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Syngenta em compasso de espera no Brasil

Campo de cultivo da multinacional na Suíça. www.syngenta.com

Liberação de transgênicos do Brasil através de medida provisório do presidente Luís Inácio Lula da Silva promete bons negócios para multinacional suíça Syngenta.

Empresa ainda luta na justiça para recuperar área de testes no Paraná, que há um ano está ocupado pelos ativistas da Via Campesina. Problemas com política levam Syngenta a avaliar investimentos no país.

O caminho está novamente aberto para a liberação comercial dos transgênicos no Brasil. Anunciada no fim de março, a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Medida Provisória 327/06 transformou em lei a redução, de dois terços para maioria simples, do quorum exigido para que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprove os pedidos de pesquisa, trabalho de campo e comercialização de transgênicos no país.

A partir da próxima reunião da CTNBio, marcada para os dias 18 e 19 de abril, bastarão os votos de 14 conselheiros para que os pedidos de liberação de transgênicos sejam aprovados. Também foi sancionada pelo presidente Lula a redução de até dez quilômetros para até 500 metros da zona de amortecimento, como é conhecida a distância mínima obrigatória que um cultivo de transgênicos deve obedecer em relação às Unidades de Conservação Ambiental (UCs).

Na visão das organizações do movimento socioambientalista, a posição adotada por Lula servirá como estímulo às empresas que desejam facilitar a introdução dos alimentos e sementes transgênicos no país. Uma das empresas citadas é a transnacional de origem suíça Syngenta Seeds. Ela se beneficiará diretamente das duas mudanças sancionadas pelo presidente, pois tem pedidos de liberação para novos produtos aguardando na fila de votação da CTNBio e possui um centro de pesquisas atualmente ocupado por famílias da Via Campesina próximo a uma UC no estado do Paraná.

Há 20 anos no Brasil

Apesar do evidente momento favorável após um período de incerteza política e jurídica, a direção da Syngenta no Brasil afirma que a posição da empresa não mudou: “Continuamos a fazer nosso trabalho, que já dura 20 anos no Brasil, e atuando de acordo com as leis”, afirma, em conversa exclusiva com a swissinfo, o diretor-geral da empresa, Pedro Rugeroni. A sanção da MP 327/06, segundo o executivo, não deve alterar a atuação da empresa no país: “A posição da Syngenta com a nova lei não mudou para nada. A Syngenta segue atuando em acordo com as leis. Em todos os momentos respeitamos as leis, por isso não há nenhuma mudança, nenhuma novidade”, disse.

Rugeroni evitou comentar a possibilidade de que a redução do quorum da CTNBio provoque a ocorrência de um novo impulso pela liberação dos transgênicos no Brasil. O diretor-geral, no entanto, deixou transparecer que a Syngenta espera maior agilidade nas análises e decisões da Comissão: “As liberações têm que seguir as normas que estão estabelecidas. Nós acreditamos que seguirão os processos [dos pedidos de liberação na CTNBio] para que as liberações aconteçam de forma legal e em respeito às normas brasileiras”, disse.

A Syngenta já tem três pedidos de liberação de transgênicos à espera de entrar na pauta de votação da CTNBio. Os pedidos são relativos a três variedades de milho geneticamente modificado da marca NK (que também apresenta soja, arroz e algodão transgênicos) desenvolvidas pela empresa: “Na pauta da CTNBio, a Syngenta aguarda a votação do pedido de liberação de um evento de milho resistente ao [herbicida] glifosato e de dois outros pedidos para dois eventos de milhos resistentes à praga da lagarta”, disse Rugeroni.

Continua a disputa no Paraná

Outra mudança na lei que deve ser bem aproveitada pela Syngenta é a redução da zona de amortecimento. A novidade deve ajudar a empresa na luta para recuperar a posse do centro de pesquisas localizado em Santa Tereza do Oeste (PR) que permanece ocupado pela Via Campesina há um ano. Um dos motivos da ocupação promovida pelos sem-terra foi o fato de o centro, onde eram realizados experimentos ao ar-livre com variedades de milho e soja transgênicos, estar localizado às margens do Parque do Iguaçu, uma das maiores e mais importantes Unidades de Conservação do Brasil.

