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Alemanha vai comprar dados bancários roubados

Merz (esq.) faz advertências; Merkel quer os dados, "se forem relevantes". Keystone

Segundo a imprensa alemã, um informante ofereceu por 2,5 milhões de euros às autoridades do país um CD com dados de cerca de 1500 alemães, que teriam depositado dinheiro não declarado fiscalmente em contas na Suíça.

O ministro alemão das Finanças, Wolgang Schäuble, teria aprovado a compra dos dados. O caso causa controvérsia na Alemanha e provoca indignação na Suíça.

O jornal alemão Augsburger Allgemeine informa em sua edição eletrônica nesta terça-feira que o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, já deu luz verde para comprar o CD com os dados roubados.

“Em princípio, a decisão já foi tomada”, disse Schäuble ao jornal. Ele lembrou que o caso é juridicamente semelhante ao de Liechtenstein há dois anos (leia mais abaixo). “Por isso não podíamos decidir de outra forma.”

A chanceler federal alemã, Angela Merkel, disse na segunda-feira (1°/2) que deve ser feito todo o possível para obter os dados oferecidos. “Tendo em vista o objetivo, se os dados são relevantes, devemos ter posse desses dados.”

Ela rebateu questionamentos – inclusive de integrantes de seu partido, a União Democrata Cristã – sobre a legalidade de uma eventual compra. Qualquer pessoa razoável sabe que a sonegação fiscal tem de ser punida, disse.

O vice-chanceler alemão, Guido Westerwelle (do Partido Liberal), foi cauteloso. “É claro que a sonegação fiscal não é um delito de cavalheiro. Mas sua perseguição deve seguir estritamente os princípios do Estado de Direito.”

Segundo o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung, que revelou o caso, baseado em evidências obtidas da análise de cinco dos 1500 nomes, o fisco alemão estima que poderia recuperar até 100 milhões de euros de impostos com a compra do CD.

Reações suíças

O ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble, informou na segunda-feira seu colega de pasta suíço, Hans-Rudolf Merz, em um telefonema, de que autoridades de um estado alemão (Renânia do Norte-Vestfália) receberam a oferta de compra de dados de clientes de um banco suíço.

O governo federal alemão irá decidir se aceita essa oferta, disse Schäuble, segundo um comunicado do Ministério suíço das Finanças. “Os dois ministros constataram que os dois países hoje defendem posições jurídicas divergentes.”

Segundo o comunicado, Merz lembrou Schäuble de que a Suíça não oferece assistência administrativa a outros países com base em dados bancários roubados.

Merz disse também que a Suíça está disposta a aprofundar a cooperação fiscal com a Alemanha com base em um acordo revisado sobre bitributação – atualmente em negociação entre os dois países.

Merz também explicou a Schäuble que “uma compra de dados roubados de clientes é proibida na Suíça e atenta contra o princípio da boa fé e a ordem pública. O uso de dados bancários roubados viola a esfera privada dos clientes atingidos.”

A ministra da Economia e atual presidente da Suíça, Doris Leuthard, disse no sábado, à margem do Fórum Econômico Mundial em Davos, que, “de uma maneira geral, consideramos bastante complicado quando um Estado de Direito usa dados ilegais”.

Thomas Sutter, porta-voz da Associação Suíça de Banqueiros, disse na segunda-feira à emissora de televisão alemã ZDF: “Esperamos que a Alemanha não compre os dados e sim prenda o criminoso que cometeu um crime na Suíça e devolva os dados à Suíça.”

Antecedentes

Berlim já havia sinalizado que poderia proceder como em 2008, quando o serviço secreto alemão comprou por 5 milhões de euros um DVD com dados de 1400 clientes, oferecido por um ex-funcionário do banco LGT, de Liechtenstein.

Dessa forma, o fisco alemão conseguiu recuperar mais de 170 milhões de euros de impostos. No total, 770 alemães foram condenados por sonegação fiscal, entre eles, o ex-diretor-presidente dos Correios, Klaus Zumwinkel.

Em dezembro passado, a entrega de dados roubados referentes a milhares de clientes do banco privado HSBC, de Genebra, à Justiça francesa gerou atritos nas relações entre a França e a Suíça.

Segundo o jornal francês Le Monde, Paris quer processar 3 mil franceses que teriam escondido dinheiro fiscalmente não declarado no HSBC em Genebra.

Na quarta-feira passada, em Davos, o ministro francês do Orçamento, Eric Woerth, prometeu não repassar esses dados a terceiros Estados nem usá-los para pedir ajuda administrativa à Suíça, conforme disse o ministro Hans-Rudolf Merz depois do encontro.

Segundo o jornal Tages-Anzeiger, de Zurique, se o uso de dados roubados fizer escola, a Suíça pode se preparar para novos ataques ao sigilo bancário. O jornal lembra que, com informações fornecidas por um ex-funcionário do UBS, os EUA causaram tanto susto que milhares de estadunidenses com contas no exterior se autodenunciaram à autoridade fiscal norte-americana.

swissinfo.ch com agências

A Suíça foi alvo de ataques em 2009, acusado de, através do sigilo bancário, permitir que sonegadores estrangeiros escondam seu dinheiro.

Em fevereiro, o UBS teve de pagar uma multa de 780 milhões de dólares nos EUA, depois de admitir que havia ajudado clientes estadunidenses a evadir impostos.

Em março, sob pressão do G20, a Suíça se comprometeu a adotar as normas da OCDE em matéria de troca de informações fiscais com outros países.

Desde então, o governo suíço negociou com mais de uma dezena de países novos acordos sobre bitributação baseados nos padrões da OCDE.

Um acordo firmado em dezembro com os Estados Unidos prevê a entrega dos dados de 4.450 clientes norte-americanos do UBS à autoridade fiscal dos EUA.

Em janeiro de 2010, o Tribunal Administrativo Federal decidiu que a entrega desses dados é ilegal. A autoridade de fiscalização do mercado financeiro suíço (Finma) recorreu da sentença ao Tribunal Federal. Ainda não há decisão e Berna pretende manter novas conversações com Washington sobre o caso.

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