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Índios brasileiros fazem turnê pela Europa

O índio brasileiro José Augusto Kanoê pinta com uma tinta à base de jenipapo o braço de uma criança suíça.

Durante a viagem através de quatro países europeus, uma delegação de índios brasileiros da reserva do Rio Branco, no Estado de Rondônia, encontra suíços em um museu da Basiléia.

Além de trazer peças para o acervo da instituição, eles ainda ensinaram crianças a fazer pinturas de rosto, atirar flechas e fazer fogueira sem fósforos. Era a primeira viagem de avião e fora das suas aldeias.

Os sete índios das tribos de Tapurí, Kanoé, Aruá, Makurap e Jabuti estavam visivelmente cansados após a longa viagem. Com o cocar na cabeça e alguns colares e outros adereços nos braços, eles respondiam pacientemente às perguntas dos suíços. Para a maioria do público, era a primeira vez que estavam vendo em carne e osso legítimos representantes de autóctones.

“As crianças índias também vão à escola?”, perguntou animado um garoto a Armando Jabuti. “Sim, nós também temos escolas”, respondeu o índio que, como o sobrenome diz, pertence à etnia dos Jabutis. Ele próprio é professor, mas de uma forma incomum para os brasileiros. “Eu ensino a língua portuguesa, o pouco que eu sei, mas também a língua tradicional.”

Durante o resto da manhã, as crianças também aprenderam a fazer pintura de pele através de frutas tropicais. Branca Marurap, filha de um cacique, raspou o jenipapo e misturou com água, mas os efeitos eram diferentes na pele européia. “Acho que a nossa pele é muito branca, pois as cores não ficam tão bonitas como nos índios”, brincou a estudante de Etnologia Sarah Hess.

Mais difícil foi aprender a atirar flechas. Dalton Tupari mostrava como envergar o arco e mirar o alvo. O cacique Anísio Aruá observava, sem conter muitas vezes uma risada inocente. Poucos conseguiam atirar. Porém, para encanto dos meninos, os índios tinham pontaria certeira.

A única experiência não bem-sucedida deveu-se a fatores naturais. “Queríamos mostrar também como se fazia fogo no passado, quando a gente não tinha fósforo, mas infelizmente não deu certo: a madeira que trouxemos estava úmida”, lamentou Armando Jabuti.

Projeto de uma fotógrafa brasileira

O incomum encontro de índios com europeus deve-se ao projeto Guaporé, iniciado pela fotógrafa brasileira Gleice Mere e o etnólogo alemão Andreas Schlothauer. Depois de uma primeira bem-sucedida viagem de índios brasileiros à Europa, a dupla organizou em 2009 a segunda turnê.

Financiada em grande parte pelos museus de etnologia da Basileia (Suíça), Berlim (Alemanha), Leiden (Holanda), Viena (Áustria) e também doadores individuais, a turnê tem como principal objetivo trazer o conhecimento atual dos povos indígenas à Europa.

Concretamente, os índios brasileiros levam na bagagem peças e instrumentos típicos para completar as coleções das diferentes instituições e também trabalham junto com especialistas no estudo dos acervos. Além disso, ainda participam de palestras e encontros diretos com adultos e crianças.

De 31 de maio a 20 de junho, os sete índios e os organizadores visitam quatro cidades européias – Basileia, Viena, Berlim e Leiden. O programa prevê não apenas sessões de trabalho nos respectivos museus etnológicos, mas também lazer. “Eles irão descansar no Lavin, um vilarejo em uma bonita região de montanhas ao leste da Suíça, não muito distante de um parque nacional”, conta Gleice Mere.

Picada de cobra

Para os sete índios na atual turnê, essa foi a primeira viagem de avião e fora das suas aldeias. Até chegar à Basiléia, o grupo passou por aventuras. A mais arriscada foi seguramente a picada de cobra no cacique Anísio Aruá. “Foi uma surucucu”, explicou Tanúzio Gonçalves de Oliveira. Questionado sobre o soro antiofídico, o funcionário da Fundação Nacional do Índio (Funai) e responsável pelo grupo riu. “Não, eles utilizam as ervas tradicionais contra picada de cobra e se você olhar para ele, verá que a recuperação foi muito boa, não?”

Já a gastronomia européia parecia um certo desafio. “A comida aqui é boa, mas estou sentindo falta da mandioca e do peixe”, comentou bem-humorado Armando Jabuti. Durante a tarde na Basiléia os índios aproveitaram para fazer compras. As mulheres procuraram calçados e os homens preferiram levar para casa ferramentas.

O programa da noite era assistir o filme “Birdwatchers” do cineasta chileno Marco Bechis. Para os sete índios, também era a primeira vez a entrar no cinema. A película falava da luta de índios guaranis contra grandes fazendeiros no Estado do Mato Grosso do Sul. Algumas passagens mostravam cenas fortes como a tradição de amaldiçoar aqueles que se suicidam ou a questão do alcoolismo entre os indígenas.

Os índios assistiram ao filme com atenção. Até comentavam em voz alta durante a apresentação. Antes eles já haviam falado ao público sobre alguns dos problemas mais graves vividos pelas suas comunidades como o desflorestamento ou a questão da ocupação de terras. Mas agora todos estavam felizes de ser convidados para comer em um típico restaurante suíço.

Alexander Thoele, swissinfo.ch

A reserva indígena de Rio Branco tem 236.137 hectares. Ela está localizada diretamente ao lado da reserva florestal do Guaporé, no Estado de Rondônia, noroeste do Brasil.

Na reserva vivem 650 membros das etnias dos Tuparí, Aruá, Makurap, Jabuti, Sakirabiat, Arikapú, Canoé e Kampé. Sua criação pelo governo brasileiro data de 1986, mas os índios levaram muitos anos até compreender seus direitos.

Na viagem em junho de 2009 à Europa, os sete índios das etnias Aruá, Canoé, Jabutí, Makurap e Tuparí visitam museus na Basileia (Suíça), Berlim (Alemanha), Leiden (Holanda) e Viena (Áustria).

Além de entregar diversas peças e instrumentos típicos aos acervos das instituições, os índios fazem palestras e encontram-se com a população, inclusive crianças.

O programa é financiado pelos museus étnicos europeus e também por doações privadas.

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