Perspectivas suíças em 10 idiomas

Um curso para despertar o desejo de ser brasileiro

Alexandre Weber e seus alunos do curso de português para crianças brasileiras. swissinfo.ch

Para imigrantes brasileiros que vivem na Suíça, um dos maiores desafios é conseguir transmitir seu idioma ou um pouco da cultura nacional aos filhos. O medo é que eles percam as próprias raízes.

Uma associação de educadores brasileiros oferece cursos para essas crianças. Através de quadrinhos e folclore, elas não apenas se aproximam do Brasil, mas também melhoram as notas no boletim escolar.

As oito crianças olham para o professor com atenção. Alexandre Weber aponta para a frase escrita na lousa e pergunta-lhes: – “Quem conhece esse sinal?”. A resposta é dada em um coro alegre: – “Esse é o ponto final”. O carioca aponta então para o final de uma oração. “Esse é o ponto de exclamação, professor”, responde serelepe uma menina de oito anos em um português com leve sotaque helvético.

Essa cena tão comum nas escolas brasileiras ocorre há milhares de quilômetros de distância, em outro continente. Estamos na realidade na escola do bairro de Wittigkofen em Berna, a capital da Suíça. Os alunos são filhos de brasileiros ou brasileiras, mas nasceram no país dos Alpes. Entre eles o idioma comum é o dialeto suíço-alemão. Mas nessas aulas especiais, quem dá o tom é a língua de Camões.

Os cursos ocorrem nessa escola todas as quartas-feiras de 14:15 às quatro da tarde. Eles fazem parte do programa mantido pela Associação Brasileira de Educação e Cultura (ABEC), uma entidade que, como o nome diz, tem fins educativos. “A proposta da Abec, quando foi fundada em 2002, era de se dedicar exclusivamente ao ensino da língua portuguesa e da cultura brasileira aos filhos de brasileiros e casais mistos, mas também para crianças que têm afinidade e interesse de conhecer a nossa cultura”, explica Arlete Baumann, presidente da Abec.

Atualmente essa associação mantém 21 cursos de língua e cultura brasileiras em cidades de vários cantões da Suíça, dentre os quais Zurique, Berna, Lucerna e Argóvia. A partir de agosto, eles poderão ser oferecidos também nos cantões da Basiléia e Schwyz. No total, 180 crianças frequentam as aulas. O custo é moderado para os pais: uma taxa semestral de 245 francos, o que equivale ao custo mensal de um curso de música ou idioma na Suíça. As salas de aula são disponibilizadas gratuitamente pelos estabelecimentos de ensino.

Ensino lúdico

Alexandre Weber tem mestrado em antropologia, mas trabalha voluntariamente como professor dos “brasileirinhos” em Wittigkofen. Pouco antes de começar a sua aula, ela gruda na lousa um mapa do Brasil. O material de ensino também é diverso. Algumas folhas explicam as diferentes regiões brasileiras ou outras dados geográficos como as capitais. Outra fala da composição étnica do país: …”Nosso povo nasceu da junção dessas três etnias: branco, negro e índio”. Mas o que mais encanta as crianças são os quadrinhos, tirados dos mais conhecidos gibis brasileiros como “O menino maluquinho” ou “Mônica e Cebolinha”.

“Nosso objetivo não é alfabetizar as crianças, mas sim despertar nelas o interesse pela cultura brasileira”, afirma Alexandre. Ele explica que o conhecimento do idioma português é muito diverso em cada família. Em algumas, ele é transmitido através da mãe. Em outras praticamente não se fala português, sobretudo quando alguns pais acham que falar apenas os idiomas nacionais é melhor para a integração. “Porém no meu caso, eu e a minha esposa falamos português, o que permitiu às nossas filhas a aprender perfeitamente a minha língua.”

Apesar de serem oferecidos como aprendizado extracurricular, os cursos da Abec também tem uma utilidade prática. Graças ao reconhecimento pelas autoridades educacionais do cantão de Zurique no programa de Cursos HSK (ndr.: de língua e cultura maternas), sua frequência conta pontos na avaliação escolar das crianças. “Elas passam por uma avaliação e têm notas, que são transmitidas ao seu boletim escolar”, ressalta Arlete, lembrando ao mesmo tempo que aprender português também influencia positivamente em outras matérias regulares. “Isso ajuda no francês, latim, uma terceira ou até quarta língua.”

A presidente da Abec tem experiência com isso. Vivendo há vinte e oito anos na Suíça, seus dois filhos, de 23 e 25 anos, sempre escutaram o português em casa. O pai, suíço, também aprendeu o idioma. “Hoje eles pulam de um idioma para outros sem problema nenhum”, conta com orgulho.

Dificuldades

Porém o que parece fácil – aprender um idioma dentro da família – costuma sem mais difícil na realidade. “Eu acho que a dificuldade maior é que as crianças estão inseridas em um contexto diferente: todos os que estão em volta delas aqui na Suíça fala alemão ou outra língua”, lembra Arlete. “Mesmo que os pais brasileiros falem o português com elas, o contato delas passa a ser com outro idioma assim que saem da proteção familiar”.

Também o professor em Berna lembra outro fator específico de países europeus, que receberam nas últimas décadas grandes levas de imigrantes. “Antes pertencer a duas culturas era visto como um problema, que até gerava preconceitos”, analisa Alexandre, mas ressaltando que hoje em dia a situação mudou totalmente. “Em um mundo globalizado, saber vários idiomas é hoje uma grande vantagem para qualquer criança.”

E um exemplo disso está em uma das suas alunas, Laísa, com apenas nove anos. Seu pai é um suíço originário de um cantão de língua italiana e sua mãe vem da Bahia. Para ela, falar suíço-alemão, português e italiano é tão fácil como escovar os dentes. Por isso quase não é possível perceber o sotaque quando olha para os quadrinhos do famoso Ziraldo: – “Ai, esses machistas vivem querendo chatear a gente”, lê com uma naturalidade de gente grande.

Alexander Thoele, swissinfo.ch

A Associação Brasileira de Educação e Cultura (ABEC) foi criada há oito anos. Porém o grupo de iniciadores já atua há doze anos na área de educação para crianças com descendência brasileira.

Atualmente a ABEC mantém 21 cursos de língua e cultura brasileiras em vários cantões da Suíça, dentre os quais Zurique, Berna, Lucerna e Argóvia. A partir de agosto, eles poderão ser oferecidos também nos cantões da Basileia e Schwyz.

Número de crianças que frequentam atualmente os cursos: 180. Custos: taxa semestral de 245 francos. Frequência: uma vez por semana, geralmente nas quartas-feiras.

Os cursos são reconhecidos pelas autoridades cantonais de Zurique como Cursos HSK (LCM- Língua e Cultura Maternas), o que faz com que sua frequência seja levada em conta na avaliação escolar das crianças.

Endereço de contato: ABEC

Konradstrasse 1
8400 – Winterthur- Suíça
Tel: +41 52 203 1017
terças e quintas-feiras, das 9 às 13 h
info@abec.ch

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