The Swiss voice in the world since 1935

Mais de 40% dos imigrantes que chegaram à Suíça na última década já deixaram o país

Pessoas em um aeroporto
Entre 2013 e 2022, uma média de 155.000 estrangeiros chegaram à Suíça a cada ano. Ao mesmo tempo, a emigração foi de cerca de 90.000 - ou seja, cerca de 60 para cada 100 imigrantes (ilustração). Keystone / Alessandro Della Bella

A Suíça bateu recorde de crescimento populacional com a imigração em 2023, mas quase metade dos estrangeiros que chegam ao país acabam indo embora. Portugueses se destacam como o grupo com a maior taxa de retorno, com 87% voltando para Portugal.

Este artigo faz parte de uma série “In Data” dedicada à imigração, um tema muito discutido na Suíça, assim como na maioria dos países desenvolvidos. A análise do fenômeno em números nos ajuda a compreendê-lo melhor e a desconstruir certas ideias preconcebidas.

Outros artigos abordarão a estrutura da imigração na Suíça e a questão do asilo.

A Suíça é, inegavelmente, uma terra de imigração. Durante a década de 2013-2022, a imigração estrangeira líquidaLink externo (a diferença entre imigração e emigração) foi em média de 66 mil pessoas por ano, contribuindo com 85% do crescimento populacional.

Em 2023, a inclusão de mais de 50 mil ucranianos refugiados na Suíça nas estatísticas oficiaisLink externo contribuiu para elevar o saldo migratório a níveis históricos: +148 mil pessoas de nacionalidade estrangeira, o equivalente ao recorde de crescimento populacionalLink externo registrado naquele ano. Esse saldo caiu para cerca de 95 mil em 2024, segundo dados preliminaresLink externo.

A imigração sustentada reflete-se na diversidade da população do país alpino, composta por mais de 30% de imigrantes de primeira geração (a Suíça está entre os países com maior proporção nesse aspecto) e, no total, mais de 40%Link externo de pessoas com histórico migratório.

Conteúdo externo

Isso não deixa de levantar diversas questões sociais. Enquanto a maior força política do país) o Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão), se destaca por sua luta contra a “imigração descontrolada“, o tema migratório é, como em outros países, motivo de tensão mesmo fora das fileiras desse partido conservador.

>> Leia o artigo abaixo para entender melhor as questões relacionadas à imigração no contexto do envelhecimento demográfico e da escassez de mão de obra:

Mostrar mais
Folhetos empilhados em uma sala com diversas pessoas.

Mostrar mais

Até onde vai o limite para a integração de imigrantes em países ricos?

Este conteúdo foi publicado em Na Suíça e no Canadá, imigração compensa a baixa natalidade, mas o debate cresce: até onde a sociedade pode integrar? Enquanto Japão e Coreia do Sul buscam atrair mais migrantes, Europa e EUA vivem dilema.

ler mais Até onde vai o limite para a integração de imigrantes em países ricos?

Imigrantes que retornam

Tudo isso contribui para ocultar outra realidade paralela: a das dezenas de milhares de estrangeiros que deixam a Suíça a cada ano, seja por decisão própria ou de forma mais ou menos forçada. “Tendemos a esquecer que quem imigra não se estabelece necessariamente”, observa a socióloga Liliana AzevedoLink externo, pesquisadora do centro suíço de estudos migratórios NCCRLink externo – On the Move, e do Observatório Português da EmigraçãoLink externo, em Lisboa.

Entre 2013 e 2022, a Suíça recebeu, em média, 155 mil estrangeirosLink externo por ano. No mesmo período, as emigrações ficaram em torno de 90 mil; cerca de 60 para cada 100 imigrações. Seu número aumenta de forma mais moderada, porém mais constante, do que o de imigrações desde os anos 2000. Em 2024, mais de 95 mil pessoas partiram, um leve aumento em relação ao ano anterior.

Conteúdo externo

A nacionalidade suíça é determinada pelo direito de sangue e considerada particularmente difícil de obter. Por isso, é comum que pessoas nascidas no país, ou que lá viveram quase a vida toda, ainda sejam legalmente estrangeiras e consideradas migrantes (geralmente com visto “C”) nas estatísticas.

Isso significa que parte das emigrações mencionadas neste artigo envolve pessoas sem cidadania suíça, mas para quem a partida não necessariamente representa um retorno ao país de origem; indivíduos que veem a Suíça como seu lar e podem voltar.

O visto “C” permite ausentar-se do território suíço por até seis meses sem aviso prévio; uma prolongação de até quatro anos pode ser solicitada às autoridades.

Taxa de migração de retorno acima da média europeia

Como em outros países europeus, a taxa de migração de retornoLink externo na Suíça diminuiu desde a guerra na Ucrânia, em grande parte devido ao alto número de refugiados ucranianos impossibilitados de voltar. Essa taxa ficou em 40 emigrações para cada 100 imigrações em 2023, subindo para 50/100 em 2024.

