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Quero viver!

Na sua dança, Doris mostra a vergonha inicial do soropositivo. swissinfo.ch

Doris Theresia é uma jovem suíça que descobriu há três anos que é soropositiva. A doença foi transmitida pelo marido africano, que contaminou-se depois de uma transfusão de sangue após um acidente.

No dia mundial da AIDS, ela apresentou suas pinturas e dança. A arte é uma forma de esquecer o preconceito e solidão.

A exposição de arte estava marcada para as seis da tarde no “Le Tremplin”, um ponto de encontro e centro de informações para portadores do HIV ou doentes da AIDS em Fribourg.

A artista, Doris Theresia, tem 33 anos e nasceu num pequeno povoado do cantão de St. Gallen, ao leste da Suíça. Apesar do seu idioma materno ser um dialeto do alemão, ela domina perfeitamente o francês, pois já vive a um bom tempo na parte ocidental do país.

Aos presentes no evento, que fazia parte da programação do dia mundial da AIDS, ela disse que não iria apresentar um discurso, mas sim uma dança. “Assim como minhas pinturas, também meus movimentos falam sobre o que estou sentindo”.

Doris caiu no chão, levantou-se, gritou, tocou uma pequena flauta, gritou mais uma vez e se jogou prostrada no chão. Essa é sua performance.

Suas pinturas, espalhadas pelas paredes do centro de informação, também deixaram a mesma forte impressão: – “Raiva”, “Eu quero viver”, “Vida intensiva”, “O Grito”, “Eu sou prisioneira da minha prisão”, “Estou paralisada de medo”, “Raiva” e “Apesar de tudo, solidariedade” eram títulos impressos no catálogo.

Viver com o HIV

Há três anos Doris descobriu que é soropositiva. O vírus da AIDS lhe foi transmitido pelo marido, um africano de Burkina Faso, que chegou na Suíça para pedir asilo político.

“Um dia ele foi parar no hospital por algumas complicações de saúde. Depois os médicos me informaram que meu marido era soropositivo. A primeira coisa que ele me disse foi que eu estava livre para decidir fazer o que quisesse da minha vida”, lembra-se Doris.

No início ela pensou em possíveis aventuras extraconjugais durante um período de oito meses passado no país natal. Porém ele lhe assegurou que havia se mantido fiel durante a estadia na África, mas que a transfusão de sangue após um acidente de automóvel poderia ter provocado a contaminação.

A jovem suíça decidiu ficar com o marido. “Nós acreditamos que estando juntos será mais fácil lutar pela vida”.

Arte como terapia

Uma das terapias escolhidas por Doris é a arte. Ela pinta, dança e canta. Sobretudo a cultura africana lhe interessa. “Mesmo se eu não consigo ter o mesmo ritmo deles, me sinto tão bem me movimentando ao som dessa música alegre”.

Na Suíça existem muitos programas voltados para os soropositivos e doentes da AIDS. O sistema social do país é bem estruturado e garante que qualquer pessoa que viva no país, mesmo sendo estrangeiro com estadia ilegal ou solicitante de asilo político, tem direito a tratamento e medicação.

Doris ainda tem uma vida profissional. Depois de ter feito uma formação no setor pedagógico, ela trabalhou durante muitos anos com deficientes físicos. Hoje ela é educadora num jardim-de-infância da cidade de Fribourg.

Preconceitos

Apesar da doença, ela faz questão de ter uma vida ativa. “Eu não quero ficar em casa, esperando que algo aconteça. Tenho força e quero ser útil à sociedade”.

Porém sua chefe se opõe ao seu trabalho. Nos últimos meses ela foi impedida de ter contatos muito próximos com as crianças, como dar banho, comida ou limpar os dentes delas. “Na verdade ela não conhece nada sobre a AIDS, mas tem muito medo da doença”, explica Doris. Apesar da resistência dos superiores e de alguns colegas, ela insiste que pode cumprir suas tarefas sem arriscar a vida de ninguém.

Na Suíça, assim como em muitos países do mundo, os preconceitos são grandes. E o pior é que eles nem precisam estar relacionados com a doença. Há vários anos Doris não vê a sua família. “Eles eram contra meu relacionamento com uma pessoa de cor negra”. Depois que descobriu que era soropositiva, ela também não contou para nenhum parente. “Não disse nada, pois eles ficariam ainda mais chocados”.

Seu marido africano não compareceu à exposição de arte. “Ele se envergonha de ser soropositivo e vive completamente isolado”, revela Doris. Porém ela tenta ser compreensiva e acha que cada um tem de procurar uma forma de encarar o problema. No seu caso, o contato humano e a arte são os elementos mais importantes.

Liberar a raiva

Suas pinturas não transmitem realmente muita alegria. No quadro “O Grito”, uma tela de dois metros de comprimento por um de largura, ele mostra seu auto-retrato cercado de cores escuras como se fosse uma assombração na noite.

Porém ela explica que só consegue enfrentar a AIDS liberando em público seu medo, raiva e angústia. “Depois que toda essa carga negativa se vai, eu abro espaço para os bons sentimentos”. Talvez por essa razão sua dança lembra alguém que liberta-se de uma camisa-de-força.

Depois da entrevista, ela abriu um sorriso e se despediu do repórter da swissinfo. A sala estava repleta de pessoas convidadas para sua exposição de arte e todos queriam conversar com a artista.

swissinfo, Alexander Thoele

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