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Cientistas suíços desenvolvem arroz rico em ferro

Arroz transgênico no laboratório de biotecnologia da ETH, em Zurique. Keystone

Pesquisadores da Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH) desenvolveram um arroz geneticamente modificado que tem seis vezes mais ferro do que o arroz convencional.

O transgênico, que ainda precisa passar por experiências de campo, poderia ajudar a resolver um problema de nutrição em países em desenvolvimento na África e na Ásia. ONGs criticam a pesquisa.

Noventa e quatro por cento da produção mundial de arroz são consumidos em países emergentes e em desenvolvimento. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 2 bilhões de pessoas (quase um terço da população mundial) sofrem de carência de ferro no sangue.

Essas pessoas cansam rapidamente, sofrem de anemia a longo prazo e têm problemas para eliminar as substâncias tóxicas do organismo. Crianças e mulheres que se alimentam principalmente de arroz em países em desenvolvimento são as mais atingidas.

Segundo os pesquisadores da ETH, o arroz descascado (polido) não contém ferro suficiente e não cobre a necessidade diária de uma pessoa, mesmo sendo consumido em grande volume. “Uma alimentação equilibrada ou xaropes de ferro são inacessíveis a muitas pessoas nesses países.”

Uma equipe de cientistas do laboratório de fitobiotecnologia da ETH, coordenada por Christof Sautter e Wilhelm Gruissem, introduziu dois genes vegetais numa espécie de arroz convencional e, como isso, conseguiu sextuplicar o teor de ferro no arroz descascado. O trabalho foi publicado no versão online da revista Plant Biotechnology Journal.

Mobilização de genes

Os pesquisadores explicam que, com a ajuda desses genes, a planta do arroz multiplica a enzima nicotianamina sintase, que mobiliza o ferro, e a proteína ferritina, que armazena o ferro. Em conjunto, elas fazem com que a planta retire mais ferro do solo, o enriqueça e armazene no grão de arroz.

Os cientistas manipularam os genes de modo que a nicotianamina sintase é formada em toda a planta e a ferritina apenas no interior do grão. “Assim essa cooperação dos dois genes tem um efeito positivo sofre o teor de ferro do arroz descascado e o sextuplica em relação ao arroz original”, informa a ETH em um comunicado.

Na estufa, os protótipos do transgênico não diferem das plantas normais e não indicam desvantagens, como redução de safra. “O próximo passo agora é avaliar em testes de campo se o arroz transgênico vinga sob as condições da agricultura”, disse Wilhelm Gruissem.

Efeitos negativos?

Gruissem não vê risco de que a planta geneticamente modificada tenha efeitos negativos para o meio ambiente, como por exemplo, o esgotamento do solo, “porque ferro é o metal mais freqüente no solo”.

Embora a nova espécie de arroz já contenha uma concentração de ferro bastante alta, Gruissem quer elevar ainda mais seu teor nos grãos de arroz. “Porque muitas pessoas que sofrem de carência de ferro só podem fazer uma refeição por dia. Se os cientistas conseguissem multiplicar por 10 ou 12 a concentração de ferro no grão de arroz, uma refeição por dia seria suficiente para cobrir a necessidade diária de ferro de uma pessoa”, diz o comunicado da ETH.

Segundo a ETH, as experiências do chamado “arroz dourado”, enriquecido com betacaroteno (encontrado em vegetais como cenoura e beterraba), desenvolvido pela ETH e pela Universidade de Friburgo (Alemanha), mostra que pode demorar anos até que um arroz transgênico possa ser plantado.

O “arroz de ferro” ainda terá de passar por uma bateria de testes agronômicos e de biossegurança em estufa e no campo, antes de ser liberado para o plantio. “As barreiras regulatórias e os custos para colocar plantas transgênicas à disposição da agricultura e dos consumidores são elevados. O objetivo dos cientistas da ETH é dar as sementes do arroz transgênico de graça a pequenos agricultores”.

