique é uma das nações mais pobres do mundo. O país do sudeste da África tornou-se independente de Portugal em 1975, perdeu mão-de-obra qualificada pelo êxodo de portugueses, foi destruído por uma guerra civil alimentada pela África do Sul e Zimbábue (ex-Rodésia) e , mais tarde, castigado por secas e enchentes (veja galeria de fotos na coluna à direita).

A atuação helvética no país, que remonta à Missão Suíça de 1880, foi retomada em 1979 com o início das relações bilaterais e concentrou-se inicialmente na ajuda humanitária, no abastecimento de água, na área da saúde e na infra-estrutura.

O fato de a Suíça ter oferecido ajuda logo após os 15 anos de guerra (1976-1992) criou uma base de confiança para Berna intermediar no processo de paz a partir do início dos ano de 1990, bem como para participar da desmobilização e reintegração dos soldados à sociedade civil.

Pioneirismo e “imperfeições”

O desenvolvimento político reflete-se de diferentes formas no engajamento suíço. Berna mostrou coragem, por exemplo, ao apoiar cedo o Instituto Nacional de Desminagem (IND) – ainda existem cerca de 450 campos de minas por desminar até 2014 – e a formação de técnicos moçambicanos, ou ao conceder a pequenos empresários créditos facilitados, antes só obtidos após longa espera.

Os autores da retrospectiva de 30 anos, no entanto, relatam que Berna também pisou em terreno político minado: “Apesar de todo o idealismo não podemos esquecer que, ao apoiar a Frelimo (Frente da Libertação de Moçambique), a Suíça apoiava um parceiro que não media os meios para atingir os seus objetivos de remodelação da sociedade segundo os seus ideais. A Frelimo, por exemplo, pressionava as populações a mudarem-se para aldeias comunitárias nas quais havia abastecimento de água potável e serviços de saúde, estradas e uma escola. Esta iniciativa, em princípio louvável, fazia pouco sentido se, devido a isso, as pessoas acabassem por ficar separadas das suas terras. Para além disso, as mudanças destruíam as estruturas tradicionais e provocavam danos sociais, em parte ainda hoje palpáveis. A Suíça distanciou-se de protestar contra tais práticas ou de exercer pressão política. Naquela altura, parecia mais importante apoiar o renascimento do país, algo muito positivo mas aparentemente sempre em risco, do que denunciar imperfeições.” (página 23)

A ajuda suíça, que hoje gira em torno dos 30 milhões de francos ao ano e já soma cerca de 700 milhões, só aumentou quando o governo da Frelimo abandonou oficialmente o marxismo em 1989 e na Constituição aprovada no ano garantiu eleições livres num sistema multipartidário e de economia de mercado.

Diminuir a dependência externa

A Suíça passou a apoiar então um programa do Banco Mundial para amenizar o impacto das reformas estruturais, que teve sucesso “apenas moderado”. Na última década, “Moçambique passou por uma tríplice mudança: da guerra para a paz, do socialismo à economia de mercado, do sistema de partido único para a democracia”, constata a DEZA.

Somente de 2000 a 2007, a Suíça concedeu ajuda financeira de 190 milhões de dólares ao país, sendo 28% de apoio orçamentário, 21% para a descentralização política e governança local, 19% para o setor de saúde, 11% para o desenvolvimento econômico e 21% para projetos diversos, inclusive de ONGs. No mesmo período, a Noruega, por exemplo, ajudou com 437 milhões de dólares.

Moçambique recebeu apoio internacional no valor de 11 bilhões de dólares entre 2000 e 2007. Apesar de ter feito progressos, metade do orçamento do país continua dependendo da ajuda externa. Intelectuais moçambicanos acreditam que essa dependência poderia ser diminuída pela derrubada do protecionismo europeu e através de mais investimentos, como pediu o presidente Armando Guebuza em sua visita a Berna (16/6).

“Trinta anos a pedir apoio cria uma dependência mental que anula o espírito do 25 de Junho de 1975. (…) A verdadeira ajuda será não dar mais, mas lutarmos juntos, europeus e africanos, para mudar esta teia de relações”, diz Mia Couto, escritor e professor de Biologia da Universidade de Maputo.

Desde 1996, a Suíça apoia uma reforma fiscal para diminuir a dependência externa do país africano. Berna pretende continuará apoiando Moçambique também no futuro com um programa que abrange a área social (especialmente o setor de saúde), a descentralização administrativa e o setor produtivo.

“O apoio, no entanto, não acontece na forma de um cheque em branco. Assim, por exemplo, o apoio orçamentário está vinculado a um diálogo intenso com o governo. Temas como corrupção, transparência, prestação de contas à população são abordados sistematicamente. O governo é obrigado a atingir metas claramente definidas”, diz um comunicado conjunto da DEZA e da Seco.

Geraldo Hoffmann, swissinfo.ch

A Agência Suíça de Desenvolvimento e Cooperação (DEZA, na sigla em alemão) atua desde 1979 em Moçambique. No início, a ajuda era apenas humanitária. A partir dos anos 1990, o governo suíço começou a expandir seus programas.

A Suíça teve um importante papel na implementação do acordo de paz de 1992. Ele previa a desmobilização e integração à sociedade de ex-soldados rebeldes. Depois das inundações de 2000, a Suíça atuou também na ajuda humanitária e nos trabalhos de reconstrução.

Os principais setores de atuação das agências suíças em Moçambique são saúde, desenvolvimento econômico, governabilidade e projetos educativos.

Com um volume de 30 milhões de francos suíços (US$ 27,6 milhões) de ajuda por ano, Moçambique representa o mais importante país nos programas helvéticos de cooperação.

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