A batalha pela reintegração de posse se desenrola na Justiça Federal do Paraná. A desapropriação do terreno determinada em novembro do ano passado pelo governador paranaense Roberto Requião que quer transformar a área num centro de agricultura ecológica foi contestada pela Syngenta, que obteve em fevereiro um mandado de segurança anulando a decisão do governador.

Requião recorreu, e agora a empresa aguarda um possível desfecho favorável do caso na Justiça para poder voltar a utilizar seu centro de pesquisas: “Estamos esperando um posicionamento da Justiça do Paraná sobre a contestação feita pelo Governo do Estado ao pedido de embargo à desapropriação do terreno”, disse Rugeroni.

Ameaça de deixar o país

A possibilidade de derrota na batalha travada na Justiça do Paraná é motivo de contrariedade antecipada na direção da Syngenta no Brasil. Em julho do ano passado, Pedro Rugeroni, que é argentino, chegou a afirmar, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, que a empresa estava “reavaliando seus investimentos no país”. A perda que a Syngenta vinha tendo por não poder utilizar o centro de pesquisas em Santa Tereza do Oeste, segundo o executivo, fazia com que não valessem a pena os investimentos realizados: “Temos uma perda potencial de quatro ou cinco anos, equivalente a US$ 50 milhões, por conta do material que estava armazenado nas câmaras frias do centro de pesquisa”, disse em julho, referindo-se aos quase quinze mil germoplasmas (sementes geneticamente modificadas ou em vias de modificação) que eram armazenados na área hoje ocupada.

Rugeroni atualmente adota uma postura mais comedida, mas deixa claro que a Syngenta ainda aguarda garantias de uma maior segurança jurídica para decidir se expande ou não seus investimentos no Brasil: “A Syngenta vai tomar suas decisões segundo o correr dos tempos. No momento, nós estamos à espera da decisão judicial”, disse. O diretor-geral, que logo após a ocupação do terreno pela Via Campesina chegou a afirmar que a previsão da Syngenta de investir de US$ 12 milhões no Brasil em 2006 poderia não se concretizar, não quis revelar o que de fato foi investido pela empresa no ano passado: “Não tenho autorização para dar essa informação”, limitou-se a dizer.

Otimismo

Apesar da ameaça de deixar o país, os planos para 2007 indicam que a Syngenta está otimista com o desenrolar das coisas no Brasil. Segundo Rugeroni, a empresa deve investir esse ano em suas atividades brasileiras cerca de 2% ou 3% das verbas destinadas à pesquisa em nível global: “Esse investimento global deve se aproximar dos US$ 800 milhões”, disse. Coincidentemente, esse é o mesmo valor do faturamento médio que a empresa obteve no Brasil nos últimos anos e que representa 10% do faturamento global de pouco mais de US$ 8 bilhões anunciado no ano passado.

swissinfo, Maurício Thuswohl, Rio de Janeiro

A Syngenta possui dois centros de pesquisa no Brasil, um em Santa Tereza do Oeste (PR) e outro em Uberlândia (MG). A matriz brasileira fica em São Paulo, e a empresa possui ainda duas unidades de beneficiamento de sementes em Matão (SP) e Ituiutaba (MG).
O milho transgênico Liberty Link, desenvolvido pela Bayer, pode ter sua comercialização aprovada já na próxima reunião da CTNBio. As organizações reunidas na Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos tentam impedir essa liberação na Justiça.
Nos EUA, a Monsanto solicitou à Agência de Proteção Ambiental o aumento de 175 mg/kg para 400 mg/kg na quantidade máxima permitida de resíduos de glifosato na alfafa transgênica produzida pela empresa. Na França, um estudo do cientista Robert Bellé revelou que o glifosato provoca as primeiras etapas de cancerização de células.

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