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Drama de Locarno gera discussão sobre criminalidade juvenil

Mais de mil pessoas participaram no último domingo da marcha de protesto em Locarno. Keystone

O espancamento à morte de um estudante suíço por três jovens imigrantes naturalizados provoca debate acalorado sobre criminalidade juvenil.

Discussão mistura estatísticas, projeções, argumentos e preconceitos que mais confundem do que ajudam a esclarecer um fenômeno que atinge também outros países europeus.

O carnaval de Locarno, na região italiana da suíça, não é tão conhecido, por exemplo, como o da Basiléia, na Suíça alemã, mas o deste ano já entrou para a história. Não pela alegria dos foliões e sim por causa de um episódio triste: a morte de um estudante, em conseqüência de agressões sofridas durante os festejos.

O estudante de 22 anos foi atacado a socos e ponta-pés em plena rua e morreu no hospital em conseqüência dos ferimentos. A polícia abriu inquéritos contra três jovens com idade entre 19 e 21 anos, oriundos da Bósnia e da Croácia (dois deles naturalizados suíços), suspeitos do crime.

A brutalidade dos agressores e sua origem provocaram discussões acaloradas sobre a criminalidade juvenil envolvendo imigrantes. O debate mistura estatísticas, projeções, argumentos e preconceitos que mais confundem do que ajudam a esclarecer um fenômeno que atinge também outros países europeus, como a França, a Alemanha ou a Inglaterra.

Números contraditórios

As estatísticas e os estudos científicos existentes sobre o problema na Suíça são em parte contraditórios. Assim, por exemplo, dados do Departamento Federal de Estatísticas (DFE) apontam um aumento constante da criminalidade juvenil nas últimas décadas.

Os índices de condenação de jovens criminosos setuplicou entre 1934 e 2004, passando de 269 para 1.817 casos por 100.000 jovens suíços, informa um relatório publicado pelo DFE em 2007. A instituição ressalta que o índice de condenação de jovens é historicamente superior ao de adultos.

O caso de Locarno levantou a questão polêmica até que ponto a violência juvenil seria um problema dos imigrantes. Segundo o DFE, em 2006, 22% dos habitantes da Suíça com menos de 20 anos eram de nacionalidade estrangeira.

Considerando todas as sentenças judiciais proferidas contra jovens naquele ano, a participação dos estrangeiros chega a 30%. De acordo com esses números, os jovens estrangeiros se envolvem menos com delitos de drogas ou roubos e mais com atos de violência.

A maioria das estatísticas não indica quantos dos criminosos condenados na Suíça se naturalizaram ou são oriundos de famílias de imigrantes. O DFE planeja publicar em 2010 uma estatística criminal suíça por nacionalidade dos condenados.

Um estudo publicado em 2007 pelos pesquisadores Manuel Eisner e Denis Ribeaud, da Universidade de Zurique, conclui que, nos últimos oito anos, o número de crimes violentos praticados por jovens naquele estado praticamente não aumentou. Apenas haveria um crescente interesse da mídia pelo assunto e mais denúncias à polícia.

No entanto, teria aumentado o número de menores envolvidos em crimes sexuais. “O forte consumo midiático por jovens de 15-16 anos, ligado ao crescente distanciamento emocional em relação aos pais também é preocupante”, alertam os pesquisadores.

Além disso, o estudo aponta uma “participação consideravelmente maior de jovens com fundo migratório em crimes”.

“Criminalidade não tem passaporte”

Essa constatação, porém, é relativizada pelo diretor do Instituto de Criminologia da Baixa Saxônia (Alemanha), Christian Pfeiffer, cujas pesquisas sobre criminalidade juvenil serviram de base teórica para o estudo feito em Zurique.

“Os resultados das pesquisas mostram um quadro semelhante para a Alemanha e a Suíça. Imigrantes, também aqueles oriundos dos Bálcãs, em princípio não são mais violentos do que os suíços”, disse Pfeifer à emissora de rádio DRS.

Segundo ele, “também em Zurique se constatou que, quando se faz uma comparação correta entre pessoas que se encontram na mesma situação familiar, não há diferença de criminalidade. Ela não tem nada a ver com o passaporte e sim com a realidade em que o estrangeiro vive”.

Na opinião do perito alemão, a situação de imigrantes da Turquia ou dos Bálcãs, freqüentemente envolvidos em crimes, não é comparável com a de um suíço. “A realidade é outra. A violência dentro das famílias turcas ou da ex-Iugoslávia é um fator duas a três vezes mais crítico, que fomenta uma mentalidade machista e provoca pancadarias”, afirmou.

Além disso, o sistema de ensino suíço não ofereceria igualdade de chances aos jovens imigrantes. “Eles ficam frustrados por não poder realizar os mesmos objetivos que seus colegas suíços”, disse Pfeiffer. E, por último, eles seriam mais atingidos pelo “brutalizador consumo midiático”, através da televisão e de jogos eletrônicos.

Medidas paliativas e prevenção

Em reação ao drama de Locarno, alguns políticos voltaram a pedir a expulsão de criminosos estrangeiros ou que se retire deles a nacionalidade suíça. Essa medida, politicamente instrumentalizada na campanha eleitoral do ano passado pela União Democrática de Centro (UDC), já é prevista na lei de imigração suíça para casos de crimes graves, como por exemplo, crimes de guerra.

O psicólogo e pedagofo Herbet Wyss, que assessora escolas e autoridades em casos de violência ou ameaças de chacina, sugeriu a criação de um “polícia especial para mostrar os limites à juventude”.

Algumas prefeituras suíça planejam combater a criminalidade juvenil proibindo os jovens de sair de casa à noite ou implantando uma “lei seca” contra o consumo de álcool. Segundo peritos, todas essas medidas atacariam apenas os sintomas, não as causas do problema.

“O caminho mais seguro para quem quiser combater a cultura machista de jovens turcos ou iugoslavos é a integração educacional. É fazer com que eles realmente acreditem na máxima de que cada um é responsável pela sua própria felicidade”, afirma Pfeiffer.

swissinfo, Geraldo Hoffmann

A lei relativa à cidadania prevê a perda da nacionalidade suíça em determinados casos.

Segundo o Artigo 48, uma pessoa com dupla cidadania pode perder a nacionalidade se cometer um ato que “atente profundamente aos interesses ou à imagem da Suíça”.

A perda do passaporte helvético só ocorre em casos graves, como na condenação por crime de guerra.

Em relação a estrangeiros que cometem crimes graves, as leis suíças prevêem uma série de medidas: proibição de entrada no território nacional, perda dos vistos de permanência ou a sua não prolongação.

A União Democrática do Centro, partido da direita nacionalista, lançou recentemente uma iniciativa pedindo a “expulsão de criminosos estrangeiros”. Se recolher o número necessário de assinaturas, o partido poderá pedir um plebiscito sobre o tema.

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