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Uma prisão cinco estrelas

Cenário idílico: colônia penal de Ringwil (foto: Frederic Meyer) Frederic Meyer

Ringwil é um modelo no sistema penal suíço. Nela os detentos trabalham na roça ou até mesmo de garçom. O principal objetivo é prepará-los à liberdade.

Acompanhe a swissinfo numa visita a uma prisão sem muros e que poderia até ser confundida com hotel.

A viagem à prisão mostra como é possível afastar concretamente criminosos da sociedade. O carro abandona a metrópole Zurique, passa por algumas pequenas cidades e chega, depois de uma hora de viagem, num pequeno vilarejo chamado Ettenhausen. Um pedestre indica o caminho ao motorista perdido, apontando para uma pequena estrada, que leva montanha acima.

Logo a paisagem passa a ser dominada por pastos verdejantes, algumas vacas malhadas e espessas florestas de pinheiros. Cortando um pouco da monotonia alpina, o veículo ainda cruza algumas das raras aldeias com casarões de madeira no estilo colonial suíço. Na estrada não há uma alma viva que possa dar informações. Meia-hora depois, uma pequena placa indica que chegamos à Colônia Penal de Ringwil.

Fronteira do perigo

A penitenciária está a 700 metros acima do nível do mar. Mas não se percebem que lá vivem 60 detentos de vinte diferentes países. O que se vê é algo que lembra muito mais a propriedade de um rico fazendeiro. Ela não tem muros de três metros, câmaras de vigilância ou torres de observação com policiais armados e prontos para atirar ao primeiro movimento suspeito, mas sim estufas, chalés, jardins floridos e pequenas oficinas. O terreno está todo cercado por florestas, plantações e pastos, tudo formando um verdadeiro cartão postal de paisagem suíça.

Ringwil é uma filial da penitenciária de Pöschwies. Ela é uma prisão que funciona em regime semi-aberto e seus muros são “invisíveis”, como explica Werner Burkhard à swissinfo:

– Os muros são o nosso código de conduta e o acordo pessoal firmado com cada um dos nossos prisioneiros – explica o diretor que, com o terno impecável, mais lembra um executivo de multinacional.

Com um pouco mais de atenção é possível descobrir os “muros”. Algumas das casas têm grades pesadas nas janelas, sendo que uma está até cercada por arame farpado. Lá dormem os detentos, informa um guarda. Eles se movimentam pela colônia penal com uniformes azuis. Azul é também a cor da faixa discreta que marca os limites do território. Todo preso conhece-a de cor e sabe até onde pode caminhar.

Apesar do grande espaço e da liberdade com que todos entram e saem em Ringwil, a média de fugitivos da colônia penal é de apenas três por ano. Com sessenta vagas, ela está sempre lotada. Das duas mil férias e saídas autorizadas pela direção aos presos durante o ano, apenas 15 pessoas em média não retornam.

– Esses índices positivos se explicam pelo fato de recebermos apenas detentos que estão quase no fim das suas penas. Eles não são considerados perigosos e tem pouco risco de fuga. Porém aqueles que quebram as regras sabem que irão retornar para outras penitenciárias, onde a liberdade é muito mais restrita – esclarece Burkhard.

Apenas 30 guardas penitenciários trabalham em Ringwill, além de alguns assistentes sociais.

Regime semi-aberto

Em Ringwill, os detentos são trancados nas suas celas apenas à noite. Durante o dia, caso não estejam doentes, eles são obrigados a trabalhar, por vezes até mesmo fora da colônia. Outras atividades como férias, direito de visita, uso do telefone são controlados penosamente pela direção.

– Nosso principal objetivo é possibilitar ao detento cumprir a sua pena de forma humana e ajudá-lo a se preparar à vida em liberdade – justifica Burkhard, para quem o trabalho diário, que possibilita o contato com pessoas do mundo externo, as regras rígidas que reforçam o sentimento de responsabilidade, e a liberdade controlada compõem a fórmula desse novo tipo de prisão.

Não apenas os bons resultados como o número reduzido de reincidentes convenceu as autoridades penais. Também uma questão econômica é levada em conta: os custos por preso em Ringwil são muito menores do que se estivessem cumprindo pena numa penitenciária comum.

Como uma empresa

Um dia comum na Colônia Penal de Ringwil começa às 7:15 da manhã. Nessa hora o diretor se reúne com um grupo de auxiliares para elaborar o plano do dia e saber como decorreu a noite. Quinze minutos depois, tocam as sirenes da colônia, o sinal para que os detentos, já de uniforme, se dirijam aos seus respectivos postos de trabalho.

– É muito importante ter regras fixas no dia. Uma delas é começar o trabalho pontualmente às 7:30. Isso dá uma boa estrutura ao dia e ajuda os presos a se acostumarem a uma rotina fixa, como na vida normal – explica Burkhard.

Ringwil funciona como uma empresa, onde as mais variadas tarefas precisam ser realizadas diariamente. As vacas e cavalos da colônia penal precisam ser tratados. Na lavoura são cultivados e colhidos vários tipos de legumes e frutas sem uso de pesticidas e que são consumidos na própria colônia ou vendidos nos mercados públicos da região. Só um supermercado compra semanalmente 500 quilos de alho, que precisam ser limpos e embalados.

A marcenaria e serralharia atendem encomendas internas e externas como reparos de móveis. Na cozinha são preparadas as refeições não apenas para Ringwil, mas também para as prisões de Meilen e Pfäffikon. A colônia oferece até um serviço de festas, onde os detentos preparam jantares e trabalham de garçom, caso haja interesse por parte do cliente.

A lavanderia também é um setor importante. O folheto publicitário é explicito: – “Só lava e passa a roupa quem quer”. Isso, pois a colônia oferece todos os serviços possíveis na área da tinturaria, inclusive até pequenos trabalho de costura.

Os detentos também podem realizar pequenos trabalhos de construção ou pintura. Tudo por preços módicos, garante o folheto.

– Somos como uma pequena e eficiente empresa. A única diferença é que não posso demitir os funcionários – brinca Burkhard, acrescentando que a Colônia de Ringwil existe na realidade para fazer cumprir as penas impostas aos detentos, mas com a preocupação de reintegrá-los à sociedade através do próprio trabalho.

– Muitos dos nossos presos acabam descobrindo novas qualidades e ficam extremamente felizes de poder fazer um bom serviço, sobretudo quando as pessoas elogiam. Isso é muito importante para eles.

Depois do trabalho

A labuta diária se encerra às 17 horas. A partir desse momento, os detentos podem circular livremente no território da colônia penal – mas sempre observando os limites demarcados pela faixa azul. Muitos vão jogar futebol ou tênis de mesa. Quem desrespeitar as regras, brigar ou provocar confusão, é penalizado.

– Isso significa não apenas a perda do direito de saída, das férias, o aumento da pena, mas também até reclusão ou transferência para um presídio – explica o diretor.

Pontualmente, às 20:30, as portas de cada cela são fechadas. Meia hora depois, a dos andares também. Os presos passam a noite em celas individuais, de duas pessoas ou até três.

Apesar da vista paradisíaca para os Alpes suíços, a maior parte deles sabe que não está num hotel. Como explica um dos detentos, o barulho do ferrolho quando as portas são fechadas, as grades na janela e o arame farpado cercando o prédio da prisão, sempre lembra algo que eles perderam: a liberdade.

swissinfo, Alexander Thoele

– A Colônia Penal de Ringwil foi criada em 1880 para servir de centro correcional para menores.

– A partir de 1939, Ringwil passou a funcionar como colônia penal para adultos. Em 1971 foi introduzida nela o regime semi-aberto.

– Desde 1987 ela abriga diversas oficinas como uma serralheria, marcenaria e lavanderia, além da agricultora.

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