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Voluntários ajudam cegos a “ver” futebol

Mathias Froidevaux (de vermelho) e seu consultor Mathias Marti são voluntários. swissinfo.ch

Graças à narração de voluntários, quinze deficientes visuais e cegos conseguiram assistir o último jogo da Copa Suíça de Futebol, disputado pelas equipes FC Sion e Neuchâtel Xamax, com a vitória do primeiro.

Foi um projeto-piloto que pode se repetir nos próximos anos. swissinfo.ch acompanhou essa experiência.

No intervalo do jogo, Hervé Richoz mal conseguia esconder seu entusiasmo. “Acabo de fazer as pazes com o futebol”, declarou ele nas tribunas do estádio Saint-Jacques na Basileia, com lotação plena. Obviamente para esse suíço, o resultado de 2 a 0 favorável para o FC Sion merecia uma comemoração à altura.

Porém muito mais do que comemorar a décima-segunda vitória em doze finais da copa para o FC Sion, um recorde mundial, é o comentário da narração que transforma seus hábitos: “Pela primeira vez, tenho a impressão de estar vivendo inteiramente uma partida de futebol.”

Desde seus 15 anos, Hervé Richoz sofre de uma perda da visão central. Ex-motoqueiro e apaixonado por esportes automotivos, ele sofria até então a compreender o que estava acontecendo em campo. “Normalmente eu vejo um agrupamento de jogadores em vermelho e branco, mas não a bola. Hoje eu consegui ter uma melhor ideia da construção do jogo”. Assim como a outra quinzena de cegos e deficientes visuais, reagrupados com seus acompanhantes na tribuna, o suíço de Martigny (sudoeste do país) se beneficia pela primeira vez desse tipo de serviço oferecido em uma final de de futebol.

Contrariamente a um comentário radiofônico ou televisivo, a narração é baseada mais sobre os fatos do que nas emoções. “Os repórteres descrevem tudo o que está acontecendo em campo. É importante para os ouvintes que eles possam saber exatamente onde está a bola e em que posição se encontra o jogador”, explica Daniel Pulver, da Federação Suíça de Cegos.

Uma boa partida 

A vinte metros dos ouvintes, o grupo de deficientes visuais, Mathias Froidevaux, ex-jornalista esportivo, é um dos francófonos que asseguram voluntariamente esse serviço. “Nós estamos no centro de defesa do time de Neuchâtel, a bola está nos pés de Crettenand, que avança, a 50 metros à sua esquerda. A bola foi recuperada e despachada pelos jogadores do Neuchâtel Xamax. Ela está agora no campo do FC Sion”, narra ele nas ondas de frequência FM na qual estão conectados os cegos e deficientes.

Sua preocupação consiste em se colocar no lugar do cego e entrar o máximo no jogo. “Tento ser o mais descritivo possível, mas mantendo o aspecto jornalístico”, ressalta. Na pausa, o repórter se junta aos seus ouvintes para escutar suas primeiras impressões. “Durante os dez minutos de jogo não entendi nada”, critica Hervé Richoz. Ele é garante não ser o único a estar desorientado pelos dois primeiros gols do FC Sion, com falhas da defesa do Xamax que ajudaram e decidir o jogo em menos de seis minutos.

“Sentimos que ele é apaixonado e que domina muito bem o tema, mas se esquece, por vezes, de dizer onde está a bola”, julga Hervé Richoz. “Na Alemanha não são os jornalistas que comentam as partidas, mas pessoas que simplesmente descrevem a posição da bola”, acrescenta Daniel Pulver. Porém todos estão bastante satisfeitos de poder contar com a narração, mesmo se os torcedores do FS Sion estarão em uma melhor situação ao sair do estádio do que a turma do Xamax.

Outros projetos 

Lançados durante a Eurocopa de 2008 organizada em conjunto pela Suíça e pela Áustria, o projeto de comentários esportivos para cegos e deficientes visuais emplacou. Em colaboração com a Associação Suíça de Futebol (ASF, na sigla em francês), a União Central de Ajuda aos Cegos (UCBA) assegura a narração dos jogos de futebol realizados na Suíça nas eliminatórias para a Eurocopa de 2012. Uma colaboração que foi igualmente iniciada com o clube Young Boys de Berna, que oferece o mesmo serviço durante os jogos em casa graças à rádio “Gelb-Schwarz”.

Em estreia mundial, a Suíça testou igualmente a narração durante o Campeonato Mundial de Hóquei no Gelo em 2009, realizado em Berna e na cidade de Kloten (próximo à Zurique). “A Suíça está mais avançada do que os outros países europeus”, avalia Stephan Mörker, chefe do departamento de meios auxiliares da UCBA. “Apenas os campeonatos de futebol na Alemanha e na Inglaterra oferecem no momento um serviço semelhante.”

Os responsáveis da associação não querem parar nesse estágio. Atualmente ocorrem negociações com outros clubes suíços – particularmente nas cidades de Lausanne, Basileia e Sion – para generalizar a narração de jogos nos estádios helvéticos. “Nós desejaríamos que cada deficiente ou cego possa receber o sinal FM da narração nos estádios. Assim os beneficiários não necessitarão se agrupar, mas poderão acompanhar o jogo no meio do público. Será algo importante para a integração”, defende Stephan Mörker. O serviço poderá beneficiar igualmente idosos que sofrem de problemas de visãi.

Os projetos não dizem respeito apenas a eventos esportivos. A narração poderá, em breve, se tornar algo habitual nos teatros e cinemas suíços, espera Stephan Mörker. A Televisão da Suíça Francesa (TSR) difunde, desde 2008, filmes acompanhados de uma narração dos elementos visuais em “off”.

A cegueira classifica-se dependendo de onde se tenha produzido o dano que impede a visão. Este pode ser:

– Nas estruturas transparentes do olho, como as cataratas e a opacidade da córnea.

– Na retina, como a degeneração macular e a retinose pigmentária.

– No nervo óptico, como o glaucoma ou os diabetes.

– No cérebro.

A cegueira pode ser congênita ou adquirida. O dano que impede a visão pode ser causado no nascimento, em algum evento ao longo da vida do indivíduo ou ainda no útero materno. (Texto: Wikipédia em português)

Adaptação: Alexander Thoele

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