Mas seja em 2021, 2022 ou 2023 (último ano com dados europeus disponíveis), a Confederação está entre os países com maior proporção de imigrantes que partem. O gráfico abaixo mostra a média desses três anos.

Conteúdo externo

Maioria das emigrações ocorre nos cinco anos após a chegada

A taxa de migração de retorno por si só permite análises limitadas, pois quem imigra não são necessariamente os mesmos que partem.

Na Suíça, o Depto. Federal de Estatísticas (BfS, na sigla em alemão) também fornece dados longitudinais, que revelam mais sobre trajetórias individuais. Essas estatísticas acompanham grupos de pessoas que chegaram no mesmo ano, mostrando seus percursos migratórios e mudanças de statusLink externo.

Como em outros países, elas indicam que a taxa de partida é maior nos primeiros anos após a chegada. Das 200 mil pessoas que imigraram em 2011 (todos os status combinados), metade já havia deixado o país em cinco anos, e quase 60% em onze anos. A maioria partiu nos dois primeiros anos.

Conteúdo externo

O BfS também disponibilizou à swissinfo.ch dados sobre todos os estrangeiros que imigraram entre 2014 e 2023, um total de 1,85 milhão de pessoas acumuladas na década, incluindo recém-chegados (como refugiados ucranianos). No final de 2023, 800 mil haviam partido (mais de 40%).

Curiosamente, quando questionados sobre quanto tempo pretendiam ficar, a maioria dos imigrantes nascidos declarou intenção de permanecer indefinidamente. Em 2021, quase dois terçosLink externo disseram querer viver na Suíça a vida toda, e 9% planejavam ficar pelo menos cinco anos. Aqueles com planos de partida precoce eram minoria, e um quarto estava indeciso.

O que explica essa discrepância? Cada decisão migratória é única, e depende de numerosos fatores, mas alguns indícios devem ser considerados.

Vistos permanentes são minoria

O tipo de autorização de residência é determinante na duração da permanência. A maioria dos imigrantes obtém vistos “BLink externo” ou “LLink externo“. Este último, válido por no máximo um ano, é o mais precário, sendo que cerca de um terço dos imigrantes de 2011 o tinham, e mais de 70% deles efetivamente partiram.

O visto “B”, renovável anualmente, o mais comum, era mantido por metade dos imigrantes, mas quase 50% também deixaram o país.

Mostrar mais

Dos que chegaram em 2011, apenas uma minoria consolidou seu direito de permanência após onze anos: 30% obtiveram o visto “C” Link externo(residência permanente, geralmente concedida após dez ou cinco anos ininterruptos) e 4% foram naturalizados.

“O trabalho é o que liga as pessoas à Suíça”

Mulher
Liliana Azevedo é pesquisadora associada do centro de pesquisa suíço sobre migração NCCR – on the move e do Observatório da Emigração Portuguesa em Lisboa. Universidade de Neuchâtel

A obtenção e o tipo de visto frequentemente dependem de emprego. “O trabalho é o que ancora as pessoas na Suíça”, observa Liliana Azevedo.

Junto a motivos familiares, o trabalho é citado como principal razãoLink externo para imigrar ou emigrar. Cresce também o número dos que planejam partir na aposentadoria, muitas vezes por razões econômicas.

O sucesso ou fracasso da integração profissional é crucial na trajetória migratória, representando um desafio maior para quem não domina um dos idiomas nacionais ou tem qualificações não reconhecidas. “Desemprego, empregos precários ou abaixo da qualificação são obstáculos para ficar além de alguns anos”, explica Azevedo.

>> Várias pessoas que imigraram para a Suíça nos contaram suas experiências, algumas muito positivas, outras muito difíceis, na seção de comentários abaixo:

Mostrar mais

Debate
Moderador: Pauline Turuban

Você imigrou para a Suíça? Como foi sua experiência?

Quais foram as circunstâncias que envolveram sua imigração para a Suíça? O que motivou sua decisão de ficar ou sair?

12 Curtidas
31 Comentários
Visualizar a discussão

Muitas pessoas também vêm para a Suíça para uma experiência profissional ou acadêmica única, mas têm pouco apego ao país e saem facilmente para seguir suas carreiras em outro lugar.

O AcordoLink externo de livre circulação na Europa (em vigor desde 2002) não só impulsionou a imigração, mas também fomentou uma visão mais internacional de carreira; hoje, “os percursos são cada vez mais marcados por múltiplas mobilidades”, destaca a socióloga.