A ETH foi muito criticada por sua participação no desenvolvimento do “arroz dourado”, que ganhou a fama de servir à propaganda da biotecnologia “do bem”. O professor responsável pelo projeto, Ingo Potrykus (hoje aposentado), usou durante anos sequências de genes que estavam protegidas por 70 patentes de 32 firmas e institutos e havia se comprometido a não repassá-las adiante.

Críticas da Swissaid e do Greenpeace

A organização não governamental Swissaid também critica o arroz com alto teor de ferro. “À primeira vista, naturalmente é de se saudar o fato de que a carência de ferro de milhões de pobres possa ser reduzida. Mas a opção feita não é sustentável porque não ataca as causas”, disse Caroline Morel, diretora executiva da Swissaid, à swissinfo.ch.

Segundo Morel, o objetivo deve ser que os pobres possam se alimentar de maneira equilibrada. “A solução para combater a carência de ferro, a desnutrição e a fome é apoiar os pequenos agricultores. A Swissaid aposta no fomento à pequena agricultura socialmente justa e ecologicamente sustentável.”

Ela acrescenta que a nova espécie de arroz não foi suficientemente testada, “e não se sabe se terá efeitos negativos sobre o meio ambiente e a saúde. É preciso analisar também se o ferro será bem absorvido pelo corpo. É importante que os riscos sejam minuciosamente avaliados.”

Morel está convencida de os transgênicos não resolvem o problema da desnutrição no mundo. “Pelo contrário, a tecnologia genética agrava a fome. As altas taxas sobre patentes colocam os agricultores numa dependência que pode ter efeitos catastróficos. Os riscos dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM) são pouco conhecidos. Este é o principal motivo por a maioria aprovou uma moratória para os transgênicos na Suíça”, disse à swissinfo.ch.

Uma posição semelhante é defendida pela ONG Greenpeace Suíça. “A carência de ferro pode ser combatida pelo consumo de mais vitamina C. Além disso, o arroz integral tem quatro vezes mais ferro do que arroz branco polido. Portanto, não se precisa de arroz transgênico com maior teor de ferro para combater a carência de ferro em países em desenvolvimento”, respondeu à swissinfo.ch.

Segundo a ONG, com a promessa de reduzir a carência de ferro em países em desenvolvimento, os defensores dos transgênicos tentam convencer a opinião pública da necessidade dessa tecnologia de risco. “Mas plantas transgênicas não resolvem o problema da fome no mundo, essas sementes são parte do problema. Através do patenteamento de sementes, os conglomerados tentam garantir um monopólio sobre a produção agrícola e a alimentação”.

Geraldo Hoffmann, swissinfo.ch

O arroz dourado é um transgênico desenvolvido pela ETH de Zurique e pela Universidade de Friburgo (Alemanha)com a intenção de reduzir a deficiência de vitamina A em populações que tradicionalmente se alimentam com o arroz. O grão de arroz, porém, tem um teor de pró-vitamina A muito baixo. Para ingerir a quantidade diária necessária de vitamina A, um homem adulto teria que comer 9 quilos de arroz dourado cozido por dia.

A principal causa da deficiência de vitamina A é alimentação baseada apenas em arroz e mais nada. Por isso, o Greenpeace acredita que a solução para a deficiência de vitamina A está em um hábito alimentar diversificado com a presença de frutas e hortaliças – e não em um transgênico que tente suprir essa necessidade sem resolver o problema de fundo.

O arroz dourado nunca foi plantado comercialmente no mundo. Segundo a Swissaid, após testes de campo em Louisiana/EUA (2004), o “arroz dourado” agora ele está sendo cruzado com espécies locais nas Filipinas (IRRI e PhilRice), na Índia e no Vietnã e são feitos mais testes para liberar seu plantio como planta agrícola. Em 15 de fevereiro de 2009, a imprensa filipina informou que IRRI e PhilRice planejam a introdução no mercado para 2012.

Fontes: Greenpeace e Swissaid

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