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Relator da ONU pede admissão de refugiados da fome

Centenas de imigrantes africanos por mês chegam à Espanha , na esperança de uma vida melhor. Keystone

O relator especial das Nações Unidas pelo direito à alimentação, Jean Ziegler, pediu ao Conselho dos Direitos Humanos em Genebra, que reconheça uma nova categoria de refugiados da fome.

O sociólogo suíço criticou os países ocidentais pela promoção dos biocombustíveis porque estes provêm de terras agrícolas anteriormente destinadas à produção alimentar.

Durante a quinta sessão do Conselho dos Direitos Humanos, em Genebra, Jean Ziegler pediu aos seus membros que elaborem uma nova norma internacional para a não-rejeição temporária dos refugiados da fome.

Chocado pelas vagas de imigrantes clandestinos africanos que chegam à costa da Espanha e da Itália, quando não morrem em naufrágios durante a travessia, o ex-deputado federal socialista, sociólgo e escritor prevê que a tragédia só poderá aumentar.

“Essas pessoas são totalmente desamparadas e vítimas de bandos criminosos. Não é um problema fácil de resolver, mas a estratégia de transformar a Europa em fortaleza fracassou”, afirmou Ziegler em coletiva à imprensa.

Ele acha que o Conselho dos Direitos Humanos pode definir as regiões em que deve ser aplicado o “estado de necessidade”. Citou como exemplo o Programa Alimentar Mundial “que define todo ano as regiões do mundo onde é possível garantir a segurança alimentar”.

Desnutrição em alta

Mesmo reconhecendo a dificuldade de distinguir os refugiados da fome dos refugiados econômicos, o relator da ONU criticou a política dos países europeus que criam campos de acolho na África do Norte para “exportar o problema”.

O sociólogo suíço defendeu a elaboração de uma norma segundo a qual somente os imigrantes provenientes de países que atravessam uma crise alimentar, como o Niger em 2005, seriam admitidos. Depois de superado o estado de urgência, eles poderiam ser reenviados a seus países.

Para ilustrar sua proposta, Jean Ziegler sublinhou que o número de pessoas com insuficiência alimentar na África triplicou nos últimos 30 anos. A desnutrição aumenta: o número de pessoas atingidas no mundo passou de 842 milhões no ano passado a 854 milhões este ano.

Reação suíça

Segundo o relator, a proposição tem o apoio de países africanos, asiáticos e latino-americanos, mas os países europeus relutam um aumento da xenofobia, se for instituída uma nova categoria de refugiados. Os diplomatas europeus o acusam de “brincar com fogo”, afirmou Ziegler.

Durante o debate, a representante da Suíça, Muriel Berset Kohen, reconheceu que o “problema é alarmante”. No entanto, “reconhecer um direito para esses refugiados tornaria difícil elaborar critérios objetivos para determinar que pessoas são ameaçadas a ponto de receberem asilo para escapar da fome”, declarou.

Biocombustíveis contestados

Jean Ziegler acusou a União Européia, os Estados Unidos e o Japão de serem “totalmente hipócritas ao promoverem os biocombustíveis para reduzir a dependência na importação de petróleo”.

Ele explicou que a aumento da demanda em biocombustíveis tem um custo humano. Ele poderá, segundo ele, provocar fome que pode causar a morte de “centenas de milhares de pessoas”.

O relator destacou o exemplo do Brasil, onde cada vez mais as antigas plantações de cana são agora utilizadas para produzir biocombustível. As terras à disposição dos agricultores para sua subsistência não cessam de diminuir.

“Posso compreender os governos brasileiros ou mexicanos. Endividados, eles querem encontrar novos mercados mas, do ponto de vista do direito à alimentação
é uma catástrofe.”

swissinfo com agências

Na sessão que se encerra segunda, feira, 18 de junho, o Conselho dos Direitos Humanos, em Genebra, discutiu um projeto de novo código de conduta que ao qual serão subtidos os 40 especialistas e relatores da ONU.

Na versão precedente, esse código fora denunciar por diversas ONGs, que temiam restrição ao trabalho dos relatores.

O capítulo sugerindo que fosse esgotadas todos os procedimentos nacionais antes da intervenção dos relatores, foi suprimido.

Por sua vez, Jean Ziegler acredita que a adoção desse código poderia reforçar a legitimidade dos especialistas da ONU, tornando mais claras suas missões.

Jean Ziegler (de 71 ans) foi professor de sociologia na Universidade de Genebra e na Sorbone, em Paris.

Foi deputado federal na Suíça, pelo Partido Socialista, entre 1967 e 1983 e entre 1987 e 1999.

Suas críticas reiteradas ao segredo bancário fizeram-no conhecido na Suíça e no estrangeiro. Ele também é crítico contundente da globalização e seus efeitos.

Jean Ziegler é relator especial da ONU pelo direito à alimentação desde o ano 2000.

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