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Investigação suíça coloca empresário angolano na prisão

Strasse in Genf
O centro financeiro de Genebra está no epicentro de um caso de fraude e lavagem de dinheiro em Angola. © Keystone / Martial Trezzini

A justiça de Genebra bloqueou mais de 900 milhões de francos suíços na conta de Carlos Manuel de São Vicente, que era suspeito de fraude e lavagem de dinheiro. O processo passou despercebido em Angola até as revelações do site Gotham City. Desde então, o empresário está atrás das grades.

Em Angola, quase metade da população vive com menos de 2 dólares por dia. No entanto, o país é considerado rico pelo Banco Mundial. Então para onde vai o dinheiro que circula na terceira maior economia da África? Pelo menos uma parte vai para a Suíça, como revelou o site investigativo Gotham City no verão passado.

Em 27 de agosto, jornalistas especializados em crimes de colarinho branco descobriram que o sistema de justiça de Genebra congelou mais de 900 milhões de francos durante um ano e meio. O dinheiro pertence a Carlos Manuel de São Vicente, que dirige um império de seguros em Angola. O Ministério Público acusa o empresário de ter desviado quase um bilhão de francos de uma das empresas de seu grupo, AAA Seguros SA, para sua conta pessoal entre 2012 e 2018.

Uma remessa em particular chamou a atenção dos investigadores: em 18 de setembro de 2018, um total de 213 milhões de dólares foi transferido em várias parcelas para a holding do Grupo AAA, em nome de Carlos Manuel de São Vicente. Todas essas transações ocorreram dentro do banco SYZ, sediado em Genebra, onde o angolano abriu contas para quatro de suas empresas entre 2012 e 2013, incluindo a AAA Seguros SA e a holding, da qual ele é o único signatário e único proprietário.

Foi nesta mesma instituição que ele abriu sua conta pessoal e outras contas “em nome de sua esposa, seus três filhos, suas irmãs e seus sobrinhos e sobrinhas”, de acordo com a sentença do Tribunal Penal de Genebra de 9 de julho de 2020.

Suspeita de lavagem de dinheiro

Os fundos de Carlos Vicente representavam cerca de 4% dos ativos do banco sob gestão naquela época. Estas transferências alertaram o banco SYZ. A instituição relatou as transações ao Departamento de Denúncias de Lavagem de Dinheiro, que então iniciou uma investigação e bloqueou as contas. Na Suíça, o angolano foi acusado de lavagem de dinheiro pelo Ministério Público de Genebra em março de 2019.

Segundo ele, a transferência dos 213 milhões correspondeu ao reembolso parcial de dois empréstimos que ele mesmo havia concedido e duas subsidiárias da AAA Seguros SA. A presunção de inocência ainda se aplica.

No entanto, o caso também tomou um rumo político. Carlos Vicente é de fato o marido de Irene Alexandra da Silva Neto, filha do primeiro presidente de Angola e ex-ministra e membro do parlamento do presidente José Eduardo dos Santos. Um dos acionistas minoritários da AAA Seguros SA com uma participação de 10% é até mesmo a Sonangol E.P., a empresa petrolífera estatal angolana.

Reações tardias em Angola

Apesar de um pedido de assistência jurídica do Ministério Público de Genebra para Angola, o processo suíço contra Carlos Vicente encontrou pouco eco no país – até sua revelação na mídia. A partir de então, o Presidente João Lourenço não podia mais desviar o olhar.

Alguns ativos de Vicente e do grupo AAA foram confiscados em Angola. A a Procuradora-Geral angolana, Eduarda Rodrigues Neto, reuniu-se com representantes do Ministério da Justiça em Berna em 11 de setembro para responder ao pedido de cooperação jurídica.

Em 22 de setembro, Carlos Manuel de São Vicente foi preso e levado sob custódia para Luanda. Seu interrogatório “revelou fortes indícios de desvio de fundos”, “abuso de poder”, “corrupção” e “influência”, disse o Procurador-Geral Álvaro da Silva João.

Para sua esposa Irene Neto, nada mais é do que um “linchamento judicial e midiático” contra “um cidadão honesto e honrado que respeita as leis angolanas”. Em 2017, alguns meses após José Eduardo dos Santos ter renunciado ao cargo de presidente do país, Carlos Vicente deu uma entrevista ao jornal “Novo Jornal” e declarou que Angola era um “país de gente corrupta”.

* Fundado pelos jornalistas investigativos Marie Maurisse e François Pilet, o site Gotham City fornece um boletim informativo sobre crimes econômicos.

Ele informa semanalmente a seus assinantes sobre casos de fraude, corrupção e lavagem de dinheiro em conexão com o centro financeiro suíço, com base em documentos judiciais com acesso público.

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Adaptação: Fernando Hirschy

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