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Luciano Barisone revela suas “visões da realidade”

“Leite e Ferro”, um mergulho comovente no coração de uma penitenciária exclusiva no Brasil. visionsdureel.ch

Um dos mais importantes festivais de cinema documentário do mundo, o festival “Visions du Réel”, começou quinta-feira (7) em Nyon (oeste). Um documentário brasileiro está entre os filmes em competição.

Pela primeira vez no comando, o italiano Luciano Barisone não esconde “o friozinho na barriga”, mas defende a diferença e a coragem. Entrevista.

Luciano Barisone assume agora a direção das “visões da realidade”, o nome do festival de filme documentário de Nyon, cidade localizada às beiras do lago Leman, que se dedica às produções do real, às questões da realidade.

Ex-jornalista e crítico de cinema, Barisone nasceu em 1949, em Gênova, e escreveu duas monografias sobre Clint Eastwood e Sydney Pollack. O novo diretor de Nyon também criou o “Infinity Festival d’Alba”, na Itália, e trabalhou para os festivais de cinema de Veneza e Locarno.

Antes de Nyon, que ele acompanhou durante muitos anos, Luciano Barisone foi diretor artístico do “Festival dei Popoli”, em Florença.

swissinfo.ch: O que motiva você no início de sua primeira edição do Festival de Nyon?

Luciano Barisone: Eu sinto ao mesmo tempo o desejo de compartilhar o fruto de cinco meses de trabalho e aquele friozinho na barriga habitual de antes de subir no palco. Mas já que chegamos até aqui, então vamos superá-lo… (Risos)

swissinfo.ch: Qual foi a sua abordagem na escolha dos filmes?

 

LB: É uma abordagem que respeita a do meu antecessor, Jean Perret. O que é importante para nós é a forma da narrativa e não apenas o assunto em questão. Um filme, como qualquer forma de narração ou de arte, é apreendido principalmente através da forma. Tomemos o exemplo da Mona Lisa: o assunto é uma mulher, mas a pintura é a Mona Lisa.

Os outros critérios são critérios éticos. Nós apresentamos filmes que – mesmo com o intuito de tornar a realidade uma espécie de espetáculo – mostram respeito com as pessoas que são filmadas e com o espectador. O espectador deve ser considerado como uma pessoa responsável, capaz de ver. Não como uma criança ingênua.

swissinfo.ch: Mas você se situa mais na continuação do trabalho de Jean Perret ou em um rompimento?

LB: Na continuidade, mas também na inovação. Cada um de nós traz a sua experiência. Isso não é um rompimento, mas a vontade de descentralizar o festival de alguns graus.

O cinema sempre foi para mim um momento de descoberta do mundo. Na minha cabeça, é muito claro que através do festival, pode-se descobrir o mundo. Não só o mundo como um lugar físico, mas também como um lugar de reflexão e de sagacidade.

swissinfo.ch: Algum filme emblemático na sua seleção?

L.B.: Quase todos, eu diria (risos). Mas volto à edição do ano passado: o filme que ganhou o grande prêmio, Into Eternity, já antecipava o que está acontecendo hoje. A enorme atenção dada à questão nuclear e seus perigos. O festival apresenta filmes que descrevem em profundidade o estado da nossa sociedade contemporânea.

Este ano, Abendland, Mercado de Futuros e Sonnensystem são três filmes que não estão centrados em uma história. Eles tentam captar o sentido do mundo neste momento.

swissinfo.ch: A propósito, um festival como o Visions du Réel tem algum papel específico?

LB: Acho que sim. O Visions du Réel expõe filmes e permite um encontro em torno desses filmes. É também um festival-mercado que permite a distribuição dos filmes. Para mim, os dois aspectos são importantes. Mas este espaço de reflexão onde as pessoas se encontram responde mais, eu acho, à demanda do espectador. É o que espero.

Eu acho que os espectadores querem se encontar, ir ao cinema ao invés de ficar confinados em casa assistindo DVDs ou televisão. Me parece que nos momentos de dificuldades, as pessoas preferem se reencontrar.

swissinfo.ch: Em que estado de espírito você gostaria que o espectador saísse da 17ª edição do Visions du Réel?

LB: Eu gostaria que ele desenvolvesse sua consciência do mundo e da diversidade. E que ele tenha vontade de lutar nesse sentido. Espero que os filmes, pela sua exemplaridade, deem ao público essa coragem. Defendo as diferenças. Acredito que a riqueza vem da diferença. A globalização, a normalização, isso tudo é a escuridão, não há mais descoberta. O mundo está desaparecendo.

swissinfo.ch: Principal mudança deste ano, você dividiu a competição internacional em três seções, dependendo da duração dos filmes. Por quê?

LB: Para afastar qualquer ideia de formato, vários festivais selecionam na mesma competição curtas, meias e longas-metragens. Até concordo com a ideia de que um curta pode ser tão forte quanto um longa. Mas o júri deveria então ser corajoso e recompensar o curta às vezes. Você pode imaginar a reação do concorrente que investiu três anos em seu longa-metragem … por isso achei mais respeitoso tentar procurar o melhor em cada categoria -. curta, média e longa. Cada filme compete em uma categoria igual a de seus semelhantes.

Eu também queria mostrar que, em muitos festivais, o meia-metragem nunca é reconhecido. Ele é visto como algo híbrido. As pessoas acham que o meia é o formato da televisão – 50 minutos. Isso não é verdade. Você pode ter filmes de 33 minutos ou 58 minutos, produzidos por institutos e escolas de arte. Com estas três categorias, a ideia é dar a maior importância à forma mais criativa.

A 17ª edição do Visions du Réel, em Nyon, acontece entre os dias 07 e 13 de abril, com 180 filmes a serem descobertos. 95% dos filmes exibidos em competição serão estreias mundiais e 5% estreiam na Suíça. Os vencedores serão anunciados na noite da quarta-feira 13.

A competição internacional está dividida em três seções, dependendo da duração dos filmes. A seção “Regards neufs” desaparece, dando lugar à novas: Port franc”, Focus”, com foco na Colômbia, e Etat d’esprit”, que mostra os melhores filmes do ano, em estreia na Suíça.

Os dois convidados dos tradicionais ateliês são

José Luis Guerin, motor da nova guarda do cinema espanhol, e o americano Jay Rosenblatt, que retrabalha um material antigo. Dois jovens cineastas, o italiano Giovanni Cioni e a brasileira Marilja Rocha serão apresentados em sessões especiais.

Visions du Réel é o primeiro festival de cinema da Suíça francesa e está entre os três melhores do país, com Locarno e Solothurn. Está orçado em 2,5 milhões de francos, dos quais 400 mil pagos pela Confederação.

Relançado em 1995, na forma atual, depois de uma fórmula inventada pela primeira vez em 1969, o festival apresenta um cinema em contato direto com a realidade para além dos limites do documentário rigoroso.

Visions du Réel é também um encontro deprodutores e distribuidores europeus. O mercado Doc Outlook oferece uma ampla gama de filmes.

Adaptação: Fernando Hirschy

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