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Organizações auxiliam profissionais do sexo

O nível elevado de vida atrai muitas prostitutas estrangeiras à Suíça. Ex-press

ONGs se dedicam ao trabalho de ajudar e aconselhar prostitutas estrangeiras na Suíça, das quais um número considerável é originado do Brasil.

Ao contrário do que se acredita, muitas sabem o que lhe espera ao chegar ao país. Porém mesmo retornando, essas mulheres continuam necessitando de apoio. Reportagem swissinfo.ch

A realidade da prostituição está à mostra nas ruas, bares e esquinas das cidades, mas o cotidiano dessas vidas alugadas é cruel e geralmente duro de enfrentar. Conhecidas vulgarmente como “mulheres de vida fácil”, as prostitutas estão expostas a diversos dilemas que podem ser solucionados por organizações que apoiam estas profissionais nos momentos difíceis.

Pessoas que estão ou desejam sair da prostituição e precisam de ajuda em todos os sentidos podem recorrer a grupos de apoio e orientação. Na Suíça existem várias instituições que disponibilizam seus serviços para este fim. Na Basileia há a Aliena, que no latim significa a desconhecida, a estrangeira, a que não tem nome. A organização foi criada em 2001 pela direção da Compagna, uma companhia privada suíça que mantém outros dois serviços sociais. A Aliena atua em aconselhamento, informação, auxílio individual, psicossocial, jurídico, nas situações de crise, como violência, gravidez, enfermidades e também oferece curso de alemão para melhor qualificar estas profissionais. Uma vez por semana, a instituição oferece um almoço gratuito, um ponto de encontro para estas mulheres esclarecerem suas dúvidas e conversar sobre seus problemas.

A Aliena atendeu, no ano passado, 871 pessoas, sendo 67% africanas, 23% latino-americanas e 10% europeias. Em 2009 também foram aconselhadas 709 prostitutas ou as que já deixaram este ramo. Deste total, 61% são oriundas da América Latina (a maior parte brasileiras), 21% da Europa, 10% da África e 8% da Ásia. A faixa etária delas varia de 18 a 55 anos. A maioria ingressou por necessidade financeira, mas há as que tenham bom nível intelectual e estudo. Também tem os casos das de classe média, que precisavam de dinheiro, pois estavam sem trabalho ou porque os maridos perderam o emprego.

Reconhecimento social

A instituição recebeu dois importantes prêmios: o de Integração e o de Igualdade entre homens e mulheres. Para Viky Eberhard, conselheira da Aliena, essas premiações foram a legitimação da sociedade suíça para um trabalho controvertido, que tanto pode ser criticado ou encontrar solidariedade por parte de quem está fora dele. “Foi o reconhecimento e também o impulso para continuarmos com mais força”, alegra-se. Viky conta que o período de atendimento varia em cada caso. Algumas mulheres são atendidas por um tempo determinado, outras continuam o processo na busca de orientações. Há as que voltam para os seus países, as que já deixaram a prostituição e mesmo assim ainda sentem necessidade de conversar sobre seus problemas ou esclarecer suas dúvidas. “Elas são estimuladas a ter poder sobre suas próprias vidas, a serem autônomas e a desenvolver a autoestima. Nós ajudamos nas suas dificuldades, mas desejamos que elas sejam autossuficientes”, pondera.

A conselheira salienta que o trabalho realizado pela Aliena visa o desenvolvimento de alternativas de vida além da prostituição. Ela constata rotineiramente casos de extrema necessidade financeira entre estas mulheres, mas acredita que eles estão muito relacionados à carência moral delas. A organização faz ainda encaminhamento para as dependentes de álcool que precisam de apoio especializado. “Porém a mulher tem que desejar, fantasiar ou querer esse tratamento. A realidade enfrentada por elas é um preço muito caro pela escolha feita”, alerta. A equipe de aconselhamento dimensiona com elas o que é mais importante: se é o dinheiro enviado aos filhos e à família, ou a falta emocional gerada pela ausência delas no convívio com os mesmos.

Viky admite que a maioria vem para a Suíça sabendo que vai se prostituir, somente 5% são enganadas por empresários ou até mesmo por amigas, de que vão trabalhar em bares, como garçonetes ou dançarinas. “A maior parte permanece na prostituição. Nossa tarefa não é tirá-las de lá, mas ajudá-las na situação de dificuldade em que se encontram”, avalia.

Resgate

O Projeto Resgate, de Zurique, foi idealizado pelo brasileiro Vicente Medeiros e sua esposa Kátia, quando os dois vieram para a Europa comemorar 25 anos de casados, em 2004. Ele conta que encontraram muitas mulheres em situação lastimável. Retornaram no final do mesmo ano e pesquisaram por três meses este problema, verificando que muitas prostitutas queriam mudar de vida, mas não conseguiam, devido a não ter estrutura familiar e financeira no seu país. Chegaram à conclusão que elas precisavam de algo mais eficaz para um retorno seguro. Após dois anos de pesquisas, documentos, vistos e parcerias, em 2006 foi inaugurado no Brasil e em junho do mesmo ano, na Suíça, o grupo Resgate. Mas ele só consolidou-se em 2007, quando oficialmente começou a atuar.

Nos dois primeiros anos, o Resgate atendeu 55 pessoas. Atualmente há 49 casos em andamento, destes, quatro estão em processo de retorno para casa. Vicente diz que burocraticamente tudo já está bem encaminhado, mas o maior desafio do Projeto é financeiro. “Nosso orçamento para este ano foi de CHF 210 mil, mas ainda não conseguimos fechar este valor”, calcula. O coordenador do grupo comenta que a relação com o Consulado Brasileiro é excelente e que até o presente momento foram atendidos em tudo. Também informa que cooperam com a Embaixada em diversas situações.

Depois de retornarem ao Brasil, as ex-prostitutas são acompanhadas pelo Resgate, o qual desenvolve projetos sociais com as mesmas. “Normalmente acompanhamos até que a pessoa possa se estabilizar, mas como o Projeto ainda é novo, temos poucos casos concluídos”, assegura. Em relação ao perfil predominante das mulheres que procuram auxílio, Vicente comenta que a maioria das prostitutas e outras em trabalho escravo ou que não receberam pelo serviço, não tem recursos para retornar. “Como temos acordo com a Organização Internacional de Migração (IOM) e com a Caritas da Bélgica, também recebemos no Brasil pessoas de outras partes da Suíça, da Bélgica e de Portugal, para reintegração social, mas a maioria não são oriundas de exploração sexual.

A vida como ela é

Uma brasileira nascida no Nordeste, região com os mais altos índices de pobreza do país, está querendo regressar a sua terra. Como ela largou a prostituição há dois anos, está contando com o auxílio da Aliena e do Projeto Resgate para regressar ao Brasil. Com 46 anos e quatro filhos morando fora daqui, a nordestina está na Suíça há seis anos e aguarda ansiosa para voltar em breve.

Ela foi convidada por um senhor que atuava em empresa de transportes, quando trabalhava em um clube de prostituição na Espanha, a vir para cá. Antes disso, ela também foi empregada em casas de meretrício na Holanda, a convite de uma amiga. Sua trajetória neste ramo começou aos 18 anos. Mas, em seguida, conheceu o pai do seu segundo filho, com quem morou 11 anos. Nesse período ela conta que fez curso de corte e costura, vendeu lingeries, perfumes e cozinhou para fora. Depois que se separou, decidiu voltar a prostituir-se, acabando viciada em drogas. Segundo ela, apesar de ter tido bom retorno financeiro, não lucrou nada com isso, porque gastava o que ganhava no vício.

A entrevistada não gosta de lembrar-se do seu passado e diz não saber o motivo que a levou à prostituição. “Eu não conhecia Deus, não tinha temor, estava no mundo. Era uma vida de miséria, no fundo do poço”, desabafa. Há 16 meses ela encontra esperança numa religião evangélica, indo a reuniões e estudos bíblicos. Está decidida a regressar ao Brasil e a reconstruir sua vida de outra forma, próxima de sua família e de sua opção espiritual.

O exercício da prostituição na Suíça é legal, mas as mulheres que o fazem têm de se registrar frente às autoridades municipais e de saúde. Elas também têm de fazer exames regulares de saúde.

No último verão, o governo suíço aprovou uma proposta parlamentar de aumentar a idade legal de prostituição de 16 para os 18 anos.

A nova legislação entrou em vigor em 1° de julho de 2010, alinhando as leis do país com uma convenção do Conselho da Europa, no qual se protegem crianças com menos de 18 anos de exploração e abuso sexual.

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