Clube da primeira divisão é comprado por checheno
Próximo do presidente da Chechênia Ramzan Kadyrov, o empresário checheno Bulat Chagaev acaba de comprar o Neuchâtel Xamax, clube da primeira divisão do futebol suíço. A transação foi aprovada pela assembleia do clube, quinta-feira (12).
Fã de futebol, o empresário diz que vai levar o clube até a Liga de Campeões. Mas muita gente se questiona sobre suas reais intenções.
Em recente entrevista à televisão suíça TSR, Bulag Chagaev dizia que realmente retomaria o clube, se a compra fosse confirmada pela assembleia do Neuchâtel Xamax. Foi o que ocorreu nesta quinta-feira (12/5). Era apenas uma formalidade porque o presidente atual Silvio Bernasconi, que detinha a maioria das ações, concordou com a venda. O montante da transação não foi revelado.
A compra do clube suíço da primeira divisão (Superliga) por um investidor estrangeiro suscita ao mesmo tempo esperanças e inquietudes na cidade de Neuchâtel (oeste). “Não é a melhor solução, mas não tínhamos escolha” afirma Jean Robert, velho torcedor, referindo-se aos déficits recorrentes do clube, que Silvio Bernasconi, presidente e mecenas desde junho de 2005, não queriam mais pagar.
“Neuchâtel Xamax tem uma longa história local. Eu também estou preocupado, como muita gente aqui, com a aquisição de investidores estrangeiros”, reage Jean Studer, secretário estadual de Finanças do Cantão de Neuchâtel. Ele acrescenta “que o cantão talvez seja muito pequeno para contar com seus próprios recursos quando um clube aspira a um alto nível”.
Outros políticos como o atual ministro da Saúde, Didier Burkhalter e o ex-ministro da Defesa Samuel Schimid também são frequentadores das arquibancadas do Estádio da Maladière, mas não terão nada a dizer nessa transação. “Neuchâtel Xamax é uma sociedade privada que age em total liberdade, sem qualquer intervenção de autoridades públicas”, sublinha Jean Studer.
Más companhias
A Federação Suíça de Futebol também nada pode fazer: “Sete anos atrás, impusemos aos clubes de formarem sociedades anônimas para que os presidentes pudessem ser processados em caso de falência. Portanto não podemos intervir na compra de ações do clube pelo senhor Chagaev”, afirma o presidente Edmond Isoz.
Ele acrescenta que o investidor checheno “tem empresas na Suíça e, a priori, respeita as leis do país. Não se faz esse tipo de pergunta sobre os russos que abriram empresas de “traiding” de matérias primas em Genebra. A federação existe para fazer a gestão do campeonato e não para emitir uma opinião política”.
Seus laços estreitos com o presidente checheno – “é como um irmão”, declarou Chagaev à televisão TSR – acusado de ter cometido violências por várias ONGs, provoca reações contrárias e não somente em Neuchâtel. Alain Bovard, porta-voz da Anistia Internacional diz que “a Anistia não tem nada a dizer sobre a compra de um clube de futebol por um cidadão checheno. O senhor Chagaev nunca ocupou funções oficiais na Chechênia. Podemos confirmar apenas que tem más companhias”.
Antecedentes complicados
O certo é que o homem tem uma fortuna colossal: “Não sei quanto tenho. Não conto meu dinheiro nem o dos outros”, disse à TSR. Depois respondeu sobre eventual lavagem de dinheiro: “Não sei o que é dinheiro limpo ou sujo. A Suíça pode recusar meu dinheiro com o pretexto de que ele é sujo. Na Suíça, quando vou comprar sapatos, ninguém recusa meu dinheiro dizendo que ele é sujo. Mas por que a Suíça pode recusar meu dinheiro e não o faz? Dinheiro não tem sobrenome nem país. É apenas dinheiro”.
A televisão suíça também falou da possibilidade de Bulat Chagaev comprar o Estádio da Maladière, que é municipal. Nenhum montante foi citado, mas a construção custou 30 milhões de francos. “Na Suíça, as tentativas de aquisição de clubes de futebol por investidores estrangeiros até agora não deu certo” escreve Nicolas Willemin, redator-chefe do L’Express
de Neuchâtel, em editorial, citando os exemplos do Servette FC de Genebra e do Lausanne FC.
“Até o momento, as compras de clubes ocorreram no Ticino (sul) e na parte francesa, que tiveram más experiências. As pessoas se sentem menos envolvidas com a vida local e podem partir tão rapidamente como chegam. É um risco, mas não quer dizer que isso vai se repetir com o senhor Chagaev”, acrescenta Edmond Isoz.
Um sonho estrelado
As interrogações concernem ainda as razões que levaram Bulat Chagaev a comprar um clube suíço que luta atualmente para permanecer na primeira divisão. “Estou muito feliz de poder levar o Neuchâtel Xamax à vitória nacional. Com um time motivado e bem preparado, teremos rapidamente desafios incríveis na Europa, a começar pela Liga de Campeões”.
Bulat Chagaev será como Roman Abramovitch no Chelsea ou outros oligarcas russos, um simples amante do futebol que pode concretizar sua paixão com seus petrodólares? “Em todo caso ele não espera rentabilizar o investimento. Todos sabem que não se ganha dinheiro com um clube de futebol e que todo ano ainda é preciso pagar dívidas. Quanto à ideia de dinheiro sujo, existem investimentos bem mais discretos do que um clube, sempre objeto de curiosidade da mídia”, afirma o redator-chefe do L’Express de Neuchâtel.
Se aproximar de Blatter
Uma outra motivação evocada pelo jornal Le Temps estaria ligada à megalomania do presidente checheno pessoalmente, autoproclamado capitão da seleção chechena de futebol. Ramzan Kadyrov acalantaria o sonho de organizar em Grozny alguns jogos da Copa do Mundo de 2018, atribuída recentemente à Rússia. Para conseguir isso, ele teria montado uma grande operação de sedução, que passaria pela Suíça, onde as sedes da FIFA e da UEFA.
Muito sensíveis ao aspecto ralacional, os chechenos esperam também se aproximar de Sepp Blatter, presidente da Fifa e, acessoriamente, presidente de honra do Neuchâtel Xamax, afirma o jornal suíço.
Suíça. Instalado com sua família em St-Sulpice (oeste) com negócios em Genebra desde 1990, Bulat Chagaev tem duas empresas no registro do comércio: Envergure Management SA e Envergure Real Estate 1 SA, reunidas na Envergure Holding AS ativas nos setores imobiliário, finanças e matérias primas.
Laços estreitos.
Ele é muito próximo do presidente checheno Ramzy Kadyrov, que é presidente do clube Terek Grozny, financiado por Bulat Chagaev desde novembro de 2010. Foi este que contratou o holandês Ruudi Gullit, em janeiro último, como treinador do atual 11° do campeonato russo, por 900 mil euros por ano.
Jogo de gala. Foi ele quem organizou um jogo de gala na Chechênia meses atrás, com antigas estrelas do futebol brasileiro, que passaram por Genebra.
Presidência. O novo dono do Xamax não será presidente. O cargo é ocupado por Andreï Rudakov, ex-jogador e campeão russo em 1987, pelo Spartak Moscou. Ele jogou na Suíça nos anos 1990.
Colaboração: Simon Bradley, com agências
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