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Jornalistas estrangeiros descobrem a “outra” Suíça

Jornalistas estrangeiros acompanham a descida dos Alpes em Appenzell. swissinfo.ch

Um país monótono? Engana-se quem acha que a Suíça se limita aos cenários alpinos de cartão postal. Nela existem costumes exóticos e até estranhos hábitos políticos, que fazem da viagem no país uma experiência inesquecível para o turista. Foi o que vivenciou há pouco um grupo de jornalistas estrangeiros na região do Appenzell.

O céu estava encoberto e uma chuva fina caia com pequenos intervalos na última semana de agosto em Appenzell, uma região de colinas ondulantes localizadas ao nordeste do país e que dá o nome aos dois meio cantões (estados). As condições estavam longe de serem ideais para os responsáveis da Suíça Turismo em apresentar a região aos cento e quarenta jornalistas, vindos de 33 diferentes países, na viagem de imprensa organizada anualmente por esse órgão público de promoção do turismo.

O primeiro programa foi subida de teleférico ao Säntis (2.501 metros), a montanha mais alta da região. As nuvens encobriam a paisagem e impediam a visão do Appenzell e do lago de Constança. Jürg Schmid não perdeu o humor e abriu sua apresentação explicando que o tema de 2013 se intitulava “Tradições Vivas”. Segundo o diretor da Suíça Turismo, a Suíça é considerada o terceiro país mais autêntico do mundo segundo a FutureBrand 2012, uma pesquisa de opinião realizada em diversas partes do mundo por uma consultoria internacional.

Indústrias high-tech e vacas no pasto: uma contradição? Para Schmid, o turista procura na Suíça um diferencial. “A autenticidade é uma tendência contrária à globalização”, afirmou. Dentre os jornalistas estrangeiros presentes, um concordou imediatamente. O espanhol Ricardo Lenoir-Grand conhece o país das visitas feitas com o pai, suíço de origem. “Esse é um dos grandes países desconhecidos no mundo”, afirma o redator do semanário Cambio 16, que considera importante destacar a importância do folclore para a imagem de um país. “Um país que guarda suas tradições, as conserva e as exerce, é um país que se valoriza.”

Escolhida a dedo

A escolha de Appenzell como ponto de partida para a viagem de mídia não foi ao acaso. Mesmo na Suíça a região é conhecida pelo caráter único das suas tradições. Uma delas é a “Landgemeinde”, a votação em praça pública, onde três mil eleitores do meio cantão de Appenzell Interior levantam os braços sempre no último domingo de abril para escolher o novo governo e decidir projetos de lei.

Ao escutar a apresentação por parte das autoridades locais, o jornalista brasileiro Caio Camargo se mostrou surpreso. “O que me chamou a atenção nesse cantão foi o sistema de votação. Se levarmos em consideração o que acontece no Brasil, então é essa uma experiência a ser vivida”. Porém a pergunta levantada por um jornalista inglês, lembrando que o direito de voto para as mulheres só foi introduzido no cantão em 1991, relativizou sua admiração pelo sistema político. “Isso para mim é uma novidade e algo inexplicável para uma economia forte e um país desenvolvido como esse”, refletiu o redator da Revista A.

Descida dos Alpes

Talvez o conservadorismo seja mais forte no cantão do que em outras partes do país. O fato é que lá as tradições fazem parte da vida cotidiana dos seus habitantes. Uma delas é a tradicional descida dos pastos, na qual agricultores levam os animais para o fundo dos vales depois de terem passado toda a primavera e verão se alimentando de ervas alpinas no alto das montanhas, um dos segredos da qualidade do leite suíço. A Suíça Turismo convidou os jornalistas para acompanhar uma família de Appenzell na descida com aproximadamente quarenta vacas e uma dezena de cabras.

A procissão de animais e camponeses começou em uma cabana alpina, onde os animais pastavam nas proximidades. Antes da descida, a família convidou os jornalistas para comer um prato tradicional chamado “Fenz”, uma espécie de mingau grosso de manteiga, leite, sal, sêmola e farinha. O casal e seus sete filhos trajavam roupas típicas e os homens tinham um pequeno brinco de ouro em forma de colher pendurado na orelha direita, como manda a tradição local. Com a barriga cheia, eles anunciaram a descida e fizeram, antes, uma espécie de prece. Dois jovens seguravam nos ombros um cabo de madeira com dois grandes sinos nas extremidades. Ao balançar em uma cadência própria, toda a família começou a cantar no estilo de iodelei, o canto alpino que utiliza sílabas fonéticas.

O fazendeiro emitiu urros e as vacas pareciam compreendê-lo. Assim elas se movimentaram lentamente em direção à trilha que vai em direção ao vale. Os jornalistas, vindos de países como a China, Espanha, Brasil, Líbano ou Estados Unidos, se espantaram com a velocidade crescente. A impressão é de que elas estavam “felizes” de poder retornar aos estábulos quentes, depois de passar tantos meses quase que ao ar livre.

Quando a procissão rural chegou ao pé do vale, Caio Camargo não perdia nenhum detalhe com a sua câmera fotográfica. Para o paulistano, vivenciar esse tipo de tradição é algo que poderia atrair os turistas brasileiros. “O brasileiro viaja cada vez mais e não só para os destinos que você classifica como óbvios. Nós queremos conhecer um pouquinho mais de cada povo que existe no mundo. Aqui podemos encontrar novidades, seja nesse cantão ou determinadas cidades do interior, o chamado turismo de experiências salta aos olhos e vai agradar bastante o turista do nosso país”, considerou.

swissinfo.ch

Atrações além do turismo

Qual a razão para os brasileiros virem à Suíça, um país pequeno cercado por grandes nações do turismo como a França? Johnny Mazzilli apresentou uma. “Como o Brasil melhorou economicamente, as pessoas viajam mais. Mas turista brasileiro ainda prefere ir à Roma, Londres, Madri ou Paris. Depois da terceira vez que ele conhece essas capitais, então começa a se questionar: o que tem para ver na Escandinávia ou Suíça? A Suíça é um país que ainda as pessoas estão por descobrir”, analisou o jornalista e fotógrafo brasileiro.  

Como muitos outros colegas de profissão presentes em Appenzell, Mazzilli vê como um dos pontos positivos da Suíça a sua organização, algo que lhe chamou a atenção, especialmente durante a quarta visita. “Sempre martelo a tecla de que a Suíça é um país maravilhoso do ponto de vista social. Eu sempre falo da cultura, gastronomia, da beleza cênica, mas sempre com o fio da meada de um país organizado, ordeiro. Há quem diga que a Suíça é um país parado, monótono, mas acho que os outros aspectos são muito positivos e compensam isso, se for verdade.”

Outro brasileiro lembrou-se de uma grande decepção. “A primeira vez que vim foi em 2008, quando ainda não era jornalista. Na época achei que era um país exageradamente neutro, em ‘cima do muro’. Minha impressão é que era um país que de certa forma guardava muitos segredos. Tinha a história dos bancos, lavagem de dinheiro ou uma omissão que é um dos pilares que sustentava o país. Isso me incomodava tudo no começo. Eu via e me perguntava: nossa, como é que tudo está tão bonito nesse país. Era um questionamento muito autêntico meu”, afirmou Felipe Mortara, jornalista do caderno de Viagem do Estado de São Paulo.

Porém a viagem ao Appenzell serviu para descobrir um lado desconhecido da Suíça. “Subimos num bondinho para ver a vista do alto da montanha, mas o tempo estava horrível. Porém olhei para o chão e via as flores e achava que a combinação de cores era incrível. Isso me encantou! Os Alpes são fascinantes.”

Segundo os números provisórios do Departamento Federal de Estatísticas, a hotelaria suíça teve, no primeiro semestre de 2013, 17,1 milhões de pernoites. O número representa um crescimento de 1,2% (+ 210 mil pernoites) em relação ao mesmo período no ano anterior. Os turistas estrangeiros registraram 9,5 milhões de pernoites na Suíça (+ 1,8%).

Depois da crise no setor provocado, em grande parte, pela forte valorização do franco e outros problemas estruturais, a Suíça Turismo acredita que o crescimento da atual estação de verão será de até dois por cento.

Para o diretor do Departamento de Estudos e Pesquisas do Ministério do Turismo, José Francisco de Salles Lopes, o brasileiro é um turista bastante curioso e a Suíça tem condições de atrai-lo cada vez mais. A última pesquisa, de 2011, registrou que 78.971 brasileiros viajaram para a Suíça naquele ano, colocando o país em 18º no ranking dos destinos internacionais dos brasileiros. Em 2010, o número foi de 66.845. Vale lembrar que estes dados só registram a entrada dos turistas no país e não computam os que tiveram acesso por outros destinos. 

Nessa lista, os Estados Unidos aparecem em primeiro, seguidos da Argentina, Uruguai, França, Portugal, Espanha, Chile, Reino Unido, Itália, Alemanha, Paraguai, México, China, Colômbia, Holanda, Peru e Canadá. “O brasileiro está passando por uma mobilidade social muito grande e a classe C vem crescendo expressivamente”, comenta Lopes, acrescentando que dessa forma o brasileiro tem incluído o turismo na sua estrutura de consumo.

Há, porém, muito ainda a explorar para fazer o brasileiro deixar o País. Foram mais de 6 milhões de viagens para o exterior em 2012 contra as mais de 190 milhões de viagens domésticas. Já o número de estrangeiros que visitaram o Brasil ficou em torno de 5,6 milhões.

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