>> Este artigo sobre as relações econômicas entre a Suíça e a UE analisa, em particular, a questão da liberdade de circulação:

Mostrar mais

O nível mais alto de migração de retorno é de Portugal

Estatisticamente, o tempo de permanência varia conforme a nacionalidade. A longo prazo, um estudo do NCCR com imigrantes de 1998 mostra que, após 23 anos, os originários de países desenvolvidos fora da Europa (como Japão e EUA) foram os que mais partiram, com taxas acima de 80%). Já imigrantes da ex-Iugoslávia e do Sri Lanka (muitos por reunificação familiar) permaneceram em grande maioria.

O ritmo de partida dos cidadãos da EU se acelerou depois do acordo de livre circulação (principalmente alemães, portugueses, italianos e franceses), que hoje representam a maioria das emigrações.

A população portuguesa tem a maior taxa de migração de retorno, com 83 emigrações para cada 100 imigrantes em 2023. A migração líquida da população portuguesa voltou a ser ligeiramente positiva nesse ano, após seis anos consecutivos em que a emigração chegou a superar a imigração.

Conteúdo externo

Estatísticas especialmente extraídas pelo BfS a pedido da swissinfo.ch confirmam que a maioria dessas pessoas está voltando: em 2023, três quartos dos cidadãos da Alemanha, França e Itália que deixaram a Suíça foram para seu país de origem (o país do qual são nacionais). Essa proporção é ainda maior para os portugueses: quase 87% de sua emigração foi para Portugal.

Isso também está relacionado à idade em que as pessoas emigram. As pessoas que emigram na idade da aposentadoria têm maior probabilidade de retornar ao país de origem do que as pessoas mais jovens, que têm maior probabilidade de se deslocar entre diferentes países.

A população portuguesa tende a emigrar em uma idade mais avançada do que as demais. Quase 60% dos portugueses que deixaram a Suíça o fizeram após os 40 anos de idade – e mais de um quarto após os 60 anos. Em comparação, a maioria dos emigrantes de outras nacionalidades partiu entre os 20 e 40 anos de idade.

Quando o coração fica em casa

a “ideologia do retorno” ainda influencia fortemente a comunidade portuguesa, de acordo com um estudoLink externo da Universidade de Neuchâtel (UniNE) publicado em 2023. Em comparação com os outros grupos estrangeiros estudados, os portugueses são os mais apegados ao seu país de origem e os que menos se sentem parte da Suíça, diz o estudo.

Considerando todas as nacionalidades juntas, a “saudade” é citada como um fator decisivo para a saída em 7% dos casosLink externo.

Conteúdo externo

A imagem dos trabalhadores pouco qualificados da segunda metade do século 20, que emigravam em massa com o objetivo de trabalhar e economizar dinheiro para voltar ao país de origem, sem intenção de se integrar, há muito tempo é associada aos portuguesesLink externo. É verdade, mas isso não é alheio à autorização de residência sazonal, a única que eles podiam solicitar e que, de qualquer forma, não lhes permitiria se estabelecer.

Hoje, a imigração portuguesa não se limita mais a isso, especialmente depois da grave crise econômica pela qual Portugal passou no início da década de 2010. A taxa de desemprego muito alta na época levou uma nova onda de pessoas a deixar o país. Embora fossem mais qualificados, alguns tiveram dificuldade em encontrar um emprego compatível com suas qualificações.

>> Um “engenheiro ambiental que colhe alface” e “advogados que lavam pratos em hotéis”: em 2016, um sindicalista descreveu para swissinfo.ch a desvalorização da força de trabalho portuguesa na Suíça:

Mostrar mais

Mostrar mais

“Chegam sem informação e são explorados”

Este conteúdo foi publicado em Em entrevista à swissinfo.ch explica que os portugueses da nova vaga de emigração que a crise económica fez sair do país chegam à Suíça desconhecedores da realidade, da legislação e do mercado de trabalho e caem nas mãos de gente desonesta. “Há casos de exploração de portugueses por outros portugueses”, alarma o delegado sindical. Um…

ler mais “Chegam sem informação e são explorados”

Isso alimentou o sentimento de estar apenas “de passagem” e o sonho de um retorno às raízes. Liliana Azevedo ressalta que, após a crise, a situação socioeconômica e a imagem de Portugal mudaram. O governo português até criou programasLink externo para incentivar o retorno de seus cidadãos. “Muitos que haviam emigrado contra sua vontade partiram ao primeiro sinal de oportunidade”, diz.

Edição: Samuel Jaberg

Adaptação: DvSperling

Mais lidos

Os mais discutidos

Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch

Mostrar mais: Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch

Veja aqui uma visão geral dos debates em curso com os nossos jornalistas. Junte-se a nós!

Se quiser iniciar uma conversa sobre um tema abordado neste artigo ou se quiser comunicar erros factuais, envie-nos um e-mail para portuguese@swissinfo.ch